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Adotar embrião é opção mais barata para quem tem dificuldade em ter filhos

Claudia Migliaccio, do projeto "Acabei de descobrir", e Adriana Abdo, que adotou embriões - Arte/UOL
Claudia Migliaccio, do projeto "Acabei de descobrir", e Adriana Abdo, que adotou embriões
Imagem: Arte/UOL

Natália Eiras

Colaboração para Universa

03/05/2023 04h00

Adriana Abdo Isaac tinha 45 anos quando engravidou naturalmente, após duas tentativas frustradas por reprodução assistida: uma com os próprios óvulos, outra com sêmen doado. Naquela altura, já havia encerrado um casamento —a relação se desgastou diante do insucesso do casal em ter filhos— e investido mais de R$ 50 mil em tratamentos de fertilidade.

Mas a gravidez de Adriana era ectópica —o óvulo havia se instalado em uma das trompas— e precisava ser interrompida. "Chorava diante do médico, implorava para ter o bebê", relata. "Mas não havia essa possibilidade. Se a gravidez continuasse, eu morreria."

Hoje, passados quatro anos do episódio, ainda chora ao relembrar a cena. Mas logo se recompõe, porque precisa cuidar das filhas de 1 ano. As gêmeas nasceram após Adriana ter chegado a desistir de gerar um bebê. "Estava no meu limite emocional, físico e financeiro", afirma. Mudou de ideia após saber que poderia adotar embriões.

Embriões excedentes

Cada ciclo de fertilização in vitro pode gerar entre dois e quatro embriões viáveis. O genitor escolhe, então, transferir um ou dois por gestação. Quando a gravidez é um sucesso, sobram os outros.

Há quem escolha guardá-los para novas gestações. Mas isso custa dinheiro. Então não é raro que sejam abandonados por quem não queira —ou não possa— pagar a taxa de manutenção da criopreservação cobrada pelas clínicas especializadas.

Estima-se que haja, no Brasil, 150 mil embriões nessa situação. O número tende a aumentar. De acordo com relatório do Sistema Nacional de Produção de Embriões, mais de 114 mil embriões foram congelados em 2021— um crescimento de 225% nos últimos dez anos.

Os embriões podem ficar congelados por tempo indeterminado (quando há algum conflito de interesse entre os genitores) ou, caso o casal concorde, direcionados para pesquisas ou embriorecepção — ou seja, colocados para doação.

Uma das vantagens deste método é o preço. Por pular a etapa da fertilização, ele custa em torno de 40% a 60% menos do que o tratamento completo, de acordo com a empresária Claudia Migliaccio, criadora do projeto "Acabei de descobrir". O trabalho de Claudia é auxiliar mulheres a encontrarem métodos de reprodução assistida por valores que possam pagar.

Foi assim que Adriana conseguiu ser mãe. E, mais recentemente, Sabrina*.

'Não faço questão que herde meus genes'

Sabrina* tem 35 anos e atua como enfermeira em São Paulo. Descobriu possuir baixa reserva de óvulos quando decidiu congelá-los. Não podia arcar com R$ 20 mil em medicação para induzir a produção de óvulos — sem contar os honorários médicos. "Fiquei destruída", lembra. Fez uma pesquisa e descobriu a possibilidade de adotar embriões, procedimento que cabe no orçamento dela (a estimativa de custos é de R$ 10 mil).

"Nunca fiz questão que meu filho herdasse meus genes", diz a enfermeira. Em março, ela recebeu a notícia de que há dois embriões à sua espera. O primeiro será implantado em julho — o intervalo de três meses é necessário para que se prepare fisicamente para a gestação. O outro será congelado para uso no futuro.

'Não é um bebê'

Apesar da vantagem econômica, a adoção esbarra em uma dificuldade: o reduzido número de casais dispostos a doar embriões excedentes. Como consequência, há poucas clínicas habilitadas a oferecer o serviço para seus pacientes. Em uma delas —a Ilumini Clinic, de São Paulo— há 60 pessoas na fila de espera.

"Ainda existe um tabu. Pessoas não querem ver 'filhos seus' andando por aí", afirma Ricardo Luba, médico-ginecologista e obstetra, sócio-fundador da Ilumini Clinic.

"Há a ideia de que se está doando um filho. Mas não é verdade. São cerca de 200 células, apenas. Isso não é um bebê, mas um embrião que, no corpo da receptora, se tornará parte dela, absorvendo seus nutrientes, estilo de vida, modo de pensar e agir", afirma Claudia Migliaccio, do projeto "Acabei de descobrir". "Doa-se apenas a genética. O filho não será de quem doou, mas do casal que gerou", diz.

'Nasceu a minha cara'

Qualquer pessoa pode adotar um embrião excedente, inclusive para a chamada produção independente. O advogado Eduardo Vasconcelos, presidente da Comissão de Biodireito e Bioética do Instituto Brasileiro de Direito de Família, explica que o processo corre em anonimato. Doadores não têm acesso às informações da criança que nasceu. Os pais também desconhecem quem foram os doadores.

Sabem apenas que os óvulos foram produzidos por mulheres de até 37 anos e o sêmen, por homens de até 40, conforme estabelecem as regras de doação para embriorecepção.

Assim que se decidiu pelo procedimento, Adriana Abdo Isaac entristeceu-se ao pensar que a criança não teria seu sangue. O sentimento esvaiu-se quando descobriu que estava grávida de gêmeos, cinco semanas e meia após o implante. "Então esqueci que eram embriões doados. Eram meus", diz. "Tanto que uma das filhas nasceu a minha cara".