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Equilíbrio

Cuidar da mente para uma vida mais harmônica


'É mais forte que eu': por que temos crise de riso justo quando não pode?

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Imagem: iStock

Marcelo Testoni

Colaboração para VivaBem

07/10/2022 04h00

Seja em velório, ao ver alguém cair na rua, durante uma apresentação no emprego, não importa: basta não ser apropriado que Ingrid Soares, 35, de São Paulo (SP), cai na risada. "É mais forte do que eu, tento me segurar, coloco a mão na boca, mas aí a gargalhada sai como um ronco pelo nariz, chamando a atenção de todo mundo", conta.

Por conta desse tipo de reação constrangedora, ela conta que evita ao máximo frequentar ambientes cheios e que exijam silêncio e muita formalidade. Relembra que até já foi expulsa —ou melhor, "convidada a se retirar"— de uma palestra na época em que cursava faculdade. "Tive uma crise de riso na primeira fila enquanto o sujeito discursava", diz.

Se Ingrid estiver na companhia de suas amigas, a situação fica ainda pior e se torna algo contagiante. Por isso, elas combinam antes de não ficarem o tempo todo juntas se estiverem com outras pessoas conhecidas, para evitar falatórios e olhares atravessados. Certa vez, quase geraram uma briga em uma cerimônia de casamento por não se conterem ao ver o penteado de uma convidada.

Dar risada ou gargalhar são expressões de reação involuntária a determinados estímulos externos ou internos, explica Júlio Barbosa, médico neurocirurgião pela UFBA (Universidade Federal da Bahia). Pode surgir quando presenciamos algo que consideramos cômico ou a partir de pensamentos bem-humorados, associados muitas vezes ao prazer, mas também a estados emocionais negativos como constrangimento, ansiedade, medo e estresse.

No processo, o cérebro, inconscientemente, utiliza a gargalhada como uma estratégia para nos introduzir em um grupo social e esclarecer nossas intenções, sinalizando receptividade, não ameaça, e propiciando um contexto emocional positivo para interações. Porém, se a risada for uma reação de defesa, isso pode dar errado.

"Uma crise de riso intensa pode ser decorrente da ativação de diversas áreas cerebrais muito próximas. As respostas se misturam e não se consegue ter controle da respiração, do lacrimejamento e até do vômito", acrescenta o médico.

Pode ser doença?

Eventualmente, afirma Barbosa, a risada descontrolada pode ter relação com doenças que causam um curto-circuito cerebral. No caso de Ingrid, por exemplo, ela conta que teve uma tia-avó que sofria de epilepsia e tinha rompantes de gargalhada sem nenhum motivo.

Pessoas com transtornos ou desregulação de neurotransmissores, que riem e choram ao mesmo tempo, podem ter desequilíbrios emocionais, sentirem-se alegres e depois tristes, ou vice-versa. O uso de substâncias como maconha, cocaína e álcool também pode causar isso.

Ingrid e as amigas - Arquivo pessoal - Arquivo pessoal
Ingrid, ao centro, e as amigas
Imagem: Arquivo pessoal

"Mas, no meu caso, sempre fui de dar risada e, às vezes, essa vontade surge quando sinto vergonha por alguém. É como se eu me visse na pele do outro e minhas amigas caem na risada junto por me verem desconcertada", conta Ingrid.

Nesse caso, é o que Lucy Carvalhar, psicóloga especializada pela FMU (Faculdades Metropolitanas Unidas), de São Paulo, chama de mecanismo de negação. "Nesse contexto, rir é uma espécie de fuga emocional. Com muita angústia, nervosismo, o cérebro nega situações, como uma forma de evitar um conflito interno e se acalmar", afirma.

É um tipo de reação que não costuma ser visto com bons olhos, já que é uma postura contraditória, embora espontânea. A surpresa de não saber como agir pode, inclusive, influenciar os outros ao redor.

Questione-se ou saia de cena

Para evitar que uma descarga de adrenalina, hormônio cuja função é manter o corpo em alerta para fortes emoções, lhe excite e faça rir quando não deve, a melhor recomendação é desfocar e refletir sobre essa reação de forma racional.

"É necessário compreender os gatilhos por trás, quais assuntos abordados levam a esse comportamento e o que ele diz intimamente", diz Yuri Busin, psicólogo e doutor em neurociência do comportamento pela PUC-RS (Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul).

"O próximo passo é se planejar, tentar manter o autocontrole e, se não der certo, sair de cena e voltar depois. Para evitar incômodos, vale se desculpar e explicar que o riso é uma reação que você tem quando é pego desprevenido ou está muito tenso", afirma.

Ingrid diz que não faz terapia, mas uma colega de trabalho faz e tem conseguido controlar não o riso, mas a choradeira, em determinados momentos. Seja qual for a emoção, com suporte profissional, é possível desenvolver capacidades cognitivas para prever respostas, reeducar o cérebro e modificar pensamentos e sentimentos, o que pode envolver ainda a prática de meditação e ioga.

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