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Diretor da Balenciaga perde prêmio após anúncio com menção a abuso infantil

Demna Gvsalia, diretor criativo da Balenciaga - Laura Stevens/The Times
Demna Gvsalia, diretor criativo da Balenciaga
Imagem: Laura Stevens/The Times

De Nossa

29/11/2022 12h21

Demna Gvasalia, diretor criativo da Balenciaga, teve a entrega de um prêmio que o classificava como uma das principais vozes da moda mundial cancelada e o título retirado após o escândalo de abuso infantil envolvendo duas campanhas da grife espanhola na última semana.

O estilista da Geórgia receberia nesta terça (29) o Global Voices Award 2022 da plataforma de moda Business of Fashion (BoF), publicação especializada na indústria. Em uma publicação no Instagram nesta segunda (28), a companhia anunciou a medida, mas reforçou seu convite para que a empresa comparecesse ao evento para oferecer explicações ao público.

"Desde sua concepção, o [evento] 'BoF Voices' tem sido uma plataforma para importantes, honestas e, às vezes, desconfortáveis conversas que ajudaram a abordar de frente problemas-chave na indústria de moda. No início do ano, convidamos o diretor criativo da Balenciaga, Demna, ao 'BoF Voices' para receber nosso Global Voices Awards de 2022.

No BoF, nós mantemos a segurança de crianças como a mais alta prioridade. E, como muitos, estamos procurando a verdade sobre como crianças apareceram em uma campanha com produtos inspirados [pelo universo do] BDSM nas imagens da recente campanha da Balenciaga, que são totalmente inconsistentes com os nossos valores. Como resultado, decidimos não entregar a Demna o Global Voices Award este ano", justificou a publicação.

A grife, ainda segundo o BoF, não topou participar do evento para prestar maiores esclarecimentos.

"Contudo, nós pedimos à liderança da Balenciaga que viesse ao 'Voices' para se responsabilizar por lançar estas imagens e oferecer uma explicação. Eles rejeitaram nosso convite para falar desta vez, mas o BoF continua aberto para ter esta importante conversa", conclui o texto.

Entenda o caso

Afeita a polêmicas de cunho fashion, a grife espanhola Balenciaga se viu envolvida em acusações mais graves de apologia ao abuso infantil na última semana. Elas surgiram graças a uma campanha que traz crianças abraçadas a ursinhos de pelúcia com apetrechos associados ao universo BDSM (prática sexual que envolve bondage, disciplina, dominação e submissão, sadismo e masoquismo) e semblante machucado.

Inspirado pela série fotográfica 'Toy Story' de Gabriele Galimberti — profissional que clicou as imagens — e que envolve crianças registradas ao lado de seus brinquedos favoritos, o ursinho em questão é, na verdade, um modelo de bolsa de pelúcia desfilado pela grife na Semana de Moda de Paris, em outubro, como parte da sua coleção de Primavera/Verão 2023.

No evento, os acessórios eram trazidos por adultos, que os arrastavam pela lama que era parte da passarela criada, em mais um cenário de destruição artificial promovido pela grife que frequentemente põe em xeque as fronteiras do belo e desejável na moda.

A polêmica entorno da campanha se agravou ainda quando influenciadores identificaram documentos de um processo de 2008 da Suprema Corte dos EUA — que garante que o direito à liberdade de expressão não se aplica a casos de pornografia infantil — na composição de uma das imagens divulgadas no site da marca, acompanhada apenas uma bolsa e não os menores. Todas já foram retiradas do ar.

Documentos exibidos em ensaio da grife Balenciaga - Reprodução/ Twitter - Reprodução/ Twitter
Documentos exibidos em ensaio da grife Balenciaga, em detalhe
Imagem: Reprodução/ Twitter

Apesar de esta última foto em questão não fazer parte do mesmo ensaio que traz as crianças com as bolsas de pelúcia, elas estavam dispostas juntas no site da marca. E, por isso, para parte de seu público nas redes sociais, além de grandes nomes da indústria, a Balenciaga foi longe demais desta vez.

Desde então, a marca já se desculpou publicamente duas vezes e prometeu adotar medidas para prevenir incidentes semelhantes, além de entrar na Justiça de Nova York contra parte da equipe de produção da segunda campanha, envolvendo a bolsa com o documento. Kim Kardashian, uma das principais parceiras da grife, anunciou no domingo (27) que está reavaliando se seguirá trabalhando com a casa de moda.

Fotógrafo processa veículos de imprensa

Gabriele Galimberti, o fotógrafo por trás da primeira campanha, aquela com os ursinhos 'sadomasoquistas', já havia vindo a público nos últimos dias para denunciar mensagens de ódio e ameaças de morte contra ele, classificado como pedófilo em ataques em suas redes sociais.

Em seu depoimento publicado no Instagram, ele garantiu que a responsabilidade criativa por trás das imagens era da Balenciaga e que ele apenas fez os registros conforme as instruções recebidas — a alegada falta de diálogo criativo surpreendeu experts da indústria, já que os profissionais costumam colaborar com as produções das marcas, mesmo em ensaios comerciais.

No entanto, ao jornal especializado WWD, Galimberti lembrou que ele não é um fotógrafo de moda — este foi seu primeiro trabalho neste meio —, reiterou que não interferiu nas imagens montadas pela grife e, sobretudo, não quer ser rotulado como pedófilo.

"Essa onda de m*rda tem que parar agora. Já tem uma semana que estou sob ataque, mas não sou responsável por nada. Eu realmente espero que este escândalo com a Balenciaga não destrua minha carreira em fotografia documental. Já perdi alguns trabalhos que estavam marcados para as próximas semanas", disse o colaborador frequente da revista National Geographic.

Ele ainda disse que alguns veículos de imprensa escreveram "coisas completamente falsas [sobre ele] sem mesmo fazer uma ligação telefônica" e que fotografias dele foram incluídas em matérias sobre o caso.

"Fox News, Newsweek e The Daily Mail escreveram coisas horríveis a meu respeito. Agora, com meus advogados, estou os processando. Eles saltaram em cima da história e escreveram sem checar se era verdade ou não. Como jornalista, eu acho que isso é terrível. Eles estão realmente destruindo a minha vida".

Porta-vozes dos três veículos não se pronunciaram ao WWD sobre o caso.

Ex-estilista da Balenciaga 'alfineta'

Nicolas Ghesquière, diretor criativo da grife antes de Demna e atual designer da Louis Vuitton, fez um desabafo na quinta (24) a respeito da sua experiência com o grupo Kering — dono da Balenciaga — em um post nos Stories do Instagram já apagado.

"Quando deixei a Kering em 2012, me senti desconectado e machucado pelos seus valores e pela sua desonestidade", escreveu o estilista aos seus 950 mil seguidores.

Ele não é o único famoso que lamentou o posicionamento da marca. Também nos Stories, Gkay disse que "fazia das palavras da Kim" as suas. Ela ainda voltou a esclarecer sua opinião no Twitter horas depois.