Topo

Saque e Voleio

Federer sugere fusão de ATP e WTA: veja vantagens e obstáculos

Michael Reaves/Getty Images
Imagem: Michael Reaves/Getty Images

Colunista do UOL

22/04/2020 13h21

Receba os novos posts desta coluna no seu e-mail

Email inválido

Aconteceu meio do nada, na manhã desta quarta-feira. Roger Federer usou sua conta no Twitter para falar sobre a necessidade de união no tênis. Primeiro, escreveu: "Apenas imaginando… sou o único achando que agora é a hora para o tênis masculino e o feminino se unirem e se tornarem um só?" Pouco depois, o suíço foi mais explícito: "Estou imaginando uma fusão entre a WTA e a ATP", postou, antes de emendar com "não estou falando de fundir competição dentro de quadra, mas de uma fusão de duas entidades (ATP e WTA) que supervisionam os circuitos masculino e feminino."

O suíço ainda declarou que o cenário atual é confuso para os fãs, já que há sistemas de ranking, logos, sites e categorias de torneios diferentes. Federer completou a sequência de tweets declarando que essa fusão já deveria ter acontecido há muito tempo, mas que talvez o momento ideal seja agora. "São tempos difíceis para todos esportes e podemos sair disso com duas entidades enfraquecidas ou um órgão mais forte."

A ideia logo ganhou força nas redes. Nomes importantes da modalidade como o espanhol Rafael Nadal, a tcheca Petra Kvitova, a suíça Belinda Bencic e Judy Murray, entre outros, manifestaram seu apoio. Billie Jean King, uma das fundadoras da WTA, também apoiou a ideia e disse que a criação de um circuito feminino separado sempre foi um plano B para ela. Fãs também se mostraram favoráveis. Não é por acaso. Muitas das dificuldades de se acompanhar tênis (e de escrever sobre o assunto!) vêm da divisão de circuitos. ATP e WTA possuem tantas pequenas (e não tão pequenas) diferenças que os fãs que não são hardcore acabam se confundindo. Uma fusão traria um punhado de benefícios. Vejamos alguns deles:

1. Onde ver

Hoje em dia, ATP e WTA vendem direitos de transmissão separadamente. No Brasil, os Masters 1000 são do SporTV, os ATPs 500 são da Band (mas o Rio Open é do SporTV), e a WTA, que era do Sony, passou para o DAZN. É difícil saber quem vai passar o que e quando. É bem verdade que os canais não se ajudam muito na divulgação, mas isso é um problema especificamente brasileiro. Para saber as programações, é preciso conferir canal a canal ou buscar um par de páginas escondidas em dois sites diferentes (ATP e WTA). A unificação poderia não resolver totalmente o problema, mas simplificaria a questão com um site único mostrando essas informações.

Online, a separação é especialmente ruim para os fãs. A ATP mostra seus jogos no TennisTV, cuja assinatura custa US$ 120 anuais. A WTA, por sua vez, exibe seu circuito na WTA TV, um serviço parecido (mas de qualidade inferior) e que custa US$ 75. São quase US$ 200 (mais de R$ 1000 pelo câmbio atual) para ver os dois circuitos. Uma fusão seria bem-vinda, não só para reunificar as plataformas (a WTA já foi exibida no TennisTV antes de se separar), mas para, quem sabe, reduzir o valor total pago pelos fãs.

2. Rankings e formatos

Hoje, a ATP tem um circuito com três tipos de torneios: 250, 500 e 1000. A WTA tem quatro tipos: International, Premier, Premier 5 e Premier Mandatory. Uma unificação, qualquer que seja a nova nomenclatura dos eventos, significaria um circuito mais simples para o fã acompanhar.

Além disso, existe a questão dos rankings, que têm regras diferentes e pontuações diferentes não só nos torneios combinados (Indian Wells, Miami, Madri, etc.) mas também nos slams. Embora exista igualdade de premiação nos quatro maiores torneios do circuito (Australian Open, Roland Garros, Wimbledon e US Open), homens e mulheres somam pontuações diferentes em fases semelhantes. Um exemplo? Na ATP, um vice-campeão de slam ganha 1.200 pontos. Na WTA, quem perde a final soma 1.300. Não seria mais simples para todo mundo igualar isso?

3. Site unificado

Os sites de ATP e WTA já foram mais parecidos, o que facilitava a vida de quem buscava informação sobre os dois circuitos. A WTA, contudo, fez algumas alterações radicais (para pior) em seu site nos últimos anos, deixando a coisa toda mais confusa. O fã da modalidade agora precisa conhecer os cantinhos escuros dos dois sites e perde mais tempo para conseguir informações sobre o histórico de resultados de um atleta ou sobre quantos pontos seu tenista preferido tem a defender no próximo torneio. Uma unificação aqui (e nem precisa usar o site da ATP como referência) simplificaria muito as coisas e seria bem-vinda especialmente pelo fã de tênis feminino.

4. Premiação igual

Os slams já pagam o mesmo a homens e mulheres, mas a maioria dos torneios do circuito não têm essa obrigação. ATP e WTA têm exigências diferentes - inclusive prêmio em dinheiro - para os organizadores de torneio. Um exemplo: Ugo Humbert, campeão do ATP 250 de Auckland deste ano, embolsou US$ 91.625. Serena Williams, campeã do WTA de Auckland, um torneio da série International, ganhou apenas US$ 43 mil. Dois eventos na mesma cidade (em semanas diferentes) e que faziam parte do escalão mais baixo de seus respectivos circuitos, mas com premiações incrivelmente diferentes. É de se acreditar que, no caso de uma fusão de ATP e WTA, haveria um esforço para, finalmente, igualar as premiações em todos escalões do tênis.

5. Horários compatíveis

Sabe quando o narrador de um canal diz que você precisa esperar para ver seu tenista porque "o jogo feminino atrasou"? Isso acontece quando um canal compra apenas os direitos do torneio masculino e não tem o que mostrar enquanto uma partida feminina não termina. A fusão pode não apenas evitar essa divisão de direitos de TV em um torneio combinado, mas também coordenar horários, principalmente no fim de semana.

Se há um torneio feminino, digamos, em Acapulco, na mesma semana de um evento masculino, por exemplo, em Los Cabos, a entidade pode estipular que as finais sejam disputadas em horários diferentes para que os fãs possam acompanhar os dois jogos. Hoje, isso não existe.

6. Regras iguais

No feminino, tempo técnico já faz parte das regras. No masculino, não. A WTA já testa o "off-court coaching", com o treinador liberado para dar instruções para a atleta sem sair de sua cadeira a beira da quadra. O técnico pode até fazer sinais se sua tenista estiver do outro lado da quadra. A ATP também não permite esse tipo de comunicação. A WTA também tem a chamada "heat rule", com intervalo de dez minutos entre o último ponto do segundo set e o começo da terceira parcial em caso de calor. Além disso, há regras e exceções diferentes para a pontuação no ranking. Um regulamento unificado também faria muito pelo tênis em termos de alcance e compreensão por parte dos fãs.

Os obstáculos

Lindo na teoria, nada simples na prática. Mesmo que haja vontade por parte dos dois circuitos, é difícil imaginar essa fusão - como toda fusão - acontecendo agora, durante a quarentena. O cenário mais otimista possível aponta para, quem sabe, um acordo de fusão estabelecido em um futuro próximo. A união de fato dos dois circuitos aconteceria em um processo gradativo, tentando conciliar interesses e, claro, cumprindo os atuais contratos de patrocínio, parcerias e direitos de transmissão.

Talvez esteja aí a parte mais delicada do processo. Analisar os compromissos já firmados e decidir o que é mais benéfico/lucrativo tanto para ATP quanto para WTA: cumpri-los até o fim ou arcar com cláusulas rescisórias e suas possíveis consequências financeiras em nome de uma união mais rápida.

Coisas que eu acho que acho:

- Um tweet de Serena Williams aumentou o interesse no assunto. Sem dizer qual era o assunto, a americana escreveu que "isso era confidencial e não deveria ser compartilhado ainda." Será que ela falava da fusão? de qualquer modo, a ex-número 1 do mundo apagou o tweet poucos minutos depois.

- A ideia de uma fusão já foi ventilada algumas vezes, mas vem sendo mencionada com mais frequência durante este período em que o planeta luta contra o novo coronavírus. No entanto, quando é Roger Federer que fala, o assunto ganha outro nível de holofotes.

- Nick Kyrgios é contra.