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Bruxinha e lagarta: medalhista olímpica Bia Ferreira atuou também no teatro

Bia Ferreira, medalhista olímpica no boxe, como bruxinha em peça infantil - Arquivo pessoal
Bia Ferreira, medalhista olímpica no boxe, como bruxinha em peça infantil Imagem: Arquivo pessoal

Roberto Salim

Colaboração para o UOL, em São Paulo

08/08/2021 02h17

Alguém pode imaginar Beatriz Ferreira em outro palco que não seja um ringue? Alguma pessoa pode pensar em vê-la fazendo o papel de uma personagem que não esteja calçando luvas? Ou espera vê-la diante de um público que não espere o bailado do boxe em cima do tablado? Sim, existe uma pessoa que vê a medalhista olímpica Bia Ferreira, prata nos Jogos de Tóquio, como uma atriz em potencial: a sua própria mãe, a atriz, professora, fiscal, cozinheira e empreendedora Suzana Soares.

"Podem acreditar, a Bia já fez muitas peças infantis ao meu lado. Já fez uma lagartinha, já foi bruxa, mas gostava mesmo é do boxe", conta a mãe da medalhista olímpica.

Quando os pais de Bia se separaram, ela preferiu seguir um sonho que já vinha desde pequena e ficou com o pai Raimundo Ferreira em Juiz de Fora dedicando-se ao pugilismo, enquanto a mãe retornava a Salvador junto com Samira, a filha mais nova.

"Eu tive a Bia com 16 anos e na época eu acompanhava o Raimundo em todas as lutas que ele fazia. E às vezes nos treinamentos também, tanto que acabei fazendo os treinos de boxe, que são ótimos exercícios para a manutenção do físico, para condicionar o corpo. Como fazia teatro, era um ótimo treinamento. Até hoje bato perinha e uso luvas para treinar aqui em casa mesmo. E uma vez quase fui violentada e vi também que poderia usar o boxe para me defender", diz Suzana.

E foi nesse meio, entre a cultura e o esporte, que a menina Bia veio ao mundo. "Quando ela estava para nascer, conseguimos comprar uma casa no bairro de Nova Brasília e o Raimundo, que todo mundo no boxe chamava de Sergipe, fez uma academiazinha na garagem. A gente não ganhava nada, mas como somos dois corações moles, eu dava aula de teatro para as crianças e ele dava boxe".

Bia nasceu e a mãe percebeu que havia algo muito forte em relação ao esporte. "Desde quando a Bia nasceu eu sabia que ela iria para o boxe. Se ela estivesse chorando, era só descer até a academia da garagem e ela, escutando aquele pá-pá-pá dos socos, parava de chorar. Ela era bebê de fralda ainda e ficava com os olhos arregalados vendo aquela movimentação até que dormia".

Uma vez, Suzana se descuidou. "E ela foi engatinhando, descendo a escada até a academia. Ela tinha uma ligação inacreditável com aquela agitação". Logo a mãe viu que o seu gosto pelo boxe e a profissão do pai tinham passado integralmente para a filha.

"Ela era peralta e sempre andava com a luva nas mãos. Podia estar chovendo, que ela acompanhava o pai nas corridas. Não queria saber de boneca, nem de ursinho. Mas quando me acompanhava aos ensaios no teatro, também prestava atenção em tudo. E uma vez, uma menina desistiu de fazer uma peça e ela se prontificou a substituí-la. Ela sabia as falas e toda a marcação", diz Suzana.

A peça se chamava "Pétalas Mágicas". "Ela fez o papel de uma lagartinha, que contracenava com uma flor triste. No fim a flor virava um lindo girassol e ela uma bela borboleta".

Pelos cálculos de Suzana, a filha participou de umas dez peças. Até bruxinha a menina Bia interpretou. "Isso me ajuda muito", afirmou a atleta quando foi questionada sobre seus momentos de descontração no ringue depois das lutas. A medalhista olímpica costuma comemorar com danças suas vitórias e também mostra eloquência em entrevistas à imprensa.

Ela afirma que essa desenvoltura dentro e fora do ringue é fruto do apoio que teve se de seus pais. "Agradei os dois, minha mãe e meu pai. Eu precisei um pouco do teatro pra poder apresentar esse boxe pra vocês", afirmou a atleta.

Atualmente, Suzana se dedica aos ensaios de uma mostra de Cultura Popular. Por conta da pandemia, a mostra será online e está prevista para estrear em setembro. Ela também tem o projeto social EITA (Educação Integração Teatro e Arte), que trabalha diretamente com as comunidades carentes. E como também é uma autêntica lutadora como a filha, Suzana tem um carrinho de lanches e cachorro-quente. "Mas por conta da pandemia, eu estou parada, porque a Bia não quer que eu saia de casa enquanto tudo isso não passar".

E foi na casa do bairro de São Cristovão, pertinho de Itapuã, que Suzana assistiu ajoelhada diante da televisão a grande exibição de sua menina, no papel de medalhista olímpica.