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Longevidade

Práticas e atitudes para uma vida longa e saudável


Como resolver situações de violência entre casais de idosos?

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Imagem: iStock

Marcelo Testoni

Colaboração para VivaBem

19/02/2021 04h00

Segundo dados de 2019 apresentados pela Fiocruz (Fundação Oswaldo Cruz) durante uma palestra intitulada "Violências Contra a Pessoa Idosa e Estratégias para Reduzi-las", mais de 60% dos casos de violência contra idosos no mundo ocorrem dentro de seus próprios lares.

"Dois terços dos agressores são filhos, que agridem mais que filhas, noras ou genros, e cônjuges, nesta ordem. Os idosos quase não denunciam, por medo e para protegerem os familiares", informou à época Cecília Minayo, pesquisadora emérita da Fiocruz e coordenadora cientifica do Claves (Centro Latino-Americano de Estudos de Violência e Saúde Jorge Careli).

Ainda de acordo com Minayo, "mulheres são mais vulneráveis em casa" e, de ambos os sexos, correm mais riscos os idosos "dependentes, sobretudo os que sofrem alterações de sono, incontinência, dificuldades de locomoção e necessitam de cuidados constantes".

Mas violência não tem a ver apenas com agressão. "Existe a psicológica [bullying, humilhações, constrangimento moral], além de abandono, omissão, maus-tratos, abusos sexual, econômico, institucional e patrimonial", lista Maria Elizabeth Bueno Vasconcellos, psicóloga e pedagoga especializada em gerontologia pela SBGG (Sociedade Brasileira de Geriatria e Gerontologia).

Família deve acompanhar de perto

Quando a violência é praticada entre um casal de idosos, ou por um dos cônjuges, filhos ou familiares próximos precisam intervir, não é uma questão de opção.

"Mas não deve ser de forma agressiva, porque senão acaba 'justificando' a agressividade. A abordagem é muito mais de orientação e cuidado", esclarece Yuri Busin, psicólogo, doutor em neurociência e diretor do Casme (Centro de Atenção à Saúde Mental), em São Paulo (SP).

Das violências, a mais comum e mais ignorada é a psicológica, seguida pelo abandono e depois a física. Busin complementa que em se tratando de casais com 80, 90 anos, a cultura enraizada, muito antiga e aprendida com os pais e os de sua geração também influencia.

"O homem ou a mulher acha normal desvalorizar o outro. Então tudo é ruim, a pessoa é burra, não sabe fazer nada. Essas críticas, essa falta de valorização e de cuidados acabam se tornando um hábito. Quem sofre também acha isso normal, algo que não precisa ser modificado", diz.

Quando envolve saúde precisa tratar

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Para que o casal consiga resolver seus conflitos, especialistas precisam ser consultados, sendo os mais aptos para avaliar e fazer um acompanhamento o geriatra e o psicólogo/psiquiatra. Esses profissionais podem diagnosticar, por exemplo, se um comportamento agressivo, ainda mais sem motivo e observado pela comunicação verbal (palavras duras e ofensivas) ou atitudes físicas (pontapés, tapas) resultam de algum tipo de demência ou transtorno mental.

No início, ou evolução rápida de um quadro de Alzheimer, por exemplo, psicose, agitação e agressividade podem ser observados.

Um idoso incapacitado também pode se irritar e perder o controle em situações de dor, fome, sede, temperaturas extremas, estímulos ambientais excessivos. Nessas condições, o ideal é que o casal não fique sozinho, sem supervisão. Mas lembre-se: cuidador não media conflitos, seu papel é amparar e cuidar de idosos dependentes.

Violência já é bem diferente

Não havendo constatação de doença, que se fosse confirmada poderia ser estabilizada com medicamentos e acompanhamento psicoterápico, a família e o cônjuge precisam tomar uma atitude.

Se forem discussões frequentes, o casal pode fazer terapia para se resolver e aprender sobre novos conceitos de relacionamentos. Pode ser difícil, mas é possível, garante Yuri Busin.

"Agora, se houver abuso, agressão, abandono, aí é crime e dependendo do estado do idoso violentador ele também vai precisar de apoio e acompanhamento de alguma instituição. Mas não pode ponderar, o pior é sempre a violência. Tem que haver a separação do casal. Se os dois exigem cuidados e se agridem, precisam estar distantes, separados e com um cuidador cada", explica Natan Chehter, geriatra da BP - A Beneficência Portuguesa de São Paulo.

Em casos urgentes, de risco à própria integridade e sem nenhum apoio da família, a vítima ou algum vizinho seu (principalmente sabendo de sua condição vulnerável) deve ter coragem e denunciar o agressor pelo Disque 100, serviço especializado em denúncias sobre violações dos direitos humanos. "O Disque 100 leva a mensagem de que o idoso está sofrendo", diz Minayo.

Como identificar problemas?

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A família tem que estar presente na vida do casal de idosos para perceber como eles estão. Se um cuida do outro é preciso conferir esses cuidados e deixar regras previamente combinadas, bem explicadas. Não adianta, por exemplo, o filho cobrar algo que não foi repassado para o pai ou a mãe ou que eles não compreendam o porquê de fazer, ou não façam.

"Essas situações não podem passar despercebidas, não pode haver conivência com violência. É preciso garantir primeiro a segurança para depois intervir na saúde", aponta Chehter.

Casos demenciais podem ser mais complicados. Além do doente, o cônjuge também requer ser acompanhado de perto. Ele pode estar estressado, sobrecarregado, deprimido por se ver obrigado a modificar seus projetos e sua rotina e culpar o outro.

Ainda negar a gravidade, o que é um fator para negligência e maus-tratos. O idoso dependente também pode descontar sua insatisfação no outro. A situação é pior quando o casal já não possuía uma boa relação.

"Quando há uma situação de abandono e falta de ajuda, você percebe que o idoso perdeu muito peso, está deprimido, não toma direito os remédios. Na violência física, há fraturas, machucados", diz Chehter.

"O estado da higiene e da aparência também conta muito. O idoso abandonado pode ter assaduras, unhas e cabelos não cuidados", acrescenta Vasconcellos.