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Mariana Belmont

OPINIÃO

Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.

Negros estão em 'zona de sacrifício' e COP será essencial para esse debate

Justiça climática foi uma das pautas centrais da COP26 - Felipe Werneck/Observatório do Clima
Justiça climática foi uma das pautas centrais da COP26 Imagem: Felipe Werneck/Observatório do Clima

Mariana Belmont

Colunista do UOL

04/11/2022 06h00

Embarco para a minha primeira Conferência das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas. Este ano, a COP27 será realizada de 6 a 18 de novembro de 2022, em Sharm El Sheikh, Egito, um país com clima extremo e desertificação e em África.

No último dia 25/10, a Relatora Especial da ONU, Tendayi Achiume, incluiu no Relatório sobre Mudanças Climáticas e Justiça Racial a contribuição feita pela Coalizão Negra Por Direitos sobre a situação de racismo ambiental enfrentada no Brasil e nos países do Sul Global. O documento confirma que a crise ambiental global é simultaneamente uma crise de justiça racial.

A crise climática global é simultaneamente uma crise de justiça racial, e repetir isso de forma constante é fundamental. Lembrar que falar sobre as desigualdades sociais (que o racismo ambiental impõe para as pessoas negras no mundo), em especial no sul global, é importante para todos os temas que permeiam o debate climático. Como mostram inúmeros estudos, os efeitos devastadores da crise climática são desproporcionalmente suportados por populações negras - aqueles que enfrentam discriminação, exclusão e condições de desigualdade sistêmica por causa de sua cor e território.

A relatora aponta que são os moradores das áreas mais atingidas pela poluição, perda de biodiversidade e mudanças climáticas. "Esses grupos estão desproporcionalmente concentrados em "zonas de sacrifício' globais - regiões que se tornaram perigosas e até inabitáveis devido à degradação ambiental. Enquanto as zonas de sacrifício estão concentradas nos territórios anteriormente colonizados do Sul Global, o Norte Global é em grande parte culpado por essas condições".

As "zonas de sacrifício", conforme ilustradas no relatório, são descritas com mais precisão como "zonas de sacrifício racial". As zonas de sacrifício racial incluem as terras ancestrais dos povos indígenas, territórios negros e periféricos e territórios ocupados enfrentando seca e devastação ambiental.

Na Amazônia e em outros lugares da América do Sul, os defensores dos direitos humanos ambientais são frequentemente perseguidos por protestar contra projetos industriais que destroem seus territórios.

O movimento negro brasileiro participará de mais uma COP, em África. Há um desafio de ocupar cada vez mais esses espaços majoritariamente brancos e elitizados, com portas fechadas. Ocupar as mesas de negociações.

Fundamental priorizar reparações por danos ambientais e climáticos históricos e por danos contemporâneos enraizados em injustiças históricas. As reparações exigem o enfrentamento da injustiça climática histórica e a erradicação do racismo sistêmico contemporâneo, que é um legado da injustiça histórica no contexto da crise climática global. As reparações, que envolvem estruturas econômicas, políticas e jurídicas internacionais equitativas são uma pré-condição para reorientar a ordem global para longe da crise climática. As propostas de caminhos para as reparações estão crescendo, e o desenvolvimento pede colaboração e parceria global, nacional e local com movimentos negros, indígenas e periféricos.

Chegamos na COP27 com um outro governo eleito, com uma expectativa de uma nova construção do debate climático com as pessoas, depois de quatro anos devastadores para as pessoas e para a natureza, chegamos ao Egito com movimentos indígenas, negros, com o presidente Lula, com Marina Silva e Sônia Guajajara, com urgência de planos de combate as desigualdade social, é urgência.

Institucionalizar a participação significativa e a tomada de decisões com movimentos negros, mulheres, indígenas e periféricos. A centralidade é natureza e pessoas. Que com a COP27, que nos sinaliza que será histórica, venha o retorno da participação social e a força do combate às desigualdades.