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Mara Gama

REPORTAGEM

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Rio Sahy faz ecobarreira para educação ambiental e pesquisa

Equipe do ICC prepara a ecobarreira a ser instalada no rio Sahy - ICC
Equipe do ICC prepara a ecobarreira a ser instalada no rio Sahy Imagem: ICC

Colunista do UOL

09/06/2022 06h00

O que é que vai dar no mar? Para responder a essa pergunta, separar e contabilizar os achados, exibir os resultados para moradores e comemorar o Dia Mundial dos Oceanos vai ser inaugurada nesta quinta (9), uma barreira de 15 metros de extensão no rio Sahy, litoral norte de São Paulo.

O rio Sahy fica na Área de Proteção Ambiental Baleia Sahy, em São Sebastião, e é o principal da bacia hidrográfica, que tem também o rio Negro. Estudos para a aplicação do projeto vêm sendo feitos há mais de dois anos pelo Instituto Conservação Costeira, ICC, uma organização que atua na conservação das áreas de Mata Atlântica e da biodiversidade e que foi responsável também por todo o processo de licenciamento para a instalação.

Daqui até o final de 2022, prazo inicial previsto para a duração da experiência, os resíduos retidos serão analisados em um levantamento gravimétrico -- que indica as porcentagens de cada tipo de lixo contidas nas amostras. O acesso à ecobarreira fica num terreno administrado pela Transpetro, que controla os dutos de óleo da Petrobras, e a visitação será permitida com monitores.

Local da ecobarreira no rio Sahy, São Sebastião - ICC - ICC
Local da ecobarreira no rio Sahy, São Sebastião (SP)
Imagem: ICC


A operação da ecobarreira vai envolver vários grupos da comunidade. Toda vez que atingir metade da capacidade de contenção, seus resíduos serão retirados pela associação que reúne barqueiros e pescadores, a Prosan. Recicláveis irão para oficinas de educação ambiental promovidas pelo Instituto Verdescola e para a cooperativa CooperSuss, que atua em São Sebastião. Os rejeitos serão coletados pela empresa de limpeza pública da região.

"Será uma ferramenta de educação ambiental importante para as crianças e para os moradores. A comunidade poderá ver o que está sendo retido ali, que acabou de descer das casas e que estaria indo para o mar", diz Angelica Bustamante, gestora ambiental e diretora do ICC, onde atua há 4 anos.

Além dos previsíveis resíduos plásticos que flutuam no rio, há vazamentos e parte do esgoto vai diretamente para o Sahy, um dos problemas graves da região. "Uma parte das casas não é atendida pelo saneamento", diz Angélica. O ICC já participou de diversas ações para resolver o problema, como a operação caça-esgoto, que identificou terrenos que tinham acesso a um ponto da rede, mas não tinham conexão instalada. Os idealizadores do projeto acreditam que a ecobarreira do Sahy tem grande potencial de replicabilidade no município de São Sebastião.

O Brasil já teve uma experiência de grande porte com ecobarreiras em rios, iniciado em 2009 pelo Inea (Instituto Nacional de Ambiente), ligado ao governo do Rio de Janeiro. Mas seus resultados não são bem divulgados e a operação restante hoje sofre com a crise generalizada do Estado.
No período de maior abrangência, funcionaram 17 barreiras, filtrando o material proveniente de metade dos 35 rios que desaguam na Baía de Guanabara. O serviço ambiental de retenção de resíduos foi bastante importante, como relata a engenheira Maria Fernanda Bastos, autora do estudo que resultou na tese de mestrado "O uso de ecobarreiras para a captura do lixo flutuante". Volto ao tema nas próximas semanas.

Preparação da ecobarreira com galões de 20 litros e rede de contenção - ICC - ICC
Preparação da ecobarreira com galões de 20 litros e rede de contenção
Imagem: ICC

Inspiração

Uma das inspirações da barreira do Sahy foi o trabalho de Diego Saldanha na cidade de Colombo, no Paraná. A proposta Saldanha é limpar o rio Atuba. O rio nasce em Colombo, corre para Curitiba e se junta com o rio Iguaçu. A barreira de 15 metros está a 800 km das Cataratas do Iguaçu. Implantada em 2016, já tirou mais de 10 toneladas de lixo do rio. "Tiro de 150 a 200 kg por mês", conta Saldanha.

"Sei que várias cidades já replicaram o projeto e esse é um dos objetivos", diz. "Fiz para salvar um rio da minha infância, documentei e fui modificando a estrutura nesses anos. Virou meu projeto de vida", conta. Apesar da divulgação do trabalho e da repercussão, ele nunca teve ajuda de nenhum órgão público. "Só muito obrigada e tapinha nas costas", relata.

Diego vende frutas em Curitiba e usa parte dos recursos para manter a barreira. "Agora que o projeto está mais conhecido, faço palestras também e isso ajuda a pagar os gastos", diz Saldanha.

A primeira estrutura era feita com galões de água e redes. Atualmente, ela foi montada com tubos e conexões de PVC e um gradil de ferro "para reter lixos menores", diz. Com apoio da ONG Razões para Acreditar, ele conseguiu R$ 30 mil para melhorias: um guincho elétrico, uma passarela sobre o rio e a montagem de um museu do lixo "para onde vão as peças inusitadas", conta.

O processo de separação do material retido é feito manualmente por ele e pela mãe. "Deixo juntar três big bags e levo para cooperativa o que for de reciclar". A mãe de Diego reforma bonecas que tira do rio e doa para crianças que visitam o museu. "Eu precisava fazer alguma coisa para salvar o rio", finaliza.