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Tales Torraga

Gallardo obtém feito que seria impossível no Brasil

Colunista do UOL

03/11/2020 04h00

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"Nada es igual", tranquilo sucesso da banda argentina de rock La Portuaria, é uma ode aos que vivem no presente, sem enroscar a cabeça no futuro ou no passado. O tempo é um "amigo si estás donde estás", e esta música, e e esta forma de vida, marcam os passos de Marcelo Gallardo, que hoje completa 300 jogos no comando do River Plate.

Marcelo Gallardo, técnico do River Plate - Alejandro Pagni / AFP - Alejandro Pagni / AFP
Marcelo Gallardo, técnico do River Plate
Imagem: Alejandro Pagni / AFP

O feito virá diante do Banfield, às 21h (de Brasília), na estreia do clube na Copa da Liga Argentina. Gallardo estreou como técnico em Núñez em junho de 2014, e seus mais de seis anos no River são impensáveis no Brasil, onde o treinador mal dura seis meses ou 30 jogos, uma gota no oceano das 300 partidas que o Napoleón do River soma hoje.

Herói da resistência do futebol brasileiro na atualidade, Renato Gaúcho comanda o Grêmio desde setembro de 2016, o que é igualmente digno de aplausos, mas entre a chegada de Gallardo ao River e a entrada de Renato, o Tricolor trocou de técnico duas vezes, tentando a sorte com Luiz Felipe Scolari e Roger Machado.

Pesquisar quantos técnicos os postulantes ao título do Brasileirão usaram desde que Gallardo cruzou os portões no Monumental é covardia. Descontando os interinos, vamos lá: Chacho Coudet é o 11º treinador do Inter desde então, empatado com o Atlético-MG que atura os chiliques de Jorge Sampaoli. Flamengo e Palmeiras estão no 13º comandante cada um, e o recorde é do São Paulo, com Fernando Diniz sendo o 14º técnico desde junho de 2014.

Pressão da torcida, afobação dos dirigentes, ansiedade dos técnicos que não pensam duas vezes antes de aceitar uma proposta do exterior? Todas as alternativas são válidas para justificar o troca-troca.

Se é impossível projetar uma longevidade como a de Gallardo no futebol brasileiro atual, é difícil encontrar paralelos até no passado. Telê Santana no São Paulo é o primeiro que vem à memória, embora Telê tenha deixado a equipe exatamente ao completar seis anos (1990 a 1996). O incansável Lula, à frente do Santos por 11 anos (1955 a 1966), é a óbvia exceção, e depois é preciso recuar até 1951 a 1957 para encontrar Teté, pelo Inter, ou 1938 a 1946, para ver o nome de Flávio Costa no Flamengo.

Gallardo soma 12 títulos, incluindo duas Libertadores, três Recopas e uma Sul-Americana. Só balançou uma vez no cargo, quando quase pediu para sair no fim de 2016. Jogador revelado pela base do River, sua história daria um filme, pois ele brilhou como atleta, jogou duas Copas do Mundo (1998 e 2002) e virou o maior técnico dos 119 anos de história do clube.

Nesta terça, que ninguém imagine arroubos passadistas de Gallardo, que jamais completaria 300 jogos se vivesse apegado ao que já conquistou ou se refletisse demais nas possíveis manchas futuras ao seu legado. "Quero que respeitem como sou. O que passou, eu já disse. E o que está por vir, é uma resposta que eu não posso dar."