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Ex-aliado de Cabral, senador de Lula no Rio tem trânsito com bolsonaristas

Lula e Marcelo Freixo posam com o deputado estadual André Ceciliano, pré-candidato do PT ao Senado no Rio - Ricardo Stuckert/ Divulgação
Lula e Marcelo Freixo posam com o deputado estadual André Ceciliano, pré-candidato do PT ao Senado no Rio Imagem: Ricardo Stuckert/ Divulgação

Igor Mello

Do UOL, no Rio*

08/07/2022 04h00

Escolhido pelo ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) como seu pré-candidato ao Senado no Rio de Janeiro em meio a uma disputa com o PSB, o deputado estadual André Ceciliano (PT), presidente da Alerj (Assembleia Legislativa do Rio de Janeiro), é um negociador hábil e transita entre diversas forças políticas, inclusive bolsonaristas. Por outro lado, foi atingido nos últimos anos por denúncias de corrupção.

Considerado hoje um dos principais articuladores políticos do Rio, Ceciliano ganhou protagonismo no vácuo de poder causado pela derrocada do MDB no estado, após as prisões dos ex-governadores Sérgio Cabral e Luiz Fernando Pezão —ele apoiou ambos. Hoje, ele é cortejado por deputados, prefeitos e lideranças políticas de todos os espectros.

Sua indicação ao cargo é motivo de uma crise na aliança de Lula no Rio. A prerrogativa de lançar um candidato próprio ao Senado foi uma das exigências do PT no intrincado acordo com o PSB —responsável por indicar Geraldo Alckmin como vice de Lula. Apesar disso, o deputado federal Alessandro Molon (PSB-RJ) resolveu manter-se na disputa, o que irritou Lula e Marcelo Freixo, pré-candidato do PSB ao governo do Rio.

No ato de Lula ontem, na Cinelândia, centro do Rio, o ex-presidente fez questão de mostrar que Ceciliano é o seu escolhido. Enquanto o presidente da Alerj fazia seu discurso —com alfinetadas em Molon—, Lula se levantou e permaneceu em pé ao lado dele, sorrindo.

Durante todo o ato, fotos de Ceciliano junto a Freixo e Lula eram mostradas no telão, e o jingle do pré-candidato ao Senado tocou diversas vezes ao longo da noite. De mãos dadas, Lula, Geraldo Alckmin (PSB), pré-candidato a vice-presidente, Freixo e Ceciliano mostraram união na frente do palco. No entanto, em seu discurso, Lula não fez menção a Ceciliano ou à disputa pela indicação ao Senado.

O presidente da Alerj demonstra confiança em suas chances de vitória, apesar do que as pesquisas mostram neste momento: Molon apareceu com 14% e ele com apenas 4% no levantamento da Real Time Big Data, divulgado há uma semana.

"O Lula veio ao Rio para lançar a chapa Lula, Freixo e Ceciliano", diz. "Existem dois acordos, um no Rio e outro entre as executivas nacionais. Acordo na política se cumpre."

Ele aposta no apoio de Lula como impulso para crescer nas pesquisas. Na Baixada Fluminense, seu reduto político, as candidaturas petistas sempre tiveram votações expressivas. Em 2018, essa tendência se inverteu e Jair Bolsonaro (PL) venceu com quase 70% dos votos na região. Segundo Ceciliano, essa situação já foi revertida.

"Na Baixada, o Lula está na frente. Temos uma dificuldade entre os eleitores evangélicos, mas quando o Lula começar a falar o que fez vai mudar. O Lula deu dignidade aos pobres, tem muito a falar."

Comando da Alerj

Ele está em seu quarto mandato como deputado estadual, sempre aliado do grupo político comandado pelo ex-governador Sérgio Cabral.

Assumiu interinamente a presidência da Alerj em 2017, na esteira da hecatombe causada pela Operação Cadeia Velha na política fluminense. A fase da Lava Jato do Rio, deflagrada em novembro daquele ano, prendeu o então presidente da Alerj, Jorge Picciani, o ex-presidente da Alerj Paulo Melo e o líder do governo na Casa à época, Edson Albertassi.

Em 2019, foi eleito presidente da Alerj com o apoio do governador Wilson Witzel —movimento que provocou descontentamento tanto em bolsonaristas quanto na bancada de esquerda da Casa. Após romper com o ex-juiz, articulou o processo de impeachment de Witzel, aprovado por unanimidade em todas as votações.

Com a chegada do vice-governador Cláudio Castro (PL) ao poder, Ceciliano voltou a se aproximar do governo do estado, tendo influência sobre nomeações no primeiro escalão. Só recentemente, após pressões de aliados à esquerda, se afastou de Castro —pré-candidato do presidente Jair Bolsonaro (PL) no estado.

No entanto, ele continua sendo figura frequente em eventos políticos organizados por deputados estaduais da base de Castro. Sobre as críticas por sua proximidade com políticos bolsonaristas e com Castro, Ceciliano rebate:

"Manter diálogo com todos não é defeito, mas qualidade. Graças a isso, sou seguramente o deputado que mais aprovou leis na história da Alerj —são 400, entre elas, temas muito caros à esquerda. Minha origem é a Baixada Fluminense, uma região que sabe bem que discurso político pode ser bonito, mas não ajuda o povo a tirar o pé da lama, não gera emprego e nem enche a barriga de ninguém."

Denúncias de corrupção

Desde que assumiu protagonismo político no RJ, o nome de Ceciliano tem aparecido em denúncias de corrupção.

A primeira delas ocorreu no relatório do Coaf (Conselho de Controle de Atividades Financeiras) que detonou o escândalo de rachadinha no gabinete de Flávio Bolsonaro na Alerj. O documento trouxe a informação de que três pessoas ligadas ao petista tiveram movimentações atípicas de R$ 45 milhões entre 2011 e 2017.

O presidente da Alerj teve os sigilos fiscal e bancário quebrados em 2019, mas o MP-RJ não encontrou elementos que o incriminasse. O caso continua até hoje na Justiça, mas foi enviado para a primeira instância —como Ceciliano tem foro privilegiado, isso significa que ele não está no rol de investigados.

Outra menção ao nome do petista ocorreu nas investigações que levaram à queda de Wilson Witzel do governo do Rio. Em delação premiada, o ex-secretário estadual de Saúde Edmar Santos acusou Ceciliano e outros deputados estaduais de manobrarem repasses a municípios para receberem parte dos valores de volta.

O MPF investigou repasses de R$ 109 milhões da Alerj para municípios do interior do Rio, como Campos dos Goytacazes, Carapebus, Bom Jesus do Itabapoana e São Fidélis. Ceciliano diz ter sido inocentado no caso e afirma que, se tivesse de fato um esquema com o governo estadual para desviar verbas da saúde, não teria articulado a cassação de Wtizel.

"A delação do ex-secretário Edmar em relação a mim e à Alerj como um todo era tão frágil que, após as investigações, vários nomes foram citados na denúncia feita à Justiça pelo MPF e o meu não está lá", diz ele.

*Colaborou Lola Ferreira, do UOL, no Rio