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Felipe Zmoginski

Na China, tecnologia do Pix é usada até para pedir esmolas nas ruas

Pagamentos via QR Code, como no Pix, já são passado na China  - Divulgação/ Alizilla
Pagamentos via QR Code, como no Pix, já são passado na China Imagem: Divulgação/ Alizilla

21/10/2020 04h00

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A novíssima ferramenta de pagamentos instantâneos, o Pix, que estreia de verdade no Brasil em 16 de novembro, é um elogiável avanço. Na prática, retira o sistema de pagamentos e compensações do país de um atraso incompatível com o tamanho da economia brasileira, que apesar dos pesares ainda é uma das dez maiores do mundo.

Quem nunca se enroscou, por exemplo, ao lembrar que precisava fazer uma transferência às 0h20min e, bem, foi dormir enroscado porque muitos bancos têm seus canais digitais inacessíveis da 0h00 às 0h59. Ou, então, teve que ouvir a constrangedora piada "olha o golpe" ao pedir para o colega da firma pagar o almoço, já que você havia esquecido a carteira em casa ou na mesa do trabalho.

Com o Pix, paga-se por celular, escaneando um QR code, ou digitando a "chave" de um beneficiário em segundos. Não haverá mais aquela conversinha "eu juro que paguei, espera aí que vai compensar". O dinheiro chega para o destinatário na hora e (quase) sempre sem tarifas. Já passou da hora, aliás. Onde, no mundo civilizado, se paga até R$ 20 para fazer uma transferência interbancária?

Os dados preliminares do Pix são animadores. De acordo com o Banco Central, no dia 19 de outubro, mais de 40 milhões de chaves haviam sido registradas, um forte indício de que o brasileiro vai abraçar o novo meio de pagamento.

Em praticamente todos os países do mundo, o mobile payment vem crescendo. Em nenhum deles, porém, atingiu-se o nível de penetração alcançado na China, onde contabiliza-se 947 milhões de cidadãos com posse de ao menos alguma carteira virtual, o que significa virtualmente toda a população economicamente ativa do país.

O uso de QR code, aliás, uma modernidade para o Brasil, na China é uma tecnologia obsoleta, usada frequentemente por pedintes e moradores de ruas, que coletam esmolas em carteiras digitais. O meio de pagamento em ascensão é o smile to pay, em que sua biometria facial serve de senha para pagar a conta em restaurantes, salões de beleza e até nas catracas de metrô.

É um paradigma e, até certo ponto, uma incoerência, mas o fato de a China, governada há 71 anos pelo Partido Comunista Chinês, ter se tornado a única sociedade cashless do mundo, deve-se basicamente à pujança de seu capitalismo. Sistema esse que não é assim tão vibrante em países como o Brasil, nas nações da Europa ou mesmo nos Estados Unidos, onde velhas formas de pagar, como cartões de plástico e notas de papel são ainda muito populares.

Explica-se. Logo que se criaram as carteiras virtuais no país, o governo central de Pequim agiu como prócer do liberalismo, oferecendo amplo apoio à inovação e poucas amarras burocráticas. Duas empresas privadas, o Alibaba e a Tencent, então, investiram generosos subsídios por dois longos anos em ações de marketing e "cashback" para incentivar cidadãos e lojistas a abraçar suas carteiras. Deu no que deu, um sucesso estrondoso.

No Brasil, apesar da elogiável atitude do Banco Central em criar o Pix e do aquecido e competente mercado de fintechs, é improvável que um ou mais "jogadores" deste mercado faça o sacrifício financeiro —e tenha a visão de longo prazo— que tiveram as big techs chinesas. De toda forma, não há nada a lamentar. Cada um caminha com tamanho de suas pernas e, na corrida pela digitalização do mercado financeiro, o Pix coloca o Brasil em bom posto avançado.