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Noah Scheffel

OPINIÃO

Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.

Novo governo Lula e o BBB 23 começam com uma ausência em comum

Camarote do BBB 23 - Reprodução
Camarote do BBB 23 Imagem: Reprodução

Colunista do UOL

16/01/2023 06h00

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Janeiro é conhecido como o Mês da Visibilidade Trans. Isso é importante para nós, pessoas trans, pois em 2004, organizadas pela ANTRA, 27 transexuais e travestis de diversos movimentos sociais foram até o Congresso Nacional reivindicar por direitos.

O objetivo era tornar visível o cenário de exclusão existente para a população transvestigênere em questões como acesso à saúde, respeito aos nomes, reconhecimento do trabalho sexual como digno, direito ao trabalho decente, direito à vida, entre outros.

De lá para cá, avançamos em alguns destes cenários. Mas o Brasil ainda é o país, pelo 14º ano consecutivo, que mais assassina e suicida pessoas trans no mundo. Não é à toa que nossa expectativa de vida é de apenas 35 anos de idade.

Falar sobre visibilidade trans é necessário para que essa esta realidade mude. E ela só vai mudar com ações.

Porém, como saber que ações tomar, quando as barreiras que são impostas a nós não são conhecidas a partir de nós? É impossível uma pessoa cisgênero afirmar que conhece tanto a vivência de uma pessoa trans, ao ponto de saber falar quais são os desafios que enfrentamos e o que precisamos.

Assim como é impossível uma pessoa transfeminina, ou seja, mulheres trans e travestis, saber quais as particularidades, barreiras e desafios enfrentados por mim, homem trans, e pelas demais transmasculinidades.

Talvez você não saiba, mas o "guarda-chuva" transgênero é formado por várias identidades trans: travestis, mulheres trans, homens trans, não bináries, transmasculines, entre outras. Lembro aqui que pessoas transgênero são aquelas que não se identificam total ou parcialmente com o gênero que lhes foi atribuído no nascimento. Por isso, existem diversas identidades dentro deste "guarda-chuva".

Porém onde estão os homens trans e as transmasculinidades nos espaços da sociedade? Somos sistematicamente apagados inclusive em um mês que deveríamos ser incluídos.

Um novo governo se inicia, e se fala como nunca antes nos grupos minorizados que precisam de ações reparatórias, e que elas serão feitas.

Ainda assim, neste momento que parece ser a melhor chance que já tivemos para conquistar direitos e acessos, não há um representante de nós, homens trans e transmasculinos, dentro todas as pessoas e cargos já divulgados. Se não existimos agora para este governo, quando que seremos visíveis?

Ainda que haja uma pessoa transfeminina fazendo parte desta equipe, pela primeira vez na história, ela ainda não consegue, nem na melhor das intenções, me representar.

E essa exclusão de existência se dá na sociedade como um todo.

Começa o BBB neste mesmo momento. O programa com maior audiência da televisão brasileira. E nós também não estamos lá.

Como você deve saber, na edição anterior do programa tivemos a participação da artista Linn da Quebrada, que é uma travesti. Assim como em 2011, tivemos a participação da Ariadna Arantes, uma mulher trans. Essas foram as duas únicas participações de pessoas do "guarda-chuva" trans a estar neste local: ambas, identidades transfemininas.

Enquanto homem trans, eu não existo nem para o governo Lula, nem para o BBB: lugares tão distintos, mas com a minha exclusão em comum.

Precisamos estar nos locais para que as pessoas saibam que homens trans existem. Que nós também fazemos parte dessa sociedade que nos exclui, priva, silencia, mata e suicida. Pois só assim conseguiremos mudar essa triste realidade.