Ela teve complicações em cirurgia de hérnia de disco e ficou tetraplégica

Com fortes dores no pescoço e no braço, a bancária Raquel Zendron, 36, teve sua rotina completamente mudada em 2019. O incômodo era tão grande que ela ficou afastado do trabalho por 60 dias. Depois de inúmeras consultas médicas, descobriu que estava com hérnia de disco.

Mesmo querendo seguir com o tratamento convencional, com fisioterapia e remédios, os médicos disseram que seu caso era cirúrgico. Em 2020, ela foi submetida ao procedimento e teve complicações que a deixaram tetraplégica. Desde que soube que a lesão na medula era permanente e que não recuperaria os movimentos, tentou encarar a vida de forma leve e prazerosa.

Hoje, ela tem ajuda de uma cuidadora, da mãe, do marido e até já pulou de paraquedas de forma adaptada e com permissão de seu médico. Abaixo, ela conta sua história:

"Comecei a sentir muitas dores na cervical. Isso me impossibilitou de trabalhar e fiquei 60 dias afastada. A dor irradiava para os meus braços e comecei a ir a vários médicos. Era outubro de 2019.

Trabalhava como bancária e era um desconforto muito grande que ia para o pescoço e depois irradiava para o braço esquerdo.

Quando procurei os médicos, foi constatado que tinha uma hérnia de disco e muitos dos profissionais diziam que meu caso era cirúrgico. Eles disseram que vários fatores poderiam originar o problema.

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Imagem: Arquivo pessoal

Como falaram que, no meu caso, a cirurgia ia ser minimamente invasiva e endoscópica, optei pelo procedimento para melhorar os sintomas.

Em 2020, decidi fazer a cirurgia, fui dirigindo para o hospital e fiz um dia antes do meu aniversário. Fui para o centro cirúrgico deitada na maca e até cheguei a falar para o atendente que podia ir andando, o que não foi permitido. Estava agoniada de ser empurrada em uma maca.

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Sonhos frustrados?

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Imagem: Arquivo pessoal

Passei pela cirurgia, mas, logo que saí, fui para a UTI e fiquei 14 dias internada. Tinha um edema [inchaço] na medula, achava que ia passar e recuperaria meus movimentos. O edema subiu e comecei a ter dificuldades para respirar.

Após esse período, fui para o quarto e já estava há um mês com a lesão. Depois, fui para um hospital de Goiânia tentar saber o que tinha acontecido e fazer uma reabilitação.

Estava com uma lesão medular, não andava e não fazia nada. Fui informada que tive uma lesão na altura da vértebra C5. É uma lesão muito alta, que me causou a tetraplegia.

Ao chegar lá, um médico fez a avaliação e informou que era uma lesão permanente. Os médicos que me operaram [da hérnia] disseram que não sabiam o que tinha ocorrido.

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Foi muito difícil receber essa notícia. Pensei nos meus sonhos, no meu sonho de ser mãe, estudar e me casar. Todos os meus sonhos tinham sido frustrados.

Lembro que mesmo antes de saber disso, na UTI, cheguei até a dizer para o meu marido que ele não era obrigado a ficar comigo, e ele disse para eu nunca mais falar aquilo. Nós estávamos noivos ainda. O pai dele ficou paraplégico em 2014, então ele sabia mais ou menos como lidar com essa situação. Nos casamos.

Ele sempre diz que a gente vai realizar todos nossos sonhos, não é romantizado, mas é questão de fazer do limão uma limonada. E a gente vai se adaptando e vivemos bem. Ele me dá banho, cuida de mim, é um companheirão.

"Parte mais difícil foi perder independência"

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Imagem: Arquivo pessoal

Por causa da tetraplegia, não tenho controle do intestino, da bexiga e preciso passar sonda de quatro em quatro horas para poder urinar. Preciso de estímulo para fazer cocô e também da ajuda de alguém para me vestir e dar banho.

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Minha voz e minha respiração ficaram um pouco diferentes. Tenho espasmos com frequência e não tenho controle da minha temperatura corporal.

Se fica muito calor, não sinto, tenho oscilação de pressão, e como a medula é responsável pelo controle da pressão, várias vezes posso desmaiar.

Hoje, mexo as mãos porque fiz uma cirurgia para conseguir abri-las e fechá-las, mas não consigo segurar nada. Me dá benefício estético apenas.

A parte mais difícil da minha lesão foi perder minha independência.

Tudo alguém tem que fazer por mim, fazer meu prato de comida, me vestir. Mas me sinto privilegiada por ter meu marido e minha cuidadora. Não me sinto no direito de reclamar de nada.

Sempre busquei meditar, pois já tive quase uma crise de ansiedade por conta disso. Passei por esse momento mentalmente difícil e claro que fiquei muito mal. Mas hoje tento encarar e vejo o lado bom.

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Não vai adiantar chorar e ficar revoltada. Então, tento viver da melhor forma. Acredito que a gente pode tentar ser feliz.

"Pensei que nunca mais ia poder saltar de paraquedas"

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Imagem: Arquivo pessoal

Já era paraquedista antes de ter a lesão. Tinha noção e fiz 65 saltos sozinha. Saltava com o meu marido, que na época era meu noivo. Por causa da tetraplegia, pensei que nunca mais ia poder saltar, mas me adaptei.

Meu primeiro salto adaptado aconteceu dois anos após a lesão. Foi um avião inteiro comemorando. Fizemos uma formação no céu e a sensação de saltar era de muita liberdade. Estava tão feliz.

Nós fizemos uma adaptação e, como não consigo segurar minhas pernas, o instrutor colocou uma cinta e fez numa posição para a gente conseguir pousar. Fui liberada pelo médico e não tive problema nenhum. Quero continuar fazendo, pois isso me faz bem.

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Imagem: Arquivo pessoal

Esse foi outro desejo que realizei após ficar assim e ainda penso em ser mãe. Mesmo sendo tetraplégica, não há contraindicação em ter uma gestação.

Acho muito que a medicina irá evoluir. Acredito muito na robótica, pois é algo mais palpável e acho que isso pode me fazer andar no futuro.

Também penso que temos que superar as nossas adversidades. Creio que tudo está dentro da nossa cabeça, mas que todo mundo tem problemas e limitações, mas não posso deixar essas limitações influenciarem e preciso focar nas coisas boas."

Cirurgia de hérnia de disco

Nossa coluna é feita de vértebras e, entre cada uma delas, há um amortecedor de cartilagem, como se fosse uma almofada: são os discos vertebrais.

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A divisão da coluna ocorre em três partes:

  • cervical, na região do pescoço;
  • torácica, com tronco e costelas;
  • e lombar, que é abaixo das costelas até a região da bacia.

A hérnia de disco ocorre quando o "anel" desse disco rompe e o conteúdo de cartilagem vaza para dentro do canal, apertando a medula ou os nervos.

Sua causa é considerada multifatorial pelos médicos, podendo ser genética, por tabagismo, esforço repetitivo, e também associado a má postura. O sedentarismo aumenta a sobrecarga do disco.

Geralmente, 85% das hérnias de disco melhoram sem cirurgia, com tratamento conservador, que inclui fisioterapia, medicação para dor e repouso.

A cirurgia só é indicada em casos que há falha no tratamento conservador e quando há déficits neurológicos, como perda de força na perna, alteração do controle da urina e quando a dor é intratável.

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A taxa de sucesso nesses procedimentos cirúrgicos é mais alta do que as complicações pós-operatórias. Segundo os especialistas, chega a 95%.

Em alguns casos, podem ocorrer intercorrências. As mais comuns estão relacionadas a respostas imunológicas do paciente, reação à anestesia, hipotensão (quando a pressão arterial cai muito) causando a falta de sangue para a medula, provocando uma isquemia, processo semelhante a um AVC nesta parte do corpo.

O procedimento cirúrgico tem o objetivo de retirar a cartilagem que vazou e descomprimir o nervo. Pode ser feita de maneira aberta (com corte) ou por vídeo (endoscópica), retirando-se o fragmento.

Muitas vezes, a própria hérnia pode provocar lesões neurológicas e problemas mais graves nos pacientes.

Uma lesão cervical pode levar o paciente a tetraplegia, que pode ser parcial ou completa. Nesta última, a pessoa não mexe e não sente nada nos membros.

Já na parcial, o indivíduo pode ainda ter um pouco de sensibilidade e conseguir movimentar a mão até a boca, por exemplo.

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Quando o paciente fica tetraplégico, é necessário um acompanhamento multidisciplinar com fisioterapeutas, médicos, terapeutas ocupacionais, assistente social e psicólogos.

Fonte: Antonio Krieger, ortopedista de coluna do Hospital São Marcelino Champagnat, em Curitiba.

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