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Equilíbrio

Cuidar da mente para uma vida mais harmônica


Suas coisas estão uma bagunça? Às vezes é porque dentro de você também está

Bagunça na vida e na mesa - iStock
Bagunça na vida e na mesa Imagem: iStock

Diego Garcia

Colaboração para o VivaBem

08/08/2020 04h00

Resumo da notícia

  • Nosso mundo externo é reflexo do mundo interno, então, se estamos desorganizados internamente é possível que o externo também esteja
  • Arrumar as bagunças do nosso ambiente não irá resolver nosso problema interno, mas pode nos ajudar a organizar melhor as ideias para isso
  • É importante lembrar que cada pessoa é única, assim como a sua bagunça. O sinal de alerta é quando essa desorganização difere do habitual

Você já ouviu a frase: "se você sente que sua vida está bagunçada, comece arrumando suas gavetas"? Apesar de estranho, saiba que faz sentido: ordenar o exterior é um exercício para conseguir se organizar mentalmente, que pode ser com metas, objetivos ou mesmo listas de tarefas mais claras e objetivas -e, preferencialmente, que sejam possíveis de serem completadas. Isso porque somos parte de um ecossistema físico, social e subjetivo, portanto, o ambiente e a forma como nos comportamos rotineiramente se reflete em nosso bem-estar subjetivo, assim como o oposto.

Tanto em nosso espaço interno (nossa mente), quanto em nosso espaço externo (o ambiente a nossa volta), projetamos nossas angústias, medos, frustrações e desejos. Em determinadas situações projetamos no ambiente externo aquilo que nos incomoda e nos agride, o que pode transparecer na ausência de mínima organização dos objetos, móveis, roupas, materiais etc., ou resumindo, uma bagunça.

Bagunça per si não é nenhum diagnóstico

Cada um de nós apresenta grau variável de dificuldade para nos adaptarmos às relações de trabalho, afetivas e sociais com maior ou menor intensidade em momentos específicos. Uma pessoa que está em luto pela perda de um familiar, por exemplo, pode ter dificuldade para organizar suas rotinas pessoais, de trabalho e domésticas, por um certo tempo, desorganizando seus ambientes.

Quando uma pessoa apresenta dificuldade intensa de adaptação ao trabalho ou às relações sociais, familiares e afetivas e causa prejuízo e sofrimento para si e para o outro, o ideal é procurar auxílio de um profissional da saúde mental. Por outro lado, cada um de nós se adapta ao ambiente externo de maneira única, portanto, alguns são aparentemente mais organizados, enquanto outros são mais desorganizados no dia a dia. Esses padrões comportamentais são comuns e não necessariamente refletem em problemas psicológicos.

Perceber que a vida está um caos e se dar conta que a sua casa, trabalho ou ambiente de estudo também está desorganizado é uma coisa. Agora simplesmente ter uma casa que não é tão organizada é diferente e bem sempre quer dizer que o interno tem algum problema. Uma casa arrumada facilita a vida, mas às vezes um ambiente organizado até demais pode ser encarado como sem vida, já que onde há vida, há bagunça. Então, depende do que a bagunça representa para cada um.

Existem casos, entretanto, que são o oposto: o excesso de organização externa se torna uma compulsão para esconder uma desordem interna. Por isso, o ideal é sempre o equilíbrio e o autoconhecimento, que nos permite sentir quando algo não está bem e precisa ser reparado, tanto no externo quando no interno.

Gaveta bagunçada e arrumada - iStock - iStock
Imagem: iStock

Como perceber nossa desarmonia?

Geralmente quando nossos ambientes externo e interno estão desorganizados além do que é habitual, as pessoas a nossa volta costumam nos dar pistas de que algo não vai bem. Por exemplo, seu chefe pode se queixar de que você se atrasa com frequência em compromissos da empresa ou que você não cumpre nenhum dos prazos combinados. Em outra situação, você precisa preparar uma mala para viagem e não encontra seu passaporte, não consegue organizar em tempo hábil as roupas, calçados e produtos de higiene pessoal que levará.

Alguns desses lapsos e desencontros são comuns e até sadios em nossas vidas, quem nunca confundiu a data ou horário de uma reunião, por exemplo? No entanto, quando são sistemáticos e compreendem diferentes esferas de nossas vidas (família, relacionamentos, trabalho, rotina pessoal) é sinal de que talvez precisemos parar para refletir e eventualmente buscar auxílio.

Organizando suas gavetas internas

Arrumar a bagunça externa dá um alívio, uma sensação de espaço nos conforta e a energia flui melhor. Mas, se internamente vivemos em estados de estresse, a vida vai sempre tender ao caos e logo a bagunça se instalará novamente. O medo, a insegurança e a comparação nos colocam em estados de ansiedade e assim, vivemos nos sentindo ameaçados o tempo todo, sempre reagindo, nos defendendo ou atacando.

Por isso, o ideal é buscar sempre estados interiores de alegria, paz interior, coragem, calma e gratidão que torna possível criarmos relacionamentos harmoniosos, resultados que realmente nos satisfazem e soluções eficazes. Separamos algumas dicas importantes para ajudar a organizar a nossa bagunça interior:

1. Pare de mentir
Observe o quanto você mente para os outros e para si mesmo. Só esse exercício já vai trazer uma grande mudança. Perceba a sua dificuldade de falar a verdade. A quem está querendo agradar? Quanto maior a mentira, maior o problema.

2. Pratique uma comunicação mais ponderada
Tente comunicar o que você pensa de uma forma mais respeitosa, e pensando como o outro vai receber. Agir sem violência em pensamento, palavras e também fisicamente. Tenha respeito pela sua vida, por seu corpo, seus pensamentos e com as outras pessoas.

3. Inclua práticas de meditação na rotina
Meditar nos ajuda na observação dos diálogos internos e a reconhecer o estado emocional em que vivemos a maior parte do tempo. Também auxilia a entrar em contato com os medos, mágoas, culpas e raivas, além de nos permitir ouvir o que elas têm para nos dizer e perdoar o outro e a si mesmo. Acolher, ressignificar e perdoar, tudo isso tem o mesmo efeito de arrumar as gavetas, jogar fora o que não serve mais, costurar o que está rasgado e dar novo uso a objetos e mobílias.

4. Buscar o autoconhecimento
Conhecer a si mesmo é um exercício que leva uma vida inteira, mas quanto mais nos aprofundamos na busca por quem realmente somos, mais luz jogamos em nossas sombras internas e aprendemos a lidar melhor com as situações que nos afligem e mudar o que não nos agrada. A psicoterapia é uma ferramenta fundamental nesse processo de autoconhecimento e imprescindível para manter organizadas as gavetas da alma.

Mesa bagunçada - iStock - iStock
Imagem: iStock

Ajudando o outro a se organizar

Nem sempre a pessoa que está passando por um problema repara a bagunça que se forma ao seu redor e isso muitas vezes chama a atenção de amigos e familiares, que podem ajudá-la de alguma forma. A primeira ajuda que podemos oferecer é acolher e escutar a pessoa a respeito da suposta "desorganização" constatada. É preciso verificar se ela compreende desta forma também, ou seja, dar possibilidade de que ela fale com liberdade sobre como tem vivido, o que tem sentido, quais dificuldades tem encontrado.

De forma muito delicada podemos oferecer ajuda para que ela se organize e algumas vezes perguntar se ela percebe que perde tempo refazendo ou procurando algo, devido a sua desorganização. Mas nunca devemos acusar ou brigar falando coisas do tipo: "você é relapso", "você é indisciplinado" ou "você é bagunçado", por exemplo. Sim, porque geralmente quanto mais próxima a pessoa é da gente, mais fácil é falarmos algo que possa deixá-la pior.

A ideia deve ser criar uma nova percepção do dia dessa pessoa e a ajudar a buscar novos modelos de organização em conjunto para estimular o comportamento. Vale lembrar que fazer pelo próximo não irá ensinar ele a fazer, mas sim o acomodar. Sempre pense em ajudar, estimular, participar, mas não em realizar pelo outro.

Fontes: Eduardo Name Risk, psicólogo, professor adjunto do DPsi (Departamento de Psicologia) da UFSCar (Universidade Federal de São Carlos); Yuri Busin, psicólogo, mestre e doutor em neurociência do comportamento pela Universidade Presbiteriana Mackenzie e diretor do CASME (Centro de Atenção à Saúde Mental - Equilíbrio); Helena Cunha Di Ciero, psicóloga formada e psicanalista, membro associado da SBPSP (Sociedade Brasileira de Psicanálise de São Paulo) e especialista em psicoterapia psicanalítica pela USP (Universidade de São Paulo); e Mariana Hein, instrutora de expressão, mudança de hábitos e meditação.