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Sem ar, água e banheiro: seleção argentina reclama de maus-tratos no Chile
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A vitória da Argentina por 2 a 1 sobre o Chile ontem (27) no deserto de Calama esteve longe de ser tranquila para Di María, Lautaro Martínez e companhia. Agora sem perder há 28 jogos, a seleção azul e branca gastou boa parte do tempo das entrevistas coletivas depois do triunfo para se queixar de maus-tratos recebidos da chegada ao Chile até o começo da partida.
Quem foi mais contundente acabou sendo o volante Rodrigo de Paul, um "capitão informal" da equipe, que jogou sem Lionel Messi e não pôde contar com o técnico Lionel Scaloni (com covid-19). O capitão de fato foi Ángel di Maria, autor do gol que abriu o placar.
"Quando chegamos ao Chile, ficamos quase três horas no aeroporto, sem poder ir ao banheiro, nos falavam apenas que estavam checando nossa documentação", falou De Paul. A AFA (Associação de Futebol Argentino) reproduziu parte do conteúdo em seu Twitter e depois ironizou a derrota dos chilenos mandando um "boa noite a quem já estava classificado para a Copa". O Chile aparece em sétimo na tabela e hoje estaria fora do Mundial.
"Nos fizeram descarregar todas as malas. Só comento um pouco, não para analisar se está bem ou mal", tentou contemporizar o volante. "Chegamos ao hotel, estava entre 30 e 32 graus, não havia ar-condicionado, abrimos a janela para poder dormir, tocavam sirenes, não conseguimos dormir bem. E depois que acordamos, não tinha água."
De Paul, depois de esclarecer os episódios, pediu para evitar retaliações: "Quem venha ao nosso país, vamos tentar fazer com que se sintam cômodos. Precisamos ganhar apenas no campo". Sobre a invencibilidade, comentou: "Não é casualidade. O jogo que fizemos nos fará crescer muito mentalmente, não relaxamos por já estar classificados".
Outro lado
Por parte da seleção chilena ou da Conmebol, ninguém se pronunciou sobre as queixas argentinas. Quem sim se manifestou foi o Ministro do Interior do Chile, Rodrigo Delgado: "Li que um jogador falava de bagunça, mas a verdadeira bagunça tinha a seleção argentina com seus papeis", disse à imprensa de seu país, sobre os documentos da delegação. "Quero dizer várias coisas, quando falam de profissionais da saúde, quero explicar que o Chile chegou à liderança mundial em vacinação e testes, e é graças às pessoas de quem eles agora reclamam. Mais que reclamar, eles deveriam agradecer pelo trabalho e colaboração desses profissionais", seguiu o ministro, sobre o episódio do aeroporto.
"Um pouco mais de respeito ao Chile e à nossa bandeira. Vi uma postagem de um jogador mostrando um 'emoticon' de vômito ao lado da nossa bandeira, espero que possam pedir desculpas", finalizou, sobre o que o goleiro Dibu Martínez publicou em suas redes na manhã de ontem.
Por fim, detonou: "Os argentinos chegaram com muita desordem. Me chama atenção que cheguem com este nível de agressividade, eu os convido a que sejam mais humildes e que reconheçam que tinham seus papeis bagunçados. Têm que entender que cada país tem suas normas, e nós somos bastante rigorosos".
Deserto e altitude
A escolha de sede por parte do Chile gerou dúvidas antes mesmo da partida. Afinal, o jogo de maior atenção das Eliminatórias Sul-Americanas nesta quinta-feira (27) foi no meio do deserto do Atacama, em estádio para apenas 12.000 torcedores e com uma altitude de 2.300 metros no Estádio Zorros del Desierto, em Calama, a 1.500 quilômetros da capital, Santiago. Foi a primeira vez que o estádio acabou sendo usado pela seleção chilena de maneira oficial.
A mudança de sede tinha uma dupla função para o Chile. Em má situação na tabela, entendia que desta maneira conseguiria criar uma dificuldade maior para a Argentina, tradicionalmente menos poderosa na altitude — e mesmo assim a azul e branca venceu por 2 a 1.
O deserto de Calama serviu também como parada para o próximo compromisso chileno — vai encarar a Bolívia nos 3.600 metros de altitude do Hernando Siles, na Bolívia, na próxima terça-feira (1º) com uma aclimatação mais adequada.
Rixa pesada
Argentina e Chile mantêm uma das rivalidades mais acirradas do continente - ao menos para os argentinos, é a mais pesada das rixas com as equipes sul-americanas. Conversar em Buenos Aires sobre qualquer embate Argentina x Chile exige ouvido e estômago para lidar com os sérios insultos portenhos destinados aos chilenos. E a razão disso é a Guerra das Malvinas, ocorrida em 1982. A Argentina vivia sob uma ditadura militar, estabelecida por um golpe de Estado em 1976. O regime já estava desgastado, especialmente pela crise econômica a que arrastara o país. Nesse sentido, o ataque às ilhas foi uma forma de estimular o nacionalismo dos argentinos, angariando simpatias ao governo do general Leopoldo Galtieri e canalizando os descontentamentos para um inimigo externo, no caso os ingleses.
O Chile, sob a ditadura de Augusto Pinochet, colaborou com os esforços de guerra britânicos, por causa de uma disputa territorial que alimentara com os argentinos, em 1978. Tal atitude gera até hoje comentários raivosos de argentinos contra chilenos chamando-os de "traidores" e incitando músicas de ódio. E ambas as torcidas tinham o costume de vaiar com fúria o hino contrário. No cume da ignorância coletiva, a família de Lionel Messi foi agredida no Estádio Nacional de Santiago na decisão da Copa América de 2015, vencida pelos chilenos em casa.
A animosidade dos argentinos perante os chilenos ocorre também nos clubes do futebol local. Quando Marcelo Salas acertou com o River Plate em 1996, o negócio quase não saiu, por conta da cabeça pequena dos dirigentes. "E desde quando chileno dá certo na Argentina?", pensavam. Mercado escancarado a uruguaios e colombianos, a Argentina recebe poucos valores vindos do Chile. E se Salas é a principal exceção no River Plate, no Boca dá para resgatar Gary Medel, que defendeu o clube entre 2009 e 2011 e é muito famoso pela briga em que foi mordido por Marcelo Gallardo.
A coluna detalhou o histórico de desavença entre argentinos e chilenos aqui.
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