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Jogador ameaçado no CT pode pedir rescisão do contrato? Entenda

Gabriel Coccetone

15/06/2022 16h14

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Pode até parecer filme repetido, mas não é. Na manhã desta quarta-feira (15), membros da Fúria Jovem, torcida organizada do Botafogo, invadiram o Espaço Lonier, centro de treinamento do clube, para cobrar jogadores e dirigentes pelo recentes resultados negativos no Brasileirão. O episódio pode trazer consequências para o Glorioso, já que o atacante Victor Sá, um dos atletas presentes no momento, está assustado com o ocorrido e não descarta deixar o Alvinegro.

A situação é grave e exige cuidados. Caso o jogador deseje, seria possível pedir rescisão contratual indireta com o clube? Para responder a essa pergunta, o Lei em Campo ouviu especialistas.

"O atleta não deverá ter sucesso em eventual ação de rescisão indireta, pois o clube tem seguranças para dar garantias aos atletas em situações comuns do dia a dia. Situações extraordinárias e imprevisíveis ao empregador, não tem este como impedir, mas tentar reprimir quando ocorrem. No caso, o clube deve acionar a polícia, pois ocorreram crimes previstos na legislação penal. Diferente seria meu entendimento se o clube tivesse autorizado ou facilitado o ingresso dos torcedores", avalia o advogado trabalhista Domingos Zainaghi.

O advogado Maurício Corrêa da Veiga, especialista em direito desportivo e colunista do Lei em Campo, destaca que "o atleta tem o direito de usufruir de um meio ambiente adequado e seguro para o desempenho de suas atividades", mas também não acredita em rescisão indireta do contrato.

"Me parece exagerado que um episódio isolado seja apontado como causa de rescisão indireta do contrato de trabalho (que é a justa causa aplicada ao clube pelo atleta). Me parece que o jogador estava insatisfeito com o clube e aproveitou o fato como pretexto. Situação diferente é quando o clube sofre invasões, não toma as providências e há ameaças e até agressões. É uma situação muito delicada e todos os elementos fáticos precisam ser analisados. Neste caso específico, me parece que não há motivo para a rescisão indireta", explica.

Na mesma linha vai Rubens Gama, advogado especializado em direito trabalhista: "cada caso precisa ser analisado com cuidado e se entender especificidades. Mas é importante lembrar o art. 483, letra 'f', da CLT, que permite a rescisão pela chamada "culpa do empregador" nas hipóteses em que o empregado for fisicamente agredido ou ofendido. Agora, a lei diz que a ofensa deve ser praticada pelo empregador ou por seus prepostos, o que não enquadra nesses casos de ameaças de torcedores. Contudo, esses auto proclamados "torcedores" invadiram o espaço de trabalho do atleta, um espaço em que a segurança precisa ser garantida pelo empregador".

Segundo o jornalista Venê Casagrande, logo após o ocorrido, Victor Sá entrou em contato com a família e seu agente, dizendo estar com medo e que deseja conversar com a diretoria do Botafogo para talvez deixar o clube.

Em imagens que circulam nas redes sociais, é possível ver que os torcedores acessaram uma área onde os atletas estavam fazendo trabalho de recuperação e tratamento. No momento do ocorrido, além de Victor Sá, também estavam presentes Kayque, Del Piage e Diego Gonçalves.

https://twitter.com/CanalDoManel_/status/1537085897530916864?s=20&t=SZpX44pYlH2l_M-bKC_Y2Q

Em um vídeo publicado no Instagram da torcida Fúria Jovem, torcedores que estiveram no CT disseram que "diferente do que foi publicado pela imprensa" não houve invasão e que a entrada foi de livre acesso.

O Botafogo também se manifestou oficialmente sobre o episódio. Em nota oficial (leia no final da matéria), o clube repudiou veementemente "a forma como funcionários e atletas foram ameaçados, intimidados e hostilizados" e disse que "não vai aceitar este tipo de ocorrência".

Ainda segundo o Glorioso, a "polícia foi acionada e a equipe operacional está monitorando a situação para que sejam tomadas as providências cabíveis".

O Botafogo é o primeiro clube profissional de Victor Sá no Brasil. Antes de chegar ao Glorioso, no começo deste ano, o atacante defendia o Al-Jazira, dos Emirados Árabes.

Leia a íntegra da nota do Botafogo

"O Botafogo vem a público se manifestar sobre a invasão de torcedores organizados na manhã desta quarta-feira (15) ao local de treinamentos da equipe profissional. O Clube repudia veementemente a forma como funcionários e atletas foram ameaçados, intimidados e hostilizados dentro de um ambiente privado, de trabalho, e no exercício de suas funções. É inadmissível e o Botafogo não vai aceitar este tipo de ocorrência. Assim como sabe que os envolvidos não representam a torcida alvinegra.

A polícia foi acionada e a equipe operacional está monitorando a situação para que sejam tomadas as providências cabíveis. O Clube aguarda medidas severas dos órgãos competentes. O futebol brasileiro não pode mais se sujeitar a este tipo de episódio, que tem sido recorrente em diversos clubes do país.

Protestos são válidos e aceitos, mas desde que não extrapolem o ambiente de civilidade. Os torcedores têm todo direito de se manifestarem, mas atitudes como essa, com invasão e ameaças, prejudicam a equipe e os projetos que estão em curso.

Ações internas estão sendo realizadas diariamente, com todos os envolvidos no futebol, visando encontrar soluções que gerem melhores resultados em todos os setores. Entendemos o momento complicado em campo. Diretoria, comissão técnica e funcionários estão imbuídos com o projeto de desenvolvimento da SAF e todos estão mobilizados para buscar os melhores caminhos para a Botafogo.

Sobre reportagem veiculada na coluna de "Ancelmo Gois", de O Globo, o Clube nega as ilações de falta de comprometimento dos atletas e os fatos apresentados, tentando entender as reais motivações por trás da notícia. O Botafogo não vai permitir que a dignidade e a credibilidade do trabalho de seus profissionais sejam colocadas à prova por uma reportagem que sequer cumpriu o papel básico do jornalismo: ouvir o outro lado.

A SAF segue com o seu propósito de resgatar o Botafogo e não vai medir esforços para isso. Independentemente de uma fase ruim, as ideias e o projeto seguem inabaláveis e certo de que um caminho sólido está sendo construído."

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