Filhos devem respeitar hábitos dos pais idosos e nunca infantilizá-los
Todos adquirimos hábitos ao longo da vida. E, a cada ano, adquirimos novos, que podem ser irritantes para as pessoas que nos cercam. É frequente que os filhos, quando adultos, comecem a questionar esses hábitos dos pais idosos e tentem mudá-los, com a boa intenção de fazer os mais velhos viverem com mais qualidade. Mas é preciso saber diferenciar quando é necessário intervir ou quando não passa de um desejo egoísta de impor as próprias vontades.
A associação entre idoso e mania é amplamente disseminada e tem um cunho caricatural, diz a professora Adriana Braga de Castro Machado, geriatra da FMB – Unesp (Faculdade de Medicina de Botucatu da Universidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho). "Na terceira idade, é possível que haja uma intensificação de traços da personalidade. Mas é incomum que alguém de fácil convivência quando adulto se torne um idoso ranzinza e cheio de manias", afirma.
Segundo ela, nem sempre novos hábitos são negativos. "Atitudes comuns, como, por exemplo, ser mais sistemático em sua rotina, pode trazer benefício ao idoso, como o de não esquecer de coisas importantes", afirma.
Nesses casos, é comum que os filhos vivam um dilema. "Da mesma forma que é preciso ter atitudes para proteção e evitar riscos, não se pode tirar autonomia e a independência dos idosos, pois isso compromete a funcionalidade e a produtividade deles", diz Busse.
Mas é melhor para eles...
É natural que os filhos queiram que os pais vivam da maneira mais saudável e confortável possível. No entanto, nem sempre os pais estão de acordo com as mudanças propostas. Como saber se você realmente deveria fazer algo para ajudá-los?
Segundo o geriatra Salo Buksman, da SBGG (Sociedade Brasileira de Geriatria e Gerontologia), não se deve obrigar os pais idosos lúcidos a aceitar uma vontade sua, mesmo que você esteja certo de que isso isso trará benefícios a eles. "Invadir o espaço alheio e impor limites faz muito mal. Você pode até garantir que eles se exponham menos a riscos, mas o trauma psicológico é muito grande”, diz ele.
Conversa entre adultos
Para que a transformação desejada de fato aconteça, é preciso abordar os pais com muito cuidado, sem fazer com que eles sintam que perderam parte da autonomia. Segundo Adriana, uma conversa franca, afetuosa e respeitosa é o melhor começo. E, exceto quando há limitações cognitivas, a palavra final deverá ser sempre a do idoso.
De acordo com Busse, é preciso sempre perguntar a opinião do idoso e apresentar-lhe os benefícios que a mudança traria na sua qualidade de vida. Se ele negar, pergunte quais os motivos dessa decisão e tente entendê-lo. "É preciso derrubar as barreiras de uma forma respeitosa, e o idoso deve participar de todo o processo de decisão", diz ele.
Mudança gradual
Mesmo com tantos riscos, é preciso ter em mente que os idosos devem sempre ter o direito de decidir o que é melhor para eles. “Se você começar a protegê-los de tudo e fazer tudo por eles, os pais vão começar a ficar sempre em casa. E logo estarão isolados”, afirma.
Contornando hábitos
De acordo com Adriana, sempre que mostramos interesse à história de vida e reforçamos a importância da autonomia dos idosos, conseguimos estabelecer um bom canal de comunicação, baseado na confiança e no respeito.
Segundo ela, algumas situações são propícias para levar ao isolamento dos idosos: ambiente familiar pouco atrativo e estimulante para eles, convívio com pessoas que não demonstram real interesse em suas ideias e opiniões ou dificuldade de comunicação por uma limitação (ex.: problema auditivo).
Nessas situações, o melhor que os filhos podem fazer é estarem presentes. “A companhia é o melhor remédio. A solidão e a as inúmeras perdas levam os idosos a se afastar. É preciso visitá-los todos os dias, levá-los para sair, incentivá-los a fazer hidroginástica ou dança de salão. É comum que filhos e netos não tenham tempo para eles, e esse isolamento social é provocado pelo abandono”, diz Buksman.
Há, também, aqueles que têm essa atitude por estarem deprimidos. Caso o comportamento persista, é preciso consultar um médico para diagnosticar o quadro.
Por outro lado, há aqueles que se recusam a diminuir o ritmo de atividades e acabam colocando a saúde em risco. "Quando o idoso realiza ações arriscadas para si ou para terceiros é preciso solicitar ajuda ao médico. Só ele poderá mostrar quais são as consequências de continuar realizando atividades não mais adequadas", diz Adriana.
"A solução para idosos muito ativos que não aceitam ajuda é pensar em saídas inteligentes, como colocar objetos em locais que não exijam que ele suba em uma escada, instalar um dispositivo que desligue automaticamente o gás depois de muito tempo aberto, colocar barras no banheiro, corrimão nas escadas etc.", diz Busse.
É preciso também ficar atento a outras manias que podem ser um alerta para um problema de saúde mais grave. Segundo Busse, guardar coisas em excesso pode estar relacionada a um transtorno de ansiedade, por exemplo.
Situações que exigem o diagnóstico e o tratamento de um médico permitem certa insistência com os pais. Por mais que o idoso se recuse a ir a um hospital, se ele apresenta sintomas como tosse persistente e febre alta, é preciso que ele seja examinado. Mas há uma solução: levar o médico até ele. “Essa é a última opção. Sempre tente sensibilizá-lo, sem obrigá-lo a fazer algo", diz ele.
É fundamental que o idoso participe ativamente, junto com familiares, de consultas médicas de rotina, compreendendo e opinando sobre possíveis tratamentos. “Por vezes, o que o filho julga ser o maior problema, pode não ser para o pai. Vale sempre discutir essas dúvidas com o médico assistente”, diz Adriana.
"A maioria dos idosos é capaz de tomar decisões e fazer julgamentos pertinentes sobre como conduzir sua vida, incluindo sua saúde e autonomia", afirma.
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