Luciana Bugni

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Opinião

Xanddy, Daniela, Ivete... só axé da Bahia está livre do etarismo no Brasil

Xanddy, aos 44 anos, dá uma leve puxada para cima na bermuda que está usando enquanto diz no microfone: "Mandei meu cavaco chorar". Ele está se preparando para rebolar e não vai ser uma bermudinha neon que atrapalhará seus movimentos até o chão. E desce o rapaz com uma combinação de glúteos e coxas que fazem inveja para a mocidade, enquanto o cavaco chora. Já tentou?

No trio de quinta-feira (8), Xanddy chamou Dona Carmélia, uma senhora que requebrava na pipoca de Salvador para subir no trio. "Quase 80 anos", disse o cantor. E lá foi Carmélia, até o chão. Carla Perez, mulher de Xanddy, tem 46 anos e fica ali em cima do trio chorando o cavaco, quebrando e o que mais vier. Ninguém envelhece no axé.

No trio ao lado, está Daniela Mercury, 58, coroada rainha do Carnaval desde a década de 1990 e reinando absoluta. Tem um corpo de ballet jovem no trio, claro que tem, mas a mulher está pulando da Barra até Ondina sem parar por horas seguidas. Trabalhei no Carnaval de Daniela por três anos seguidos quando não tinha nem 30 anos e já não segurava a onda de acompanhar o ritmo.

Ivete Sangalo, 51, literalmente voou sobre um Maracanã lotado no show em que comemorou 30 anos de carreira. Tem ritmo de dança, de cantar, de fazer piada. A cena dela mentindo para Gioh Ewbank que já tinha pegado Bruno Gagliasso é deliciosa. Tem energia, vai e volta. Para tudo, tem visão periférica, olha para baixo, zoa um fã, socorre outro. 50+ e contando. A gente quer é copiar.

E aí entra Bell Marques, 71, mais jovem que todos nós. Uma vida em cima do trio deve funcionar que é uma beleza. O Carnaval baiano deveria ser estudado como fonte da juventude. Desde os anos 1980, ainda à frente do Chiclete, Bell hoje tem a mesma cara e pique. Segura na unha shows frequentes de mais de quatro horas. Uma vez, ainda na universidade, com 20 anos, eu cansei depois de 40 minutos. Oba, oba, oba!

Durval Lélys, 66, não fica atrás e comanda a bagunça pulando sem parar, tocando sua guitarra, inspirando diversas gerações. O axé baiano tradicional é uma instituição. E temos que falar de Baby do Brasil, 71, mil loucuras no currículo, um nome novo, e agora, como ela se gaba de dizer, vive na Matrix de Jesus. Nada afetou sua voz, que continua impecável.

Já vi Hebe, com mais de 80, cantando em cima de um trio, fazendo dueto com Gilberto Gil. Idosos? Sim. Jovens também.

A energia do trio elétrico, os ares de Salvador em fevereiro, e todo o borogodó que vem daquela terra devem contribuir, é claro. Em cima de um trio elétrico deve ter um tipo de imunização, em que não há jovenzinho que ouse chamar alguém de velho. Ali, naquele tipo de santuário, não há nada que o artista não seja capaz de fazer e repetir por décadas e décadas. Que sorte a nossa ser brasileiro.

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Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.

** Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do UOL

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