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Mariana Belmont

OPINIÃO

Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.

Plano diretor de Porto Velho aprofunda as desigualdades raciais e de gênero

Vista aérea de Porto Velho - Divulgação
Vista aérea de Porto Velho Imagem: Divulgação

Mariana Belmont*

Colunista do UOL

02/09/2022 06h00

Analisar como as mudanças climáticas impactam a vida das populações urbanas dos municípios da Amazônia Legal é o que pretendem os estudos empreendidos pela Iyaleta - Pesquisa, Ciências e Humanidades, que lançou essa semana o estudo chamado "Impactos das Mudanças do Clima na Urbanização Desigual de Porto Velho (Rondônia)". A análise socioespacial integra o "Projeto Amazônia Legal Urbana - Análises Socioespaciais de Mudanças Climáticas", uma realização da confluência formada pelos pesquisadores Andrêa Ferreira, Emanuelle Góes e Diosmar Filho.

O estudo analisa como o plano diretor aprovado pelo município de Porto Velho ordena o território urbano, além de contribuir e aprofundar as desigualdades raciais, étnicas e de gênero, em meio aos desafios de propor ações diante dos efeitos e impactos das mudanças climáticas nessa década. As dimensões dos eventos climáticos extremos nas áreas urbanizadas de Porto Velho são reconhecidas pelas rugosidades da formação urbana do município.

A capital do estado de Rondônia já está sob impacto do aquecimento da superfície, devido à segregação e aos crimes de desmatamento da floresta Amazônia, que colocam em desigualdades a maioria populacional pelas condições de saúde, saneamento, abastecimento de água, na distribuição de renda e trabalho, nas condições de moradia, pela poluição atmosférica, no acesso à terra ocupada.

A análise socioespacial das desigualdades e mudanças climáticas é estruturada a partir do levantamento de documentos públicos e produções científicas do campo da climatologia, levantamento e análise de dados públicos e de base territorial, a compreensão e produção de tabelas, gráficos e mapas temáticos; encerrando com a análise socioespaciais e epidemiológicas das desigualdades urbanas considerando as dimensões raciais e de gênero, e políticas públicas de ordenamento territorial frente às necessidades e urgência de se elaborar e efetivar ações de enfrentamento as às mudanças do clima, conforme aponta o Sexto Relatório de Avaliação (AR6) "Impacto, Adaptação e Vulnerabilidade" do Painel Intergovernamental de Mudanças Climáticas - IPCC (2022).

No estudo de Porto Velho, as pesquisadoras identificaram que são as mulheres negras e indígenas porto-velhense as mais impactadas pelas mudanças climáticas em decorrência das desigualdades existente, devido a falta de acesso às condições básicas de direitos humanos, como saneamento básico, abastecimento de água, moradia e acesso aos serviços de saúde.

E alerta para a necessidade das instituições públicas estaduais e municipais planejarem e executarem ações de adaptação que tenha como referência as mudanças de precipitação diária, o aquecimento superficial do território, o desmatamento legal e ilegal, as queimadas e taxa elevada de vulnerabilidade humana, para efetividade dos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS), os Plano Nacional de Adaptação à Mudança do Clima - PNA (Brasil, 2016) e o Pacto Climático de Glasgow - COP26 (2021).

Olhando para metas dos ODS e PNA, o estudo apresenta como desafio a superação da baixa cobertura dos serviços de atenção básica, pois mais da metade (56,33%) dos domicílios de Porto Velho nunca haviam recebido visita de Agente Comunitário de Saúde ou de Equipe de Saúde da Família, enquanto apenas 12,29% relataram visitas mensais, em um cenário em que apenas 43,44% dos domicílios porto-velhenses estavam cadastrados em Unidades de Saúde da Família.

Situação semelhante ocorre quando analisamos os dados sobre frequência de visita de Agente de endemias: Quase 70% dos domicílios da capital Porto-Velho nunca receberam visitas e apenas 0,34% dos domicílios recebem visitas mensais de Agentes de endemias.

"A capital do estado de Rondônia já está sob impacto do aquecimento da superfície, devido à segregação e aos crimes de desmatamento da floresta Amazônia, que colocam em desigualdades a maioria populacional pelas condições de saúde e saneamento básico, na distribuição de renda e trabalho, nas condições de moradia", destaca a pesquisadora da Iyaleta e epidemiologista, Emanuelle Góes.

O estudo também revela que há um padrão étnico-racial nos casos de dengue e zika virus, em que mais de 60% são de mulheres negras e homens negros, apresentando mais que o triplo da proporção de casos registrados se comparados às mulheres brancas e homens brancos.

A população negra vive em piores condições de moradia e saneamento básico e consequentemente é mais afetada pelas doenças causadas por vírus transmitidos por mosquitos. Esta situação é o resultado das desigualdades étnico-raciais e de gênero e da urbanização desigual.

Em relação a urbanização desigual, o estudo chama a atenção para a densidade populacional no distrito de Porto Velho e as áreas de risco passível de ser atingida por fenômenos ou processos naturais e/ou induzidos que causem efeito adverso. As pessoas que habitam essas áreas estão sujeitas a danos à integridade física, perdas materiais e patrimoniais.

Na área urbanizada no Distrito de Porto Velho de aproximadamente 96,42 km² (0,28% do território municipal) a densidade populacional era de 4.010 hab./km² (altamente denso), nessa o serviço de esgotamento sanitário adequado alcançava apenas 42,80% da população e as vias públicas urbanizadas alcançava apenas 21,70% do perímetro urbano.


*Colaboração Juliana Dias, coordenadora de comunicação do Iyaleta - Pesquisa, Ciências e Humanidades