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Mariana Belmont

OPINIÃO

Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.

Esperávamos por Marina Silva no Ministério do Meio Ambiente por uma década

Marina Silva em entrevista à GloboNews em 29 de dezembro de 2022 - Reprodução/GloboNews
Marina Silva em entrevista à GloboNews em 29 de dezembro de 2022 Imagem: Reprodução/GloboNews

Mariana Belmont

Colunista do UOL

30/12/2022 12h47

Escrevo esse texto no dia 29 de dezembro de 2022, no aeroporto de Congonhas, enquanto assisto Lula anunciando Marina Silva como Ministra do Meio Ambiente e das Mudanças Climáticas.

Estou a caminho de Brasília, será minha terceira posse.

No dia 11 de março estive ao lado de lideranças do movimento negro brasileiro acompanhando a posse do presidente chileno Gabriel Boric, em frente ao Palácio de La Moneda e ao lado da estátua de Salvador Allende, ex-presidente do Chile, que em 1973, foi morto pelo golpe comandando pelo general Augusto Pinochet, que estabeleceu um regime militar durante 17 anos no Chile.

Depois de anos de neoliberalismo, o Chile elegeu o presidente mais jovem da América Latina, com 36 anos.

Também participamos da posse do presidente Gustavo Petro e da vice-presidenta Francia Marquez, na Colômbia.

Com as ruas todas lotadas, não havia uma pessoa sem sorriso no rosto ou lágrimas nos olhos. E, olha, eu gosto demais da poesia das coisas, mas ver de perto a defesa pela vida em sua forma plena e em estado de paz é realmente emocionante. É a primeira vez que a Colômbia elege um governo de esquerda.

Os dois novos governos, Chile e Colômbia, trazem como princípio e centralidade o debate ambiental, conversas sérias sobre preservar água, florestas e principalmente as populações mais afetadas com os desmontes de políticas ambientais que precisam existir para preservar vidas de pessoas e territórios.

E agora sigo para um novo velho, a terceira posse de Luiz Inácio Lula da Silva. Nunca estive em uma posse presidencial no Brasil.

Depois de 6 anos de abandono das instituições, um golpe contra a presidenta Dilma Rousseff e depois a chegada da política de genocídio de Jair Bolsonaro, chegamos com um governo que já esteve por aqui, mas com desafio de reestabelecer o mínimo de dignidade e de futuro para a população brasileira. Desafio de horizonte, de novas lideranças, mesmo com resistência sobre isso.

Lula, de Belo Monte, mas que durante toda campanha e depois com sua presença na COP27, no Egito, deixou fortemente marcado que vai acabar com o garimpo, titular territórios quilombolas, demarcar terras indígenas e devolver a dignidade no debate ambiental internacional que o Brasil já teve.

Mesmo assim demorou mais do que deveria para anunciar sua Ministra do Meio Ambiente e das Mudanças Climáticas, que diga-se de passagem foi uma das responsáveis por sua vitória.

2022 não acabou e a situação intensa de chuvas no nordeste e sudeste do Brasil é de emergência climática. A mudança do clima é uma realidade e os impactos estão sendo sentidos nas cidades. A negação sobre o que as mudanças causam resulta na perda de vidas, saúde, cotidiano, perdas de histórias, no desmatamento da Amazônia, Mata Atlântica e outros biomas e tem impacto direto nas populações urbanas.

A situação é grave e urgente, janeiro chega com mais chuvas e preocupação com as vidas que podem ser perdidas, como perdemos ao longo do ano em várias cidades brasileiras. Ter compromisso com a pauta climática é urgente e prioritário nos próximos meses, nas próximas semanas. É conversa para hoje.

"É o povo preto que vive nas periferias que são os primeiros a serem atacados, assolados pelas enchentes, os deslizamentos, que vivem a falta de saneamento básico e de moradia digna; Portanto, pensar no conceito de justiça climática é associar esse conceito ao combate ao racismo ambiental", lembrou Marina Silva em conversa com o movimento negro durante a COP27.

É urgente, afinal depois de anos de desmonte tudo é urgente, reforçar a narrativa da proteção das florestas e das cidades, respeitando as pessoas e o meio ambiente, caminhando juntas na construção de um país que volte a ser referência. Acabando com as narrativas negacionistas, com os absurdos que a extrema-direita escreve nas redes sociais, com a negação do óbvio e com a representação do que há de mais perverso e anti-ciência neste país, essa gente precisa ser colocada no seu devido lugar de vergonha na história.

"Estamos vivendo num mundo onde somos obrigados a mergulhar profundamente na terra para sermos capazes de recriar mundos possíveis. Acontece que, nas narrativas de mundo onde só o humano age, essa centralidade silencia todas as outras presenças", trecho do novo livro do nosso mestre Ailton Krenak, "Futuro Ancestral", lançado pela editora Companhia das Letras.

Escrevo o final da última coluna do ano aqui do Cerrado, quase final de quatro anos que pareceu um século inteiro de governo da destruição de Jair. Daqui a pouco já é 2023. Ufa!

Com Marina Silva que volta a assumir o ministério do meio ambiente depois de 14 anos de sua saída conturbada. O cenário é totalmente diferente, depois do desmonte da política ambiental promovido pelo governo Jair Bolsonaro, pelas mãos do então ministro da boiada Ricardo Salles.

Obrigada, Marina Silva. Por topar, por não recuar da responsabilidade, por ser íntegra, inteira, consciente dos desafios que teremos nos próximos anos, por seguir firme nas convicções e na defesa do que é importante. Por inspirar, por cuidar e por ser de verdade. Minha admiração por você sempre foi enorme, vai continuar assim, não é sobre defesa é sobre justiça e verdade.

Que seja um ministério dos movimentos, com os movimentos negros, indígenas e periféricos, estávamos te esperando, Marina. Te celebramos e celebramos sua chegada, que com certeza trará diálogo e avanços pela vida das pessoas.

Estaremos à disposição para apoiar e construir juntas. E amanhã vai ser outro dia, pode confiar.