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Após sofrer tentativas de estupro, lutadora ensina mulheres a se defenderem

Erica Paes (centro) e alunas do programa "Eu Sei Me Defender" - Reprodução/Instagram
Erica Paes (centro) e alunas do programa "Eu Sei Me Defender" Imagem: Reprodução/Instagram

Talyta Vespa

Da Universa

01/07/2018 04h00

Faixa preta de jiu-jitsu e lutadora de MMA, a paraense Erica Paes, 38, sofreu duas tentativas de estupro. A primeira em 1995, quando tinha apenas14 anos. Desde então, a esportista passou a se dedicar à defesa pessoal. Hoje, ela ensina mulheres a se defenderem de estupradores de rua. Em 2014, ela sofreu uma nova tentativa de abuso sexual. Desta vez, já preparada, parou o agressor.

“Consegui me desvencilhar nas duas ocasiões sem usar a força, apesar de ser uma mulher forte. Pensei: ‘Se eu, que sou faixa preta de jiu-jitsu, sofri uma tentativa de estupro, imagine as mulheres comuns? Elas precisam aprender a se defender”, disse a esportista à Universa.

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Abordagem sem armas

Segundo dados do Fórum Brasileiro de Secretaria de Segurança Pública, o país tem, em média, 135 estupros por dia – e, de acordo com Erica, em 90% dos casos, o agressor não está munido de armas. “Normalmente, a intimidação acontece pela verbalização. O cara chega, segura a mulher pelo pulso ou a abraça por trás e diz: ‘não grita, não vou te matar. Me abraça, finge que é minha namorada’”, explica a lutadora.

Erica afirma que as principais reações da vítima são a paralisação ou a histeria. “Algumas mulheres ficam estáticas, sem reação, quando são abordadas por um estuprador. Outras reagem com histeria: gritam, pedem ajuda, se debatem”, diz.

O que fazer?

De acordo com a esportista, nenhuma das reações comuns são indicadas para se livrar do abuso. “Não dá para tentar competir com o agressor quando o assunto é força. Ele é homem, é naturalmente mais forte.”

Para se desvencilhar, não precisa de força, é só entender qual a movimentação correta

Condução pelo pulso

“Se ele segura o seu braço para te conduzir, não feche nem puxe a mão para tentar sair. Se fizer isso, você vai aproximar o agressor de você. Abra a mão e os dedos, gire-a em eixo e saia. Se o agressor segurar as duas mãos, faça o movimento com as duas ao mesmo tempo”, afirma.

Abraço por trás, imobilizando os braços

“Se o abusador agarrar a mulher por trás e tirá-la do chão, ela deve virar as duas palmas da mão para cima e elevar os braços. Saia sempre pelo sentido oposto à direção em que caminha o agressor. Se ele estiver te conduzindo para a direita, você sai pela esquerda”.

Técnicas de autodefesa para mulheres

Universa

No chão

“Se o abusador já jogou a mulher no chão e está pronto para consumar o ato, ela pode fazer um trabalho técnico de fuga de quadril. Com os pés, ela vai conseguir se afastar para manter uma distância segura do agressor e fugir”.

Técnicas de autodefesa para mulheres

Universa

Em 2015, Erica fundou o “Eu sei me defender”, projeto que ensina mulheres gratuitamente a se defenderem de estupro e violência doméstica. Atualmente, as aulas acontecem em Belém e no Rio de Janeiro, aos sábados. “Formei professoras para que eu não precisasse estar presencialmente em todos os lugares, isso dificultaria a frequência das aulas”, afirma.

“Eu entro quando tudo falha: segurança pública, Ministério Público e a educação”, continua Erica, que planeja trazer o projeto para São Paulo.

Quem são os estupradores de rua?

Segundo o psiquiatra e especialista em saúde mental Hewdy Lobo, há três tipos de estupradores de rua – e a maior parte dos crimes é realizada pelos que não têm nenhum tipo de doença mental ou estiveram sob efeito de drogas.

“A maioria dos estupradores comete o crime de maneira voluntária, provavelmente porque sabe que a Justiça é lenta e falha. Esses criminosos sentem prazer quando estão em posição de domínio, mesmo que, para isso, agridam outra pessoa”, explica Lobo.

O especialista afirma que poucos desses crimes terminam em condenação – já que muitos são negligenciados e, muitas vezes, não são registrados. “Muitas pessoas associam maldade à doença mental, e uma coisa não tem a ver com a outra.”

A maioria dos estupradores não é doente, mas má

Há poucos casos de estupro cometidos por pessoas com transtornos mentais. De acordo com Lobo, as doenças que, normalmente, estimulam essa violência são transtorno bipolar e retardo mental leve. No primeiro caso, o crime pode acontecer quando o criminoso está na fase de mania, que resulta em um desejo sexual exacerbado. “Nessa fase da doença, ele não consegue controlar seus comportamentos e instintos, tendo uma redução na capacidade de compreensão do limite, o que faz com que os instintos prevaleçam sobre a razão”.

Quando se trata de retardo mental leve, o paciente tende a ter um comportamento agressivo na esfera sexual. “Algumas dessas pessoas não controlam o desejo de fazer sexo, não conseguem conter os impulsos”, explica.

Os casos de estupro cometido por homens sob efeitos de drogas são mais comuns, mas estão longe de alcançar os estupradores "sóbrios". Segundo Lobo, as principais drogas utilizadas por esses criminosos são as de efeito estimulante. "Cocaína e craque", garante.