'Endoida, caralho': Festival Psica incendeia Belém com rainhas e guerreiras

"Endoida, caralho, endoida, caralho!" A plateia incendiou quando Gaby Amarantos apareceu de surpresa no show da Majur no sábado do Psica. O grito, que é marca registrada dos paraenses, tomou o Mangueirão enquanto a dupla cantava Xirley, da musa do tecnobrega.

Gaby subiu seis vezes aos palcos do festival e foi celebrada como a "Grammy Winner", pelo Grammy Latino que conquistou este ano — o primeiro e único do Pará — com seu álbum "TecnoShow". Ao lado de Viviane Batidão, rainha do tecnomelody, a apresentadora do The Voice fez questão de lembrar o quanto a música do estado está voando em mãos femininas. Joelma e seu tacacá que o digam.

Não à toa, o vídeo-manifesto do Psica 2023 cravou: "A Amazônia é mulher".

Quando a chuva de todo dia de Belém já era garoa fina e os ambulantes recolhiam seus plásticos protetores, o Cortejo Encantado deixava o Açaí Biruta, na praça do Carmo, em direção à praça Frei Caetano Brandão para dar start no festival. Com seu batuque contagiante e potentes mulheres representando e saudando as matriarcas amazônidas, o desfile dava corpo ao seu manifesto.

Na sequência, as coloridas vocalistas do Afro Axé Dudu tomavam o palco montado entre a Igrejas da Sé e de Santo Alexandre com sua mãe de santo para o primeiro show da noite gratuita na Cidade Velha. Axé Dudu significa "força negra" em yorubá e a banda é derivada de um bloco de mesmo nome. "Nós cantamos a nossa ancestralidade como forma de resistência", dizem ao microfone para a praça que já ia enchendo.

Foi o axé para uma noite que ficaria marcada pelo encontro histórico e inédito dos mestres da guitarrada, Aldo Sena, Mestre Curica e Mestre Solano, pela catarse coletiva do público com o baiano Mateus Aleluia e pelo grave que chegou pelos pés e bateu no peito quando a aparelhagem Rubi ligou seu som na Praça do Relógio.

A potência feminina amazônida voltou a aparecer no sábado pouco antes de Majur ser ovacionada pelos fãs que lotaram as redes sociais do Psica exigindo seu nome no lineup. As Suraras do Tapajós, grupo formado por representantes de 12 etnias indígenas, sacaram suas maracas e seus curimbós —tambores sagrados— e fizeram a plateia rodopiar com o tradicional carimbó. "Somos Amazônia, somos mensageiras, Tapajós é seu rio e as suraras são guerreiras." No fim, um banho de cheiro para o pessoal da grade.

Depois de tanta ancestralidade, surge o novíssimo, com Zaynara, menina de 22 anos que está despontando no Pará com o beat melody, mais um derivado do brega com elementos eletrônicos e roupagem moderna.

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A noite que começou com o hardcore paraense do Baixo Calão, se emocionou com a obra "maldita" "O Filho de José e Maria", de Odair José, tocada com Azymuth, e que vibrou com a presença magistral de Jorge BenJor, terminou com Gaby e Majur montadas na aparelhagem Tudão Crocodilo. Enquanto o jacaré iluminado abria e fechava a boca e fogos saíam de sua estrutura, o público endoidava (caralho!) com o DJ misturando bregafunk com arrocha e muitas coisinhas mais.

Domingo teve Alcione. E a plateia do show que comemora seus 50 anos de carreira levou a cabo seu lema e endoidou. Teve histeria, choro, coro, cantoria a plenos pulmões, desde a trinca "Jorge da Capadócia", "Bebete Vambora" e "Cadê Tereza", que a maranhense cantou em pé, até "Não Deixe o Samba Morrer", com que se despediu emocionada após entregar todos os seus clássicos sentada numa linda cadeira branca e receber MC Tha e Gaby Amarantos para reverenciá-la.

E teve Pará, muito mais Pará.

Teve um show eletrizante do La Pupuña, banda que mistura guitarrada e surf music. (Eles, inclusive tocaram a música "Psica da Velha Chica". A expressão é o que o paraense fala quando quer "secar" um adversário. O vocalista, porém, fez questão de frisar que "psica", o nome do festival, não quer dizer azar, e sim "sorte", já que que a frase serve para "trazer a sorte para o nosso lado".)

Teve Jaloo, uma cantora sensível, que mescla pop e eletrônica com elementos da música tradicional paraense e que tem um carisma impressionante para envolver o público. Seu encontro com Gaby Amarantos no palco foi um dos mais lindos do festival.

E teve, Viviane Batidão, o furacão tecnomelody que é até difícil de explicar. É preciso presenciar Viviane, exuberante e envolvente. O público sabe absolutamente todas as músicas da "rainha do rock" e obedece a todos os seus comandos. Vibra com os fogos que explodem no seu palco e com a fumaça que ela joga na grade. Com a sua roupa que acende. Com o orgulho que ela sente do Pará. Com o grito de "rock doido". Com a solteira, o viado e o pitbull. E, claro, com o endoida.

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E quando Vivi chama Gaby Amarantos (que celebra "finalmente" poder cantar com a amiga) para apresentar o seu célebre tecnobrega vencedor do Grammy, o Psica pôde encerrar seus palcos com a certeza de que cumpriu o que se propôs: mostrar a "história da mulher plantada e germinada em terra preta". Agora "partiu aparelhagem". Só restava à galera se esbaldar com o brega clássico do Carabao e se conformar com o fato de que a segunda-feira chegaria.

* Viagem a convite do Festival Psica

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