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Diego Garcia

REPORTAGEM

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Nova denúncia relata assédio de Caboclo; oposição teria oferecido propina

Rogério Caboclo, presidente da CBF - Thiago Ribeiro/AGIF
Rogério Caboclo, presidente da CBF Imagem: Thiago Ribeiro/AGIF

Colunista do UOL

25/08/2021 04h00

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A CBF recebeu na última quinta-feira um relato de assédio de mais uma ex-funcionária contra o presidente afastado Rogério Caboclo. É a terceira acusação revelada contra o dirigente, a segunda protocolada na entidade. A primeira gerou uma investigação na Comissão de Ética da CBF, que decidiu afastar Caboclo por 15 meses da sua função. As novas acusações têm os mesmos padrões observados na primeira queixa.

Ontem, a Comissão de Ética definiu que o gestor seria punido por "conduta inapropriada" e não por assédio sexual e moral, que poderia gerar um afastamento de até 10 anos ou mesmo o banimento de Caboclo do futebol. Com a punição estabelecida, ele deve voltar à presidência em setembro de 2022. A punição será alvo de deliberação em uma assembleia geral da CBF. A reunião estava marcada para hoje (25), mas foi cancelada.

O presidente se diz inocente das acusações.

Relato da vítima

Na nova denúncia, a que o UOL teve acesso em sua íntegra, a mulher — que terá seu nome preservado — aponta várias situações constrangedoras com Caboclo dentro da CBF, mesmo antes de ele ser presidente. Alguns trechos da acusação foram divulgados na sexta-feira pelo GE.

Em um dos momentos relatados pela ex-funcionária, ela diz que Caboclo estava bêbado e forçou sua mão entre as pernas da mulher, "tentando enfiar por dentro da calcinha". Isso aconteceu na casa do dirigente, em uma reunião para discutir termos de um contrato com a China.

Mesmo em horário comercial (eram 15h15, segundo a acusação), Caboclo abriu uma garrafa de vinho para beber com a mulher, que não bebeu. O dirigente teria ingerido a bebida mesmo assim e, em seguida, após colocar trajes inadequados para uma reunião de trabalho, teria cometido o ato de assédio sexual. É essa sequência que você vê na imagem abaixo:

Trecho em que ex-funcionária da CBF denuncia assédio de Rogério Caboclo - 1 - Reprodução - Reprodução
Trecho em que ex-funcionária da CBF denuncia assédio de Rogério Caboclo
Imagem: Reprodução

Walter Feldman, citado no trecho acima, nega que tenha tomado conhecimento do assédio: "Isso jamais aconteceu, de ela ter me revelado assédio ou momento violento. Se falei aquilo, foi em outro contexto. Nego de maneira contundente, jamais me revelou ser assediada. Se tivesse acontecido, eu jamais esqueceria ou defenderia, pois seria cúmplice. Tenho esposa e 2 filhas militantes da causa feminista."

A mulher ainda relata ligações e mensagens inadequadas do cartola durante a madrugada em algumas oportunidades. Inclusive, citou mensagens de Caboclo em junho deste ano querendo falar de sexo pelo telefone.

Ela também afirmou que Caboclo fez um advogado ir de São Paulo ao Rio de Janeiro de helicóptero por causa de um motivo urgente. Quando o profissional chegou, o assunto seria perguntar se ela tinha uma relação romântica com um conhecido.

"Só porque saímos para jantar e em nosso retorno ao hotel os diretores (da CBF) nos viram chegar do restaurante. Colocou o trabalho do colega em risco, além de envolver pessoas que não tem nada a ver com a situação de assédio que eu passava", disse a ex-funcionária.

A denunciante ainda descreve abordagens e comentários inapropriados de Caboclo em reuniões, como mostra a imagem abaixo:

Trecho em que ex-funcionária da CBF denuncia assédio de Rogério Caboclo - 2 - Reprodução - Reprodução
Trecho em que ex-funcionária da CBF denuncia assédio de Rogério Caboclo
Imagem: Reprodução

A ex-funcionária afirma que Caboclo a chamava para sua sala alegando reuniões importantes, aí então a arrastava pelo braço para o quartinho com banheiro à direita nos fundos da sala da presidência, ou para a sala do vice Fernando Sarney.

A denunciante relata que os assédios eram conhecidos dentro da confederação, mas que quem sabia se omitia. "Pessoas importantes sabem dessa história, pessoas importantes presenciaram o assédio, e nunca fizeram nada para me ajudar. Pelo contrário, o comentário nos corredores da CBF era que eu 'era do chefe'".

Semelhanças com primeira denúncia

A denúncia é semelhante à primeira, que foi investigada pela Comissão de Ética, ao mencionar suposto envolvimento de bebidas alcoólicas e comentários sexualmente agressivos.

A primeira denunciante afirmou que o dirigente estava sob efeito de álcool durante todo o período em que os abusos teriam ocorrido. Inclusive, que o cartola pedia para ela esconder bebidas pela entidade, em lugares combinados, para ele beber durante o expediente.

Os comentários de cunho sexual feitos por Caboclo também se repetiam. A primeira denúncia dizia que o dirigente, em meio a outros comportamentos abusivos, questionava se ela se masturbava e até a chamou de cadela e tentou forçá-la a comer um biscoito de cachorro.

Os dirigentes da CBF também teriam ignorado os abusos nos dois casos, mesmo com as agressões sendo de conhecimento amplo. A primeira denunciante afirma que o presidente criava narrativas falsas sobre supostos relacionamentos amorosos entre eles na confederação.

A mulher diz que precisou passar por tratamento médico por conta dos abusos e, assim como a terceira denunciante, afirma ter provas dos fatos narrados, como mensagens e áudios de aplicativos de conversa.

A segunda mulher que acusou Caboclo de assédio prestou depoimento ao Ministério Púbico do Rio de Janeiro, que investiga o caso e vem entrevistando diversas pessoas.

Áudios sugerem propina

Desde que a denúncia veio à tona na CBF, a pedido do presidente afastado, dois áudios vêm circulando entre os cartolas do futebol para defender a versão de Caboclo. O UOL teve acesso aos dois áudios —trechos estão no vídeo acima. Na sexta-feira, a ESPN publicou transcrição de um deles.

Nas conversas — que, segundo apurou a coluna, foram gravadas sem consentimento das mulheres —, um colaborador da CBF próximo a Caboclo conversa com a mãe da denunciante e também com a própria mulher.

Questionada pelo colaborador "como estão as negociações com o Marco Polo, o que ele pediu?", a mãe afirma que a filha foi vítima na situação.

"Minha filha gostava muito de trabalhar na CBF, onde o Rogério veio a ser presidente, sendo controlado pelo Marco Polo. E o Rogério prejudicou muito minha filha. Ela foi uma vítima da CBF. Mas ela gosta muito dele, não sei porquê. Ela sente um carinho por ele, gosta dele, apesar de profissionalmente ter prejudicado a minha filha", disse a idosa na gravação.

"O advogado dela recebeu uma proposta da CBF que eles estão tentando, que o Marco Polo está tentando, usar a minha filha, que foi uma vítima, para tirar o Rogério da CBF", continuou.

Em seguida, ela afirma que depois eles voltaram a ligar para a sua filha para oferecer emprego na confederação, como forma de pressão. "Já tiraram um diretor da CBF e que a vaga está aberta para ela. Para voltar, que seria a primeira mulher a voltar e trabalhar na CBF na diretoria. Foi isso que eles ofereceram. E a CBF ofereceu ao advogado dela R$ 1 milhão", afirmou a senhora.

Em outro áudio, o mesmo colaborador entra em contato com a própria denunciante para tentar convencê-la a apresentar um depoimento para ajudar Caboclo, a pedido do dirigente, que teria "pedido uma ajuda".

"Estou preocupado com você. Vieram boatos de que estão oferecendo cargo, grana, cargo de diretor, para você prejudicar o RC (Rogério Caboclo). Não acho que isso vai ser legal porque vai te jogar dentro de um bolo", disse o homem. "Ninguém gosta de saber que estão te usando. Você sabe que os caras são bravos do lado de lá".

A mulher, em resposta, diz que está sendo pressionada. "Recebi uma notificação do Ministério Público, estou em uma situação complicada. Nunca imaginei que essa situação fosse chegar a esse ponto", afirmou.

Perguntada se recebeu oferta em dinheiro, afirmou que recebeu proposta de indenização e cargo para "corrigir um erro do passado", mas que ela não aceitou e respondeu que "não cabe, pois estão fazendo isso pelo motivo errado".

O homem insiste em um depoimento positivo por parte da mulher que acusa o dirigente de assédio. Ele apontou que Caboclo gostaria que ela pelo menos confirmasse que recebeu oferta em dinheiro. "Acho que isso te ajuda". A mulher diz, então, que a situação está sendo resolvida pelo advogado.

Por fim, o colaborador emenda a pergunta: "Eu sei que você gosta do Rogério, como pessoa". A mulher respondeu: "Fora algumas questões, ele sempre foi um chefe, do lado profissional".

Del Nero foi procurado para comentar os áudios, mas não respondeu.

Caboclo alega complô de Del Nero

Em sua defesa, Rogério Caboclo aponta um complô de Marco Polo, ex-presidente da CBF que foi banido do futebol pela Fifa por corrupção, para tirá-lo da entidade. Anteriormente, já havia dito que foi o ex-presidente quem o procurou para falar dos R$ 12 milhões em troca do silêncio da primeira denunciante — Del Nero diz o contrário.

O ex-presidente está banido do futebol pela Fifa desde abril de 2018, por conta de denúncias de corrupção feitas na Justiça dos Estados Unidos. O fato, porém, não o impede de exercer grande influência sobre o futebol brasileiro. Ele, por exemplo, mantinha conversas diárias com Caboclo antes de romper com o dirigente.

Caboclo chegou a acusar, anteriormente, atuais membros da diretoria da CBF de se reunirem na casa do ex-presidente para fazer festas e, nelas, arquitetar sua derrocada e a consequente retomada definitiva do poder por parte de Marco Polo. Seria a volta do que Caboclo chamou de "velha prática do toma lá dá cá".

Em nota para falar sobre mais uma acusação de assédio, Caboclo afirmou que repudia as "acusações levianas e falsas lançadas contra ele e nega veementemente que tenha cometido atos que configurem assédio em relação à mencionada funcionária da entidade".

O dirigente cita os áudios do colaborador com as mulheres como forma de defesa. Confira, abaixo, a alegação de Caboclo

"Ocorre que, durante o processo do afastamento ilegal de Caboclo do cargo, ele recebeu áudios de diálogos da acusadora e de sua mãe, gravados no dia 04/07/2021, com um ex-colaborador da CBF. Elas relatam de forma clara o recebimento de proposta para prejudicar Rogério Caboclo e retirá-lo definitivamente do comando da entidade. As propostas incluíam oferecimento de alto cargo de direção na CBF, além de R$ 1 milhão.

Essas tentativas de cooptação da funcionária, como comprovam as conversas, foram conduzidas pelos diretores Gilnei Botrel e Manoel Flores, aliados do ex-presidente banido do mundo do futebol e investigado pela Polícia Federal, Marco Polo Del Nero. A defesa de Rogério Caboclo já entrou com pedido de investigação na Comissão de Ética da CBF contra os diretores citados no áudio por suspeita de corrupção de testemunha e contra o ex-presidente da CBF".

Os diretores citados nas conversas são Gilnei Botrel e Manoel Flores, como supostos interlocutores da CBF com a denunciante. A entidade retrucou o presidente afastado, por meio do seu departamento de comunicação.

"A CBF tomou conhecimento dos episódios narrados mediante o recebimento de denúncia formal encaminhada pelos advogados da ex-funcionária e remeteu o expediente de imediato à Comissão de Ética do Futebol Brasileiro", disse a confederação

A CBF afirmou que Gilnei Botrel e Manoel Flores negaram qualquer ação neste sentido e acrescentaram se tratar de estratégia diversionista e falaciosa do ex-presidente diante das novas acusações de extrema gravidade.

O que vai acontecer agora?

Afastado pela Comissão de Ética, Caboclo ficará fora do cargo até setembro de 2022. Até lá, o presidente em exercício da CBF é o coronel Antônio Nunes, vice-presidente mais velho da entidade, com 82 anos.

Com os 15 meses totais de punição, Caboclo ainda poderá cumprir a parte final de seu mandato, que vai até abril de 2023. Ele voltará à cadeira, provavelmente, depois da eleição para o mandato seguinte. A perspectiva é que a CBF eleja o novo presidente em abril de 2022.

Sem o afastamento definitivo de Caboclo, eleito em 2018, não haverá eleição entre os oito vice-presidentes que fizeram parte da chapa com ele, como era esperado. Isso é uma frustração para os vices que já almejavam um pleito em cerca de 30 dias para completar o mandato até abril de 2023.