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Bala na Cesta

Como jogo da seleção fez explodir a crise entre CBB e LNB

CBB - Divulgação CBB/LNB
CBB Imagem: Divulgação CBB/LNB

27/02/2020 05h09

Enquanto você curtia o Carnaval numa boa, uma bomba explodiu no basquete brasileiro. Não dentro de quadra, mas uma que estava pronta para ser disparada, esperando apenas o primeiro passo de um dos lados.

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Aconteceu na segunda-feira (24) mesmo, logo após a seleção brasileira ter vencido o Uruguai por 83 a 76 na prorrogação em Montevidéu, em partida válida pelas eliminatórias da AmeriCup. A Liga Nacional de Basquete publicou isso aqui em seu Instagram, vejam só:

Não sei se ficou claro, mas no final a Liga Nacional assina assim: "Agora o torneio será retomado somente no dia 26 de novembro, quando o Brasil receberá o Panamá, em casa (mais aqui). Valeu, Seleção NBB". Aí, no mesmo post, a Confederação Brasileira de Basketball comentou o seguinte: "Se a Seleção é Brasileira, engraçado seria se a base do time não fosse da principal Liga do país e sim da Argentina ". Não parou por aí, não. No mesmo dia, e em uma resposta rápida, a CBB colocou em seu site uma matéria-provocação cujo dizer no Twitter foi bem claro:

Quem acompanha este espaço e tem um mínimo de conhecimento (com senso crítico, claro) sobre a situação das duas entidades (Liga Nacional de Basquete, que organiza o NBB, e Confederação Brasileira) sabe que que as instituições (com o perdão da palavra forte) se ODEIAM. Não há outro termo, sinceramente falando. Infelizmente a imprensa cobre muito pouco do caso, com pouca independência e quando uma situação como a de segunda-feira acontece quase todo mundo é pego de surpresa. Nem deveria ser surpreendente assim, embora chocante e lamentável igual.

Antes, com Carlos Nunes no comando da entidade máxima havia respeito, diálogo, em muitas vezes a LNB até salvava Nunes de micos ainda maiores (antes da Olimpíada de 2016 a Liga Nacional pagou passagens de times de base inclusive, como esse blog relatou com exclusividade). Com a chegada de Guy Peixoto em 2017 (e aqui não há juízo de valor), tudo isso ruiu. Não há conversa, não há civilidade, não há nada. É desconforto para todo lado. Vamos, agora, a alguns pontos que penso:

1) Acho que a reação da CBB, sobretudo no Twitter bloqueando todo tipo de usuário que criticava a atitude da entidade, foi desproporcional. Não tinha necessidade disso. Rede social é espaço de debate, diálogo, e é fundamental ler as reações. Mas, e aí é importante, creio que a Liga Nacional se equivocou absurdamente na forma como ela abordou o jogo de segunda-feira. Não é seleção NBB. Não é seleção NBA. Não é seleção LBF. Não é seleção Bala na Cesta. A seleção é BRASILEIRA. É do país. Não de uma Liga, de um clube, de nada. Acho, sim, que a Confederação poderia ter conversado internamente pra azeitar isso tudo, mas não me parece o modus operandi das duas turmas e aí a guerra foi pro lado público mesmo. Com um detalhe básico: nesta janela de eliminatória os clubes que disputam competições continentais (Euroliga, Champions League das Américas) e NBA não liberariam seus atletas. Desde sempre a CBB explicou que 99% dos atletas convocados seriam, mesmo, do país (a exceção nesta chamada foi de Rafa Luz, do Murcia, da Espanha). Todos sabiam disso, e provavelmente isso não tenha caído bem para a Confederação. Ter um time do NBB não "fala bem" sobre a Liga, mas sim era uma necessidade do momento.

2) O texto que a CBB publicou logo em seguida em seu site merece sem dúvida alguma uma grande reflexão (como os jovens têm dificuldade de subir da base pro adulto), mas tampouco creio que ali (site oficial) seja o fórum para tal. A forma como (o texto) foi divulgado no Twitter, ainda mais. Soou como provocação, resposta, e não há a menor necessidade disso. Foi a dinamite final em uma guerra que se antes era de trincheiras ficou 100% visível para todo mundo - inclusive para quem queria se enganar e acreditar que estava tudo bem. Nunca esteve.

3) Houve um tempo que a Federação Internacional tentou interceder, colocando um mediador entre as partes, para fazer o diálogo acontecer logo depois que a suspensão da Confederação foi homologada (final de 2016, ainda com Carlos Nunes no poder). Com Nunes algumas coisas ainda fluíam. Com Guy Peixoto, e nem acho que a culpa é só dele, jamais. Nunca houve um mísero centímetro de aproximação. Teve muita gente que acreditou que a paz havia sido selada. Eu, não. Os caras apertaram a mão na reunião com José Luiz Saez, o interventor da FIBA por aqui quando a CBB foi suspensa, e logo depois voltaram ao normal (deles): discussão nas trincheiras, desalinhamento total e provocações veladas. Terrível.

4) Ano que tem eleição na CBB. Quem vota, basicamente, para o presidente da Confederação são os presidentes de Federação (que fazem o que mesmo?). Estes, das Federações, têm seríssimas restrições ao pessoal da Liga Nacional. Ajuda a entender, não?

5) A Liga Nacional de Basquete tem INÚMERAS falhas, mas em mais de uma década por aqui ajudou a reconstruir a modalidade quando o basquete estava na vala, no buraco, quebrado. Isso precisa ser dito.

6) A reclamação de Guy Peixoto, a quem respeito pra caramba, com a Liga Nacional vem de looooooooooonga data. Desde que o seu Paysandu, de Belém, do Pará, não foi aceito no NBB que Guy fez juras de "amor" ao pessoal do NBB. Não é de agora. Isso tem mais de uma década. Uma de suas bandeiras de campanha, inclusive, foi conversar com Federações e caciques políticos sobre como a Confederação perdeu espaço para a LNB nos últimos anos e em como isso seria refeito por ele.

7) Seu primeiro ato foi trazer de volta para a CBB a Liga Ouro, a segunda divisão. O segundo, peitar para que a Liga Nacional não mais fizesse a sua Liga de Desenvolvimento (LDB). Por fim, a entidade máxima desejava ter o STJD sob sua tutela, assim como a escala de arbitragem dos jogos do NBB.

8) Existe uma questão fundamental nisso tudo. Ela é de ordem financeira / mercadológica. O NBB é um campeonato superavitário, bem visto por patrocinadores, tendo o carinho da comunidade do basquete mesmo com todos os seus problemas, com todos os jogos sendo exibidos e sendo de forma disparada a melhor liga de esporte profissional do Brasil. A CBB não possui um patrocinador-máster até agora, lançou seu campeonato da segunda divisão recentemente e busca se reerguer financeiramente depois de 8 anos de gestão Carlos Nunes - a mais catastrófica da história da entidade. Ignorar isso, ou tirar da equação esse fator, é um equívoco.

9) Será que Liga Nacional de Basquete e Confederação não entendem que o basquete brasileiro, como um todo, só será forte quando os dois forem MUITO unidos? Cada um tem a sua função e cada um deveria saber até onde o outro vai. Falei disso quando Guy foi eleito - da necessidade de um organograma completo e um mapa de ações e deveres das entidades -, mas nada foi feito dos dois lados. Não houve tentativa de aproximação das duas partes. Só distanciamento, o que é terrível. Não há NBB de alto nível se não houver massificação por parte da CBB. Não há, no final das contas, modalidade bombando se o campeonato nacional de elite (o NBB) continuar com jogadores veteranos e sem a menor renovação. A quem interessa esse caos? A ninguém! São pessoas inteligentes dos dois lados e não custa uma conversa sincera, honesta e final para aparar as arestas. Guy, o presidente da CBB, e Kouros Monadjemi, da LNB (ele está licenciado no momento), são empresários de sucesso, do bem, querem ver o esporte de novo voando, estou certo disso. Custa uma conversa?

10) Alguém se habilita para colocar as duas entidades para sentar, aparar as arestas e saírem juntos para melhorar o esporte nacional? Há alguém capaz disso por aqui? Sem profissionalismo, gestão, união de forças e paz o basquete brasileiro não sairá do lugar.