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Em meio à guerra, astronauta dos EUA deve voltar do espaço em nave russa

Cápsula russa Soyuz MS17 é uma das formas de ir e vir da Estação Espacial Internacional - Reprodução/Twitter/@ivan_mks63
Cápsula russa Soyuz MS17 é uma das formas de ir e vir da Estação Espacial Internacional Imagem: Reprodução/Twitter/@ivan_mks63

Marcella Duarte

Colaboração para Tilt, em São Paulo

02/03/2022 16h04

As tensões entre Estados Unidos e Rússia após a invasão da Ucrânia têm se elevado na Terra. A mais de 400km de altitude, porém, astronautas e cosmonautas dos dois países convivem pacificamente na Estação Espacial Internacional (ISS). Contudo, uma situação pode deixar o clima um pouco mais tenso no final deste mês, pelo menos do ponto de vista das relações diplomáticas.

O astronauta norte-americano Mark Vande Hei deve retornar à Terra no dia 30, após uma estadia recorde de 355 dias seguidos no espaço. Para fazer sua viagem de volta, ele terá como meio de transporte uma nave russa, a Soyuz.

O retorno deve ocorrer junto com os cosmonautas (como é chamada a tripulação espacial da Rússia) Pyotr Dubrov e Anton Shkaplerov, em um pouso na base de Baikonur, no Cazaquistão — que é alugado e operado pelo país liderado por Vladimir Putin.

Esse tipo procedimento é algo comum desde que a Nasa, agência espacial dos EUA, aposentou o projeto de seu Ônibus Espacial, em 2011. A infraestrutura russa passou então a ser a única maneira de chegar e sair da ISS em uma parceria que já dura anos.

Foi só a partir de 2020 que as viagens passaram a se alternar entre o envio de foguetes russos e os da empresa norte-americana SpaceX, de Elon Musk, com as cápsulas Crew Dragon —com essa parceira, inclusive, os EUA voltaram a conseguir enviar astronautas a partir de seu território. Porém, ela não dá conta de todos os lançamentos previstos para as missões espaciais da Nasa.

Vida na ISS

Vande Hei chegou à Estação em 9 de abril de 2021, a bordo da cápsula Soyuz MS-18, da agência espacial russa Rocosmos. Por isso, esta deve ser sua carona pra casa.

Uma possibilidade para evitar a viagem diante do clima de tensão entre os países seria se juntar à missão privada Ax-1, da empresa Axiom, que chega à ISS no mesmo dia 30 e retorna à Terra dez dias depois. Mas a Nasa já negou essa intenção.

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ISS é fruto de uma longa e bem-sucedida parceria entre EUA e Rússia, que já dura mais de duas décadas
Imagem: Nasa

De qualquer forma, o astronauta deve ser um dos últimos da Nasa a depender de uma viagem Soyuz — não apenas devido às animosidades entre os países, mas porque a SpaceX tem expandido seu potencial e infraestrutura.

Abalos na exploração espacial

A agência espacial norte-americana ressalta que as operações da ISS seguem bem, apesar das crescentes tensões em terra. A Rocosmos, por sua vez, parece estar pulando fora da cooperação internacional no espaço.

Com as crescentes sanções que os EUA têm aplicado, a Rússia já anunciou a suspensão da parceria com a ESA, agência espacial europeia, para lançamento de satélites, e excluiu a Nasa de uma missão conjunta para exploração do planeta Vênus, chamada Venera-D, prevista para 2029.

A Estação na órbita da Terra é fruto de uma longa e bem-sucedida parceria entre EUA e Rússia, que já dura mais de duas décadas. Um símbolo da diplomacia pós-Guerra Fria, que nunca foi abalada por conflitos geopolíticos, como a invasão da Crimeia. Agora, porém, há ameaças russas.

"Se você bloquear a cooperação conosco, quem salvará a Estação Espacial Internacional (ISS) de uma órbita descontrolada e cairá nos Estados Unidos ou... na Europa?", escreveu o diretor-geral da Roscosmos, Dmitry Rogozin, no Twitter.

"Também há a possibilidade de uma estrutura de 500 toneladas cair sobre a Índia e a China. Você quer ameaçá-los com tal perspectiva? A ISS não sobrevoa a Rússia, portanto todos os riscos são seus. Você está pronto para eles?", completou.

Sobre a polêmica, a Nasa foi mais diplomática: "continuamos trabalhando com todos os nossos parceiros internacionais, incluindo a estatal Roscosmos, para as operações seguras e contínuas da Estação Espacial Internacional", escreveu Joshua A. Finch, relações públicas da agência.

"As novas medidas de controle de exportação continuarão a permitir a cooperação espacial civil EUA-Rússia. Nenhuma mudança está planejada para o suporte de operações contínuas em órbita e estações terrestres", acrescentou.

Lá em cima, astronautas dos dois países e de outros parceiros internacionais, como Canadá, França, Alemanha e Japão, procuram conviver em harmonia pelo progresso da exploração espacial e para realização de pesquisas na microgravidade, que impactam a vida na Terra.

A ISS tem um segmento russo e um norte-americano, mas os tripulantes convivem livremente e um lado depende do outro: a energia para funcionar e o suporte de vida é fornecido pelos EUA; os motores para manter a ISS em órbita e fazer manobras necessárias são da Rússia.

No momento, há quatro astronautas dos Estados Unidos, um da Alemanha, e dois cosmonautas russos a bordo.

A Estação Espacial deve ser aposentada em janeiro de 2031, quando será derrubada controladamente no Oceano Pacífico. Até lá, as duas potências devem encontrar uma maneira de continuar a cooperação.

Em uma eventual saída russa, acredita-se que a Nasa conseguiria manter o laboratório orbital por meio de parcerias com empresas privadas, como a própria SpaceX e a Northrop Grumman. Mas ainda é cedo para as agências tomarem uma decisão final.