Ganso, o homem que vive três segundos à frente do resto da humanidade
Quem quiser saber sobre o futuro pode perguntar a PH Ganso. O meia tricolor não joga fincado no presente. O camisa 10 se coloca como um veículo para deslocar a bola verticalmente em direção ao gol adversário. Antes de receber um passe, Ganso já sabe o que vai acontecer, onde vai tocar, onde o parceiro estará. Ele escaneia rapidamente o ambiente e mentaliza as ações. Nesse momento, o futuro vira presente. É nesse tempo-espaço que Ganso atua. Tem dias que é solitário. Nessa noite de quarta-feira não foi.
Ver Ganso pela TV é demais; mas ver Ganso bailar de dentro do estádio é outra dimensão completamente diferente. Recomendo.
Esse Ganso que despontou na base do Santos e que depois deu a impressão de que não realizaria seu destino de craque renasceu no Dinizismo. No Fluminense de Diniz o camisa 10 joga absolutamente solto. Marca, faz função de ponta, aparece como centro-avante, faz a saída de bola a partir dos pés de Fabio e, claro, arma.
Esse Ganso exuberante joga ao lado de Marcelo. Não quer ir ao estádio ver Ganso? Vá ver Marcelo. Vale cada toque na bola. Vá mesmo sem torcer para o Fluminense. Vá ver o Fluminense quando o tricolor passar pela sua cidade. Veja o que como joga um time não posicional.
E, percebam, não estou nesse momento fazendo juízo de valor. Se é melhor ou pior do que o posicional. Estou apenas sugerindo ir ao estádio ver a movimentação em campo, sem os limites das lentes da TV e da direção de imagem.
A partida dessa quarta-feira 22 de maio foi contra o acanhado e desfalcado Sampaio Correa, do Maranhão, pela Copa do Brasil. Fácil, verdade. O Fluminense dominou de forma total. Houve contra-ataques do visitante, mas tudo parte do jogo que não pretende fingir ter a ilusão de que terá o controle. Não tem controle dado que o jogo é como a vida. Tem entrega, tem solidariedade e tem a vocação para atacar de forma tão coordenada quanto livre.
Como todo sistema contra-hegemônico, o Dinizismo enfrenta dificuldades.
Tem dias que nada dá certo, tem dias que as coisas ficam mornas, e tem dias que o jogo encaixa. Esse Fluminense que conquistou a América agora tem que lidar com o peso do sucesso, com a decodificação que os adversários fizeram de algumas ferramentas de seu método, com problemas de relacionamento que surgem com a afetação que as grandes conquistas oferecem a cada um dos envolvidos. São problemas novos. Os antigos diziam respeito a ser um jogo bonito e não ganhar nada e a ser um jogo ofensivo e ficar muito vulnerável.
O primeiro foi superado e o segundo é parte da estrutura do Dinizismo. É de fato uma forma de jogo mais vulnerável e a beleza, na minha opinião, vem da capacidade de se expor ao vulnerável e se reencontrar na solidariedade.
Em campo, o time tenta desde a saída de Nino encontrar uma zaga para chamar de titular. Há algumas opções e muitos testes, mas ainda não uma dupla fixa. No meio de campo, também boas possibilidades mas ainda sem uma linha titular. Paciência não é atitude exercitada a fartar nessa sociedade então Diniz luta contra o tempo para remontar seu time campeão.
O resultado agregado contra o Sampaio Corrêa foi de 4 a zero para o Fluminense. Dois a zero em cada encontro.
Os resultadistas dirão que o Fluminense jogou mal porque, afinal, o placar é o que determina a opinião. Placar tímido diante de um time tão acanhado. Eu discordaria.
O Fluminense jogou se testando. Testou a saída de bola, testou dois meias (Ganso e Renato Augusto), testou zaga nova (Felipe Melo e Antonio Carlos), testou dois volantes (Martinelli e Alexsander). Arias perdeu um pênalti mas pouco tempo depois, em jogada de Renato Augusto, John Kennedy marcou para delírio da torcida, que fez o urso com ele. Diniz contou com a volta de Gabriel Pires, que estava há um bom tempo no departamento médico e chegou com muitas promessas de versatilidade. Testes e mais testes. Resta saber se esse time vai conseguir crescer no tempo certo: se recuperar na fraquíssima campanha do Brasileirão e seguir avançando nas copas.
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