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Dados e divisão: como gigantes de tec foram de protagonista a alvo na SXSW

Poder das grandes empresas de tecnologia esteve na mira do SXSW - Getty Images
Poder das grandes empresas de tecnologia esteve na mira do SXSW Imagem: Getty Images

Gabriel Francisco Ribeiro

Do UOL, em São Paulo

15/03/2019 04h00

O SXSW (South by Southwest), que ocorre desde a última sexta-feira (9) em Austin (Estados Unidos), é conhecido por ter uma série de conferências que falam de diversos assuntos, de música a política. Um dos temas mais recorrentes do evento, contudo, é a tecnologia. Mas parece que neste ano as discussões em torno deste assunto tomaram um rumo diferente.

Como aponta a Wired, o lado tecnológico do evento tomou uma direção "introspectiva": o que fazer com as empresas gigantes que têm tanto poder e onde iremos parar com as novas tecnologias que estão surgindo e mudando nossas vidas?

Um grande representativo dessa mudança no debate ocorreu em parte pela declaração da senadora democrata Elizabeth Warren, uma das possíveis candidatas a desafiar Donald Trump em 2020 na disputa pela Casa Branca. Ela defende que grandes empresas como Facebook, Amazon e Google sejam quebradas em partes menores para diminuírem seu poder - depois, incluiu a Apple na lista.

Esse assunto, que rolou logo no dia de abertura do evento, virou um combustível em debates e painéis. Em uma cidade cheia de investidores e de fundadores de startups, as perguntas foram involuntariamente destinadas ao que deve ser feito e qual a solução ideal de modelo de negócios.

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As invenções recentes

Até mesmo Elizabeth Warren apareceu por lá para defender sua ideia. Em uma conferência com sua presença, o mediador pediu para que funcionários das 'big tech' na plateia se levantassem, o que foi seguido por várias pessoas do auditório. Mesmo assim, ela continuou com seu posicionamento e justificou as razões para buscar a divisão.

"Partes das grandes empresas de tecnologia francamente são como estradas da era de Teddy Roosevelt. Quando alguém tem dominância no mercado, eles passam a destruir a competição", disse, segundo o Boston Globe.

Nem todos concordam

A polêmica, claro, repercutiu. Em vários painéis, o questionamento veio: "você concorda com a ideia de que as grandes empresas de tecnologia devam ser divididas?".

Alguns avaliaram a ideia como positiva, como foi o caso de Roger McNamee. Ele é conhecido por ter sido um dos primeiros investidores do Facebook e mentor de Mark Zuckerberg. Nos últimos anos, entretanto, virou uma voz ativa contra a rede social e admitiu até que aconselhou Warren antes dela tornar pública sua proposta contra as gigantes.

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Já Margrethe Vestager, comissária europeia sobre competição e conhecida por altas multas para as empresas de tecnologia, não se empolgou tanto com o assunto. Ela apontou que tentará de tudo e que um possível desmembramento das companhias só seria aplicado em último e remoto caso.

Houve até piadas sobre o assunto. No painel com os fundadores do Instagram, a pergunta apareceu e Kevin Systrom brincou perguntando se assim "teriam os empregos de volta" - ele e o brasileiro Mike Krieger deixaram a rede social que fundaram e foi comprada pelo Facebook no fim do ano passado por perderem a autonomia sobre a plataforma.

Mesmo assim, ambos disseram que a ideia não resolveria o problema das grandes empresas de tecnologia e alegaram que a compra do Instagram não diminuiu a competição entre as redes sociais - ainda assim, o Facebook é dono da imensa maioria das redes sociais mais usadas no mundo.

Em outro painel, Alex Stamos, ex-chefe de segurança do Facebook, elogiou a decisão de Zuckerberg de fazer a plataforma seguir em direção a um futuro de mensagens privadas e criptografas. O ex-executivo apontou que alguns dos desafios do Facebook, como moderação de conteúdo, iria desaparecer - algo que outras pessoas também criticam sobre o novo posicionamento de Zuckerberg.

Discussões além

As discussões ainda foram além disso. Neste ano, a SXSW tomou um rumo de tecnologia introspectiva ao analisar não apenas novas tecnologias que estão chegando, mas o impacto deles na nossa vida diária. Mais do que a glamourização de uma empresa no festival, como já ocorreu com o Periscope, Foursquare e Twitter em outros anos, o ponto central foi o desenho desse futuro.

A democrata em ascensão Alexandria Ocasio-Cortez, por exemplo, foi questionada sobre o futuro autônomo e o impacto de robôs no mercado de trabalho. Na resposta, disse que deveríamos estar felizes com essa possibilidade e que, se não estamos, o problema está no atual sistema que vivemos em que a pessoa sem emprego é marginalizada.

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Entenda

Mas os painéis foram além. Houve um com o título "Existem Direitos Civis em um Mundo Tecnológico?". Já outro debatia "Éticas e Responsabilidade na Era da Inteligência Artificial e da Internet das Coisas". Por último, um discutia "Privacidade do Usuário em um Mundo Pós-Cambridge Analytica".

São vários os exemplos de que a sociedade está mais atenta ao que vem por aí em relação à tecnologia. Um grande tema que foi citado entre vários palestrantes foi o da Big Data e de como nossos dados podem ser usados pelas grandes empresas futuramente.

Isso tudo mostra uma mudança grande de direção na SXSW: menos desejo de ser a "próxima grande coisa" da tecnologia que vai ter sucesso comercialmente e mais conversa sobre o que todas essas mudanças significam para a sociedade.

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Essa nova abordagem da SXSW representa, para muitos, o que parte da sociedade sente em relação à tecnologia. Afinal, antes éramos abertos a tudo que vem por aí e queríamos experimentar novos produtos. Isso ainda rola, mas lá no fundo quem está bem informado pensa: como esse produto pode me prejudicar?

A mudança de pensamento é algo que pode evitar futuros escândalos como tivemos no ano passado. Especialistas apontam que sempre existiu um "tecnotimismo" dentro das próprias empresas e na sociedade em geral - ou seja, sempre imaginamos na tecnologia como algo bom e deixamos de lado o potencial negativo dessas invenções.

Agora parece que estamos começando a pensar antes no que pode acontecer. Quem sabe não aprendemos com o passado?