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Eduardo Carvalho

OPINIÃO

Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.

Aquecimento global é problema do agora para quem mora em favela

Enchente em favela - Robson Ventura/Folhapress
Enchente em favela Imagem: Robson Ventura/Folhapress

20/07/2022 06h00

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''O problema do aquecimento global não é coisa do futuro, é coisa do agora para quem mora em favelas, periferias, por conta do racismo ambiental'', cantou a pedra o mano Raull Santiago.

Foi na Glocal Experience, um evento que reuniu pensadores, ativistas, empresários, a sociedade como um todo e o Estado para discutir um novo futuro. Na verdade, a construção de novos horizontes, num agora ainda mais urgente.

Pudera. Se não há discussão, não há saída, tampouco quando não se pauta a inclusão de atores primordiais para dizer quais são os problemas, apontando caminhos para soluções viáveis e possíveis pra geral.

Pensar sustentabilidade à distância não pode ser moda, ainda mais com realidades que escancaram, a torto e a direito, questões de acesso. Se não feitas com responsabilidade, como refletir sobre as ideias que podem adiar o fim do mundo?

O objetivo dos debates gerados no percurso — que tem extensão e continuidade para os próximos meses - é realizar uma agenda que mobilize e engaje, sendo assim, ação conjunta de tarefas em que cada ente cumpre seu papel, cada par, sua função. E que haja cobrança, haja compromisso.

É a atitude de elaboração de políticas públicas, que legitimam todo o processo organizado pela sociedade, sempre calcado na urgência e na falta. Infelizmente.

''Um projeto como esse não tem a capacidade de transformar de imediato, mas passa a criar um discernimento sobre aquilo que elas são obrigadas a tolerar e o que elas não são. Se a gente criar pessoas que minimamente compreendem, existe uma outra parte sobre aquilo em que elas vão se indignar em não ter, por exemplo, segurança, água, saneamento. Elas vão se incomodar porque não tem. E no dia que elas se incomodam sobre aquilo que não tem, elas começam a reivindicar de forma organizada'', pontua o diretor geral do evento, Rodrigo Cordeiro.

Dentro de situações díspares, olhares verdadeiros sobre as mudanças. ''Todo esse contexto de sustentabilidade ainda é dentro de uma realidade de desigualdade. A gente consegue garantir o acesso à água, mas ela não tem banheiro. O conjunto dos ODS (Objetivos de Desenvolvimento Sustentável, criado pela ONU) é importante, mas é preciso pautar a desigualdade'', vem Raull mais uma vez iluminar. Do Alemão para o mundo, é uma das pontes que liga discussões urgentes sobre aquilo que pode até passar na TV, mas poucos vão se importar.

Raull Santiago - Wendy Andrade / Reprodução Instagram - Wendy Andrade / Reprodução Instagram
O comunicador Raull Santiago discursou na Glocal Experience, que aconteceu no Rio de Janeiro
Imagem: Wendy Andrade / Reprodução Instagram

Quem validou o discurso e ainda dá caminhos simples na roda é Beatriz Mattiuzzo, cofundadora do Projeto Marulho. "Não é para pensar como vou resolver o aquecimento global apenas. É enxergar um pequeno, se unir com quem está dialogando em outros problemas e mudar".

A transformação começa no pequeno, de pouco, e pode ser facilitada se começar dentro de casa. ''Se cada uma das pessoas que veio transferir o mínimo de uma lição para outras quatro, você começa a falar de mudanças realmente significativas. É um impacto que nunca mais tira dela, você muda o jeito dela entender o assunto, de viver. Não muda o contexto, mas muda a forma'' indica Cordeiro.

E assim, mesmo as crianças que saíram de Manguinhos na terça passada (12) para o evento e voltaram com a cena de morte no território, podem pelo menos enxergar o que é possível (e que o Estado deveria se comprometer em dar, apenas e somente por direito, não por qualquer outra coisa. Até porque, para pensar em sustentabilidade, é preciso estar, primeiramente, vivo), além de moradores da Cidade de Deus, Rocinha, Nova Iguaçu e até quilombolas da região dos lagos.

Porque é trazendo quem está na ponta que as coisas mudam, entendendo que sustentabilidade não é sobre a ponta, é sobre meio.