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Cuidado com segurança e com o TSE deixa Lula 'contido' na pré-campanha

30.mar.2022 - Lula discursa durante evento do Partido dos Trabalhadores em Salvador, na Bahia - Max Haack/Estadão Conteúdo
30.mar.2022 - Lula discursa durante evento do Partido dos Trabalhadores em Salvador, na Bahia Imagem: Max Haack/Estadão Conteúdo

Leonardo Martins

Do UOL, em São Paulo

08/04/2022 04h00

Diante da intensa movimentação de pré-candidatos à Presidência, a campanha de Luiz Inácio Lula da Silva (PT) tem debatido — e vem sendo cobrada internamente no partido — para que o ex-presidente intensifique sua agenda e apareça mais ativamente na corrida eleitoral.

Lula, porém, tem demonstrado a aliados até agora estar "tranquilo" e "cuidadoso", segundo o UOL apurou com interlocutores do petista. O ex-presidente, que centraliza boa parte das decisões, prevê dar um passo adiante na campanha ao final deste mês, com deve lançar sua pré-canditura. Por ora, a preocupação com sua segurança pessoal e o receio de arrumar problemas no TSE (Tribunal Superior Eleitoral) evitam que o ex-presidente coloque a pré-campanha na rua.

A reportagem conversou nos últimos dias com integrantes do PT, ex-ministros e amigos próximos de Lula que relataram sobretudo o receio do petista de ser acusado judicialmente de campanha antecipada. Citam como exemplo o episódio do festival Lollapalooza, quando a cantora Pablo Vittar levantou uma bandeira com a foto de Lula, e o TSE tentou censurar atos políticos que possam ser enquadrados como propaganda eleitoral — a ação foi revogada.

O próprio lançamento da pré-candidatura do ex-presidente ao Palácio do Planalto tem sido reavaliado com frequência, pelo temor dos advogados do partido de acusações de crime eleitoral. Antes previsto para março, o evento agora deve acontecer em 30 de abril, às vésperas do Dia do Trabalhador — mas a data ainda foi não batida pelo PT.

A "virada de página", disse um amigo do presidente, ocorrerá com a oficialização da pré-candidatura e com a participação mais frequente de Lula em agendas públicas.

'Campanha possível'

Para a maioria dos políticos que trabalham na campanha de Lula, o petista tem feito "a campanha possível" no momento e consideram injustas as cobranças de mais movimentação para enfrentar sobretudo o presidente Jair Bolsonaro, seu principal adversário na disputa e sob os holofotes diários da imprensa,

Mas, mesmo na equipe do petista, há quem defenda uma exposição maior de Lula nas ruas e uma aproximação com outros setores além da esquerda. O colunista do UOL Ricardo Kotscho, que trabalhou na comunicação do governo Lula, escreveu que "em nenhuma das suas cinco campanhas presidenciais anteriores, a campanha dele demorou tanto para pegar no tranco".

O senador Randolfe Rodrigues (Rede-AP) defendeu recentemente uma mudança de postura do ex-presidente. "A campanha de Lula, e faço uma autocrítica porque estou nela, tem que ir para a rua, chamar toda a sociedade para conversar", disse em entrevista ao site Metrópoles.

Outros aliados do ex-presidente, no entanto, argumentam que, mesmo sendo criticado por estar "parado", Lula lidera as pesquisas eleitorais e defendem que, quanto menos expuser por enquanto, melhor será para Lula neste momento.

Para interlocutores de Lula, há uma equivocada sensação de imobilidade que seria explicada pela estratégia do ex-presidente de evitar dar entrevistas a veículos da chamada "grande imprensa". O petista tem concedido entrevistas a veículos menores e rádios específicas de determinados estados. Ontem, por exemplo, ele conversou com a rádio Jangadeiro BandNews de Fortaleza, e tratou de recentes declarações polêmicas: o pedido para pressionar deputados e a defesa do direito ao aborto.

Entre as agendas públicas, aliados próximos relembram o primeiro périplo que o ex-presidente fez por Brasília em outubro do ano passado, encontrando políticos e posando para fotos com governadores do PT.

Em novembro do ano passado, quando a movimentação pelo Brasil era ainda mais tímida, o ex-presidente viajou para Europa e se reuniu com autoridades como Olaf Scholz, chanceler da Alemanha, e o presidente da França, Emmanuel Macron, que recebeu o petista com honrarias de chefe de estado.

No final de março, Lula viajou ao Rio de Janeiro para o evento de aniversário do PCdoB, participou de um evento sobre democracia na Uerj (Universidade do Estado do Rio de Janeiro) e se encontrou com artistas — como Paulinho da Viola, Ludmilla, Zeca Pagodinho, Martinho da Vila e Gabi Amarantos.

Procurada pela reportagem, a presidente do PT e deputada federal, Gleisi Hoffmann, disse que o partido está em "pré-campanha" e que a " legislação eleitoral veda algumas coisas".

"Lula não está parado, desde o ano passado deu início a uma série de conversas e viagens, inclusive pelo Nordeste e ao exterior. Nesse ano, ele fez viagens ao Rio de Janeiro numa agenda intensa, foi a Bahia, ao Paraná, onde participou da filiação do senador Roberto Requião, se reuniu com movimentos sociais, conversou com sindicalistas e petroleiros", afirmou Gleisi.

Coordenador do Grupo Prerrogativas e advogado próximo de Lula, Marco Aurélio de Carvalho classifica as cobranças de uma pré-campanha mais ativa como "injustas e injustificadas".

"Não há, no país, nenhuma outra liderança política com uma agenda de compromissos tão intensa quanto a do ex-presidente. Lula respeita a legislação eleitoral e a liturgia dos partidos, e, por isso, todos os seus movimentos são calculados e cuidadosos. Precisamos aguardar as reuniões entre PT, PSB e demais partidos aliados", afirma o advogado.

Na manhã desta sexta, Lula participará de um evento com o PSB para selar chapa com Geraldo Alckmin nas eleições.

A demanda de ampliação da agenda de Lula vem também de parlamentares e outros pré-candidatos de olho na eleição e no palanque do petista.

Lula tem concentrado — e centralizado — decisões relacionadas às alianças partidárias do PT. Ele é figura central nas negociações com PSB para uma federação e, caso a união por quatro anos venha a ser concretizada, é ele quem terá a palavra final para definir o candidato do grupo ao governo de São Paulo: o ex-prefeito Fernando Haddad (PT) o ex-governador Márcio França (PSB).

Segurança pessoal

A segurança de Lula é outro temor relatado por aliados neste momento, que dizem esperar uma corrida eleitoral "dura" e "violenta" — alimentada pela expectativa de ataques de apoiadores de Bolsonaro.

Colocar Lula em agendas abertas na rua, como feiras livres e eventos públicos com aglomeração — que o petista costumava fazer em suas campanhas à Presidência —, é considerado hoje um risco a sua própria vida pelos seus aliados.

Em 2018, durante a campanha, dois ônibus de uma caravana do petista, que viajava o Sul do país, foi alvejada por tiros. Em março, a agenda de Lula nos eventos no Paraná vazou em grupos bolsonaristas e fez com que a campanha mudasse os caminhos de última hora, conforme revelou o site The Intercept Brasil.

A segurança pessoal de Lula, nas futuras agendas públicas, será reforçada. No âmbito pessoal, já houve mudanças. Foi por receio de sua segurança que o petista foi convencido a se mudar de São Bernardo do Campo (no ABC) para a região central da capital paulista.