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Empresas apostam em novas tecnologias para reduzir pegada de carbono

Avião Airbus A320neo, da LATAM, que conta com DPO ("otimização de perfil de descida") para diminuir pegada de carbono - Pigeyre Pascal - MasterFilms/Airbus
Avião Airbus A320neo, da LATAM, que conta com DPO ("otimização de perfil de descida") para diminuir pegada de carbono Imagem: Pigeyre Pascal - MasterFilms/Airbus

Julia Moioli

Colaboração para Tilt

15/09/2022 04h00

Quando seu carro usa etanol, produzido no Brasil a partir da cana de açúcar, ele emite cerca de 80% menos gases de efeito estufa do que se usasse gasolina. Mas já existe uma terceira opção capaz de baixar este número para 93%: o etanol de segunda geração (E2G), feito com o bagaço da cana.

Para produzi-lo, a Raízen (joint venture entre a Shell e a Cosan) implementou o conceito de "indústria 4.0" em suas fábricas. A automação é completa, segundo a organização, e um sistema de inteligência artificial regula a velocidade das turbinas, da admissão de ar e a dosagem do bagaço. As ligações químicas do combustível são visualizadas em NiR (sigla em inglês para "próximo ao infravermelho").

"É a tecnologia trabalhando para reduzir a pegada de carbono — ou seja, a emissão de gases de efeito estufa como dióxido de carbono, metano e óxido nitroso relacionadas a um produto. Ela está presente de ponta a ponta no nosso processo. Sem ela, esse avanço não seria possível", diz Juliano Augusto de Oliveira, diretor industrial corporativo da Raízen.

A eficiência beneficia até o início da cadeia produtiva. "O plano é que em dez anos a produtividade energética da empresa seja aumentada em 50% dentro da mesma área agricultável, sem precisar de nenhum pé de cana a mais", afirma Oliveira. "É uma fonte de energia renovável e que não compete com comida, já que utiliza um resíduo."

Versões menos poluentes

"Estamos em um momento mágico entre a necessidade de lidar com o tema da sustentabilidade e o alto desenvolvimento da tecnologia", acredita Emanuel Fernandes Zaninetti de Queiroz, diretor de desenvolvimento de software ao cliente da Capgemini, multinacional francesa de consultoria, tecnologia e outsourcing.

Ele cita, por exemplo, sensores instalados em chaminés de autofornos e outras saídas das indústrias para identificar gases danosos ao meio ambiente. Ou ainda placas eletrovoltaicas que fazem simulações rápidas para determinar a melhor forma de aquecimento de água, dependendo do horário, da temperatura ou da demanda.

Mas e se a pegada de carbono está no modo como o cliente final usa o produto? É o caso da multinacional sueca de ferramentas e soluções industriais Atlas Copco: só 15% da emissão está na produção.

O jeito é melhorar a eficiência energética do produto. "Não lançamos uma nova família de produtos que tenha gasto energético superior ao da anterior", afirma Carlos Maia, VP para América Latina. Ou então oferecer versões menos poluentes - como um novo compressor portátil, que usa eletricidade em vez de diesel e emite 46% menos CO2.

"Também apostamos em interconectividade, ou seja, todos os nossos produtos se comunicam entre si para gerar mais interação e, consequentemente, economia", explica Maia.

E créditos de carbono?

Dafne Oliveira C. de Morais, professora de administração da FEI - Divulgação/FEI - Divulgação/FEI
Dafne Morais, da FEI: blockchain como aliado da sustentabilidade
Imagem: Divulgação/FEI

A tecnologia também impulsiona outra estratégia: a comercialização de créditos de carbono, que servem para compensar emissões. "O uso de blockchain, por exemplo, permite rastreabilidade e mais confiabilidade nesse processo", afirma Dafne Oliveira C. de Morais, professora de administração do Centro Universitário FEI.

A companhia aérea LATAM atua em ambas as frentes: investe em tecnologia e adquire créditos. Uma de suas iniciativas é a Sextas Compensam: cada tonelada de dióxido de carbono gerada em nove rotas domésticas resulta em um crédito de carbono, destinado a projetos de conservação e restauração. A estimativa é que sejam compensadas cerca de 18 mil toneladas de CO2 este ano no país.

Nos aviões, a novidade é o DPO (sigla em inglês para "Otimização de Perfil de Descida"), uma atualização do sistema eletrônico de voo que melhora a trajetória de pouso. "Iremos instalar em até 200 aviões da família Airbus A320", explica Gislaine Rossetti, diretora de relações institucionais e regulatório da LATAM. "A expectativa é reduzir em mais de 60 mil toneladas a emissão anual de CO2".

Essa tecnologia já vem de fábrica nas novas aeronaves Airbus A320neo, que também são equipadas com motores mais eficientes e inovações de aerodinâmica capazes de economizar até 20% de combustível. E, por falar em combustível, a empresa quer alcançar, até 2030, a meta de usar ao menos 5% de Combustível de Aviação Sustentável, preferencialmente produzido na América do Sul.

Medir e monitorar

Para conhecer sua pegada de carbono e reduzi-la, as empresas precisam primeiro mensurá-la.

"Já existe no mercado uma variedade enorme de softwares para isso, desde tabelas de Excel até opções mais sofisticadas", diz Annette Zimmerman, analista VP de gerenciamento de produto na consultoria Gartner, na Alemanha. "São elas que vão determinar com precisão como é possível conseguir ganhos claros imediatamente e como prever e planejar as reduções a longo prazo."

Nem sempre é uma missão tão simples. A Bayer, por exemplo, encontrou um desafio extra para reduzir as emissões de agricultores clientes: as ferramentas internacionais de mensuração foram pensadas para o clima temperado europeu e não são tão adaptáveis à realidade brasileira.

"Tivemos que desenvolver uma tecnologia em parceria com Embrapa, ESALQ e Unesp para tropicalizar esses mecanismos e criar calculadoras que também tragam o dado local", conta Fábio Passos, diretor de negócio de carbono da Bayer Crop Science.

O processo foi todo digitalizado, levando em conta inventários automáticos e informações das próprias máquinas (como o consumo de diesel), além de medições com infravermelho. "Sem tecnologia, não conseguimos dar o lastro e a rastreabilidade que a cadeia demanda", diz Passos.