Gralha abatida: pentacampeão paranaense corre risco de fechar as portas

A tragédia se concretizou com muito drama, com um roteiro que poucos inimigos conseguiriam imaginar. Depois de um início ruim, com cinco empates e uma derrota, o Paraná precisava vencer as três últimas partidas e ainda depender de alguns resultados para chegar ao quadrangular que definiria o acesso para a primeira divisão do campeonato paranaense.

Sim, o pentacampeão de 93 a 97 está na segunda divisão e em má situação. Mas venceu o Iguaçu por 1 x 0, fora de casa, fez 3 x 0 no Araucária no Durival Britto e foi para o tudo ou nada contra o Patriotas, então líder, também em casa. Começou perdendo, mas virou ainda no primeiro tempo. E jogou toda a segunda etapa garantindo o resultado.

Até que, aos 50 minutos, um carrinho sem necessidade, uma falta, uma bola cobrada na área, o chute de Castanha e, no dia 25 de junho, a consumação de mais um insucesso de um clube que acumula fracassos seguidos nos últimos cinco anos e corre risco de extinção.

Foi em 1989, com a fusão do Colorado e Pinheiros. O Colorado, ele também uma fusão Britânia, Palestra e Ferroviário, vinha com o futebol e o Pinheiros, que nasceu com a união de Savoia e Água Verde, com um quadro associativo muito forte. "O Clube mais rico do Paraná", assim era chamado. Foi campeão paranaense em 1991 e venceu a Série B do Brasileiro no ano seguinte. Em seguida, veio o pentacampeonato paranaense.

Tudo caminhava perfeitamente. O jornalista Carneiro Neto escreveu o livro "O vôo certo", uma referência à Gralha, símbolo do clube, contando a história de sucesso do Paraná. O ano era 1996 e o nome parecia corretíssimo.

"Abateram a asa da Gralha e o Paraná hoje vive um voo cego", diz Carneiro, que aponta causas comuns em muitos outros casos para a decadência: "As más gestões se sucederam e o clube foi dilapidado, abandonado".

O clube mais rico do Paraná hoje é um devedor que não tem como pagar dívidas, conta Carneiro:

"O Paraná tinha muitas sedes que pertenciam aos clubes que existiam antes da fusão. Já perdeu uma delas, do Jardim Guabirotuba, por dívida com o INSS. Ora, Delfim Neto, o economista, já dizia que esse tipo de dívida nunca se paga. A sede da Avenida Presidente Kennedy está no Judiciário, estão perdendo tudo. Quando perderem o estádio Durival de Brito, o clube acaba de vez".

Os tempos de glória tiveram em Carlinhos Neves, preparador físico de tanto sucesso, uma testemunha ocular, um ativo participante.

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"Eu fui o primeiro contratado do Paraná. Trabalhava no Pinheiros, houve a fusão e assumi o cargo. O primeiro treinador seria Edu Coimbra, o irmão de Zico, que até havia dirigido a seleção brasileira, mas não deu certo. Então, eu sugeri Rubens Minelli. Foi feito um contato, mas o pessoal do Paraná não tinha certeza se ele aceitaria. Não só aceitou, como trouxe o Valdir de Moraes. Foi um início grandioso", lembrou.

O segundo treinador foi Otacílio Gonçalves, que havia sido auxiliar de Falcão na seleção brasileira. O Paraná jogava em seu campo, o Durival de Brito, e transformou o campo do Pinheiros em um centro de treinamentos. Carlinhos Neves foi para o Palmeiras, onde ganhou o bicampeonato brasileiro. Um dia, antes do jogo decisivo que concretizou o bicampeonato, recebeu uma visita.

"Era o pessoal do Paraná. Eles disseram que estavam procurando um preparador físico. Indiquei um nome, ia falar mais outros e fui interrompido. Eles queriam me contratar. E eu sempre brincava quando alguém dizia que eu deveria ser treinador. Respondia que não queria ser treinador, queria ganhar como um treinador. E a oferta era assim. Um contrato de quatro anos para montar uma estrutura muito boa. Aceitei e levei comigo fisiologistas e consultores. Depois, veio o Luxemburgo, imagine só. E Lazaroni e Antonio Lopes", recordou.

No campeonato paranaense que terminou o Paraná Clube ostentava um patrocínio da Evidence 5000, casa de acompanhantes de Curitiba. Uma maneira de Marcelo Domingues ajudar seu clube de coração.

"Foi um contrato de R$ 300 mil por seis meses. Paguei R$ 50 mil por mês para ajudar o clube. Mas deixaram um empresário montar o time e não deu certo. O empresário só leva jogador dele, se for bem, ele lucra, se for mal, o clube é que perde", afirmou.

Marcelo se apaixonou pelo Paraná desde a fundação. O clube preencheu um espaço em sua vida e ele sonha em ser presidente: "Na verdade, eu sou corintiano e não tinha para quem torcer no Paraná. Quando surgiu o novo clube eu virei torcedor fanático. Sempre sonhei ajudar o Corinthians e o Paraná, mas não tinha condições financeiras. Aliás, ainda não tenho. Não sou eu que fiquei rico, é o Paraná que ficou pobre demais".

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"Vou ser como o Mário Celso Petraglia, do Athetico. Ele é que manda e acabou. No Paraná, tem conselho disso, conselho daquilo e o clube não anda. Sou empresário de sucesso. Comecei em 2013, com uma chácara de 30 m2 e três meninas e hoje são 500 garotas e 2500 m2", afirmou.

O que ele trata como negócio de sucesso causou muita revolta entre um grupo de torcedoras do Paraná, as Gralhas da Vila. Elas fizeram nota de repúdio, destacando que o Brasil é o primeiro lugar da América Latina em exploração de mulheres, que o turismo sexual estimula exploração sexual infantil e que, no mundo, apenas a Tailândia supera o Brasil no ranking de exploração sexual de crianças e adolescentes.

Em junho do ano passado, uma luz no fim do túnel apareceu para o Paraná. Depois de muita negociação, foi aprovado pelos credores do clube um plano de recuperação judicial (RJ), para a dívida de R$ 120 milhões. O plano prevê descontos de até 50% em algumas dívidas.

Agora, como todo clube em situação precária, a palavra SAF surge como uma panaceia, capaz de sanar todos os males. Há um problema grave, porém. O Paraná pretendia colocar suas sedes na Presidente Kennedy, Vila Olímpica e Boqueirão como garantia de negócios, mas elas foram doadas aos clubes que antecederam às fusões que resultaram o Paraná, como fins de lazer e recreação. Não podem ser envolvidas neste tipo de acordo.

O presidente Rubens Ferreira foi procurado e informou que dará entrevistas apenas quando houver a homologação do acordo. Acordo que pode impedir que se concretize o grito das torcidas de Coritiba e Athetico em dias de clássico - quando havia clássicos - é claro: "Arrá, o Paraná vai acabar".

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