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Paola Machado

OPINIÃO

Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.

'Por que minha depressão não melhora?' Veja 12 pontos para prestar atenção

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Paola Machado e Pedro Rosa

Colunista do UOL

10/08/2022 04h00

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A depressão é classificada como um transtorno de humor, podendo ser expressada e exteriorizada com sentimentos de tristeza extrema, queda de humor e perda de prazer que interferem nas atividades cotidianas de uma pessoa.

A última pesquisa mais abrangente, da Vital Strategies e da Universidade Federal de Pelotas, mostrou que os que dizem ter sido diagnosticados com depressão subiram de 9,6% antes da pandemia para 13,5% em 2022.

*Fique atento entre as diferenças entre depressão e luto. Embora a depressão e o luto compartilhem algumas características, a depressão é diferente do luto sentido após a perda de um ente querido ou da tristeza sentida após um evento traumático da vida.

A depressão geralmente envolve pensamentos ruins sobre si ou perda de autoestima, enquanto o luto geralmente não. No luto, emoções positivas e memórias felizes do falecido geralmente acompanham sentimentos de dor emocional pela perda de alguém importante. No transtorno depressivo maior, os sentimentos de tristeza são constantes, e no luto costumam vir em episódios intercalados por momentos de menor sofrimento psíquico.

As pessoas experimentam a depressão de maneiras diferentes, podendo interferir no seu trabalho diário, resultando em perda de tempo e menor produtividade. Também pode influenciar relacionamentos e algumas condições crônicas de saúde. As condições que podem piorar devido à depressão incluem artrite, asma, doença cardiovascular, fibromialgia, câncer, diabetes, obesidade dentre outras.

De acordo com Robert L. Leahy, professor e autor de diversos livros, "se você está vivo, então tem sentimento. E, se você está consciente, também tem sensações, dor e a consciência de que alguma coisa está acontecendo".

É importante perceber que sentir-se para baixo às vezes é uma parte normal da vida. Acontecimentos tristes e perturbadores acontecem a todos, mas se você está se sentindo para baixo ou sem esperança de forma regular por motivos diversos ou ainda sem saber o porquê, pode estar diante de uma depressão —procure um médico psiquiatra ou um profissional de psicologia para te auxiliar. A depressão é considerada uma condição médica grave que pode piorar sem tratamento adequado.

Nem todo mundo com depressão experimentará os mesmos sintomas. Os sintomas podem variar em gravidade, com que frequência acontecem e quanto tempo duram; podendo diferir entre homens, mulheres, adolescentes e crianças.

Se você tiver alguns dos seguintes sinais e sintomas de depressão quase todos os dias por pelo menos 2 semanas, você pode estar vivendo com depressão, como sentir-se triste, ansioso ou "vazio"; sentir-se sem esperança, inútil e pessimista; chorar muito e com frequência; sentir-se incomodado, irritado ou com raiva; perder o interesse por hobbies e coisas que você gostava; sentir-se sem energia ou fadigado; ter dificuldade em se concentrar, lembrar de situações ou tomar decisões; mover-se ou falar mais devagar; apresentar dificuldades para dormir, despertar de manhã cedo ou dormir demais; ter alterações de apetite ou peso; sentir dor física crônica sem causa clara que não melhora com o tratamento (dores de cabeça, dores ou dores, problemas digestivos, cólicas); apresentar pensamentos de morte, suicídio, automutilação ou tentativas de suicídio.

Depressão pode ter relação com uma quantidade baixa de serotonina?

A serotonina é um importante neurotransmissor implicado na estabilidade emocional. É uma substância química que atua nos circuitos cerebrais relacionados a sensação de autoconfiança, regulação emocional e motivação.

Considerada muito tempo como a "molécula da felicidade", a serotonina seria a substância química que transforma o preguiçoso em aprendiz e a vítima em vitorioso, já que aumentaria a intensidade de emoções positivas, além de elevar a autoestima, convertendo o estresse em motivação.

Entretanto, neste ano, a revista Molecular Psychiatry publicou uma revisão sistemática sobre a "Teoria da Serotonina para Depressão". Há uma teoria de que anormalidades na serotonina teriam relação e até seriam responsáveis pelo surgimento de depressão.

O resultado da revisão não surpreende, pois não há evidência consistente para sustentar a tese de que problemas na serotonina causem depressão. De acordo com o psiquiatra Pedro Rosa, "pra quem acompanha a produção científica de perto, esse resultado não traz surpresas. A teoria da serotonina foi construída nos anos 60, e nunca foi confirmada. De forma oposta, muitas outras teorias para explicar o surgimento de depressão foram construídas ao longo das décadas, acumulando evidências científicas sólidas nesse caminho. São essas outras teorias que compõe o conhecimento atual das ciências da saúde sobre a depressão, e não a 'Teoria da Serotonina".

Por que minha depressão não melhora?

De acordo com Pedro Rosa, "infelizmente muitos pacientes com depressão, mesmo diante de um bom tratamento, não melhoram, melhoram pouco ou voltam a piorar depois de algum tempo".

Rosa lista as 12 razões mais relevantes que podem fazer com que a depressão não melhore —fique atento a elas e, junto com seu médico e terapeuta, avalie trabalhar e detectar cada ponto:

  1. Aderência ruim às medicações e/ou à psicoterapia. Usar a medicação intermitentemente ou pará-la quando se sente melhor não colabora com o tratamento. Não levar a psicoterapia a sério, tanto em frequência quanto em presença efetiva nas sessões é pouco compatível com uma depressão bem tratada.
  2. Você está com dificuldades para lidar com os desafios do seu dia a dia. Gerenciar estresse é fundamental, principalmente quando você tem um problema grande, difícil e complexo. E o mais importante: é possível aprender a gerenciar o estresse.
  3. Você tem na sua vida um problema que não será solucionado. Eu tenho certeza de que otimismo é importante, mas existem, sim, problemas que não têm solução. Existem perdas que não serão resolvidas, por exemplo. Aceitação radical disso tudo é fundamental para que possamos viver decentemente na presença desse sofrimento.
  4. Você tem uma relação pouco saudável com as suas próprias emoções e pensamentos. Seres humanos estabelecem uma relação pessoal e íntima com tudo que acontece dentro das suas mentes. Tente ler sobre, buscar técnicas respiratórias e atividades que foquem no seu bem estar mental, como ioga e mindfulness.
  5. Você deixou de fazer atividades importantes para você. Isso pode ter acontecido por forças maiores, como desemprego, ou porque você achou que não valia mais a pena ou não era mais necessário. Nós precisamos de lazer e de atividades gratificantes. Precisamos ter no nosso cotidiano atividades prazerosas e que nos tragam sensação de maestria, isto é, de habilidade sobre o que fazemos.
  6. Você se distanciou (ou foi distanciado) de pessoas que eram importantes para você. Nós precisamos de uma rede de suporte social sólida e de sensação de pertencimento a grupos de pessoas para a nossa identidade.
  7. Você tem dificuldades em resolver problemas, mesmo aqueles absolutamente dentro do seu conhecimento e habilidade. Resolução de problemas é uma habilidade que pode ser aprendida e torna a nossa vida muito mais fluida e leve.
  8. Você tem dificuldade em lidar com relações interpessoais desafiadoras. Talvez o mais amplo e diversificado item desta lista, este tema inclui: a) conseguir ser mais assertivo nas relações, assim como b) impor limites nelas, c) encerrá-las quando são inviáveis e d) aprender a extrair emoções positivas de interações sociais cotidianas.
  9. Há traumas não tratados ou lutos não resolvidos. Não me leve a mal: não devemos tentar esquecer o passado ou ignorar os eventos difíceis da nossa vida. Isso seria impossível. Entretanto, precisamos estar abertos a construir para nós mesmos uma vida de qualidade mesmo diante de um passado muito sofrido.
  10. A sua saúde física está ruim. Isso inclui tratar dor crônica, se alimentar bem, aprender a dormir bem, fazer atividade física, tratar doenças físicas e respeitar os limites do seu corpo.
  11. Abuso de substâncias, como álcool, maconha e cocaína. Em geral, quando há uma "queda de braço" entre drogas e o tratamento de transtornos mentais, as drogas em geral vencem (e você perde...).
  12. Seu diagnóstico não é (só) depressão, mas, sim, transtorno bipolar (e não depressão), ou transtornos de personalidade (que, em geral, vêm junto com depressão). Por isso, busque sempre uma rede de apoio.

*Colaboração Dr Pedro Rosa, médico psiquiatra. Graduação em medicina pela Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (FMUSP). Residência médica em psiquiatria pelo Instituto de Psiquiatria do Hospital das Clínicas da FMUSP. Doutor em ciências pela FMUSP. Pesquisador do Laboratório de Neuroimagem em Psiquiatria (LIM-21) da FMUSP. Atua em consultório privado e em hospitais em São Paulo (Hospital Israelita Albert Einstein e Hospital Sirio-Libanês).

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