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Guerra de versões: o que Daniel Alves alega e como defesa tenta inocentá-lo

Colaboração para o UOL, em São Paulo

24/05/2023 04h00Atualizada em 24/05/2023 09h00

Preso preventivamente desde 20 de janeiro acusado de estuprar uma jovem de 23 anos na balada Sutton, em Barcelona, Daniel Alves entrou em contradições em depoimentos à Justiça sobre o ocorrido no dia do suposto crime, em 30 de dezembro de 2022, ao mesmo tempo em que traça uma estratégia para tentar se livrar da prisão.

O que o jogador já falou?

Daniel Alves prestou dois depoimentos à Justiça espanhola: o primeiro em 20 de janeiro e o segundo em 17 de abril. No intervalo entre um depoimento e outro, o atleta mudou pontos importantes do seu relato para os fatos que teriam acontecido em 30 de dezembro de 2022.

Inicialmente, o jogador disse ter ficado menos de uma hora na balada e negou ter convidado a suposta vítima para perto dele e do amigo Bruno Brasil na área VIP. Posteriormente, o atleta admitiu ter passado mais tempo no clube e que ele e o amigo fizeram um gesto para que um garçom convidasse três mulheres, entre elas a que o acusa de estupro, para irem até a mesa deles.

Já na área VIP, Alves se contradisse em relação à interação entre ele e a vítima na forma como dançavam e interagiam entre si. No primeiro depoimento, ele negou três vezes que tenha convidado a mulher para ir ao banheiro. No segundo, alegou que havia uma "atração sexual" e propôs que eles levassem "toda aquela atração para o banheiro". O jogador diz que ela teria aceitado.

No depoimento de janeiro, o atleta alegou que a mulher entrou no lavabo quando ele já estava dentro, ele perguntou o que ela fazia ali e saiu do recinto. No segundo, porém, ele contou que convidou a jovem para ir ao banheiro. Ela teria entrado no lavabo primeiro, e ele entrou em seguida.

Já dentro do banheiro, Daniel, na primeira versão, negou que houve relação sexual. Porém, ainda no primeiro depoimento, o lateral-direito falou que a jovem teria feito sexo oral nele enquanto ele defecava. No segundo depoimento, o lateral-direito afirmou que houve sexo com penetração, mas disse ter sido consensual.

Segundo o lateral-direito disse à Justiça em 17 de abril, primeiro a jovem praticou sexo oral nele e depois ele a penetrou na vagina. Na ocasião, ele estava sentado no vaso sanitário e ela por cima.

À Justiça, Daniel Alves também apresentou versões diferentes para o tempo no banheiro: primeiro, alegou que foram "aproximadamente três, quatro minutos". Depois, o advogado dele, Cristóbal Martell, fala em cerca de 15 minutos que eles passaram dentro do lavabo.

Em ambos os depoimentos, apesar das contradições, Daniel Alves negou que tenha estuprado a jovem. O atleta falou que foi "simplesmente cúmplice dos desejos que ela tinha ou dos que eu tinha", mas não especificou quais "desejos" são esses.

O lateral-direito justificou as versões diferentes para o fato de querer proteger seu casamento com Joana Sanza modelo espanhola se separou do atleta após o escândalo.

A acusação alega que os depoimentos do lateral-direito contrariam as evidências coletadas pela perícia no banheiro da área VIP da discoteca, onde teria acontecido a agressão sexual.

daniel alves - Jose Breton/Pics Action/NurPhoto via Getty Images - Jose Breton/Pics Action/NurPhoto via Getty Images
Daniel Alves
Imagem: Jose Breton/Pics Action/NurPhoto via Getty Images

O que diz a suposta vítima?

Em depoimento à Justiça, a jovem afirmou que foi voluntariamente ao banheiro, mas que lá foi agredida física e sexualmente por Daniel Alves. Ela acusa o jogador de ter impedido sua saída do lavabo e de tê-la empurrado contra a pia do banheiro.

Áudios divulgados pela imprensa espanhola mostraram detalhes da conversa entre a jovem e um policial, após o ocorrido. Ela contou ao agente que trocou "alguns beijos" com Alves dentro do banheiro, mas que ao tentar sair, "ele falou que não e fechou o trinco [da porta]".

Nesse momento, Alves teria lhe dito "coisas desagradáveis", a chamado de "putinha' e começado a agredi-la. "Ele jogou minha bolsa no chão, me agarrou pela roupa e me bateu".

Ela também diz que não quer que o caso tenha "publicidade" porque "ninguém vai acreditar em mim porque verão nas câmeras que entrei voluntariamente no banheiro".

A polícia foi chamada ao local pelo gerente da boate, pouco tempo depois do suposto estupro. Uma ambulância também foi acionada.

Da Sutton, a jovem foi encaminhada ao Hospital Clinic de Barcelona, onde um exame constatou um machucado em seu joelho esquerdo, além de um hematoma na região. Os ferimentos tornaram-se peças fundamentais no processo.

Os vídeos da discoteca, analisados pelo UOL, mostram que, antes de entrar no banheiro, a mulher dançava sem qualquer restrição de mobilidade. Porém, no corredor de saída da discoteca, depois do ocorrido no lavabo, ela apresentava dificuldade para caminhar.

A denunciante mostrou a lesão para a prima ainda dentro da boate. A prima a abraçou por cerca de um minuto, até a chegada de um segurança da boate.

Quando o funcionário pergunta o motivo do choro da mulher, ela volta a mostrar o machucado no joelho esquerdo, enquanto explica sua versão do que aconteceu no banheiro.

Nos exames de corpo de delito, realizados naquela mesma noite, o machucado no joelho foi fotografado. Ele foi tratado como possível lesão decorrente das ações ocorridas no banheiro da área VIP da Sutton. Em seu depoimento, a mulher de 23 anos afirmou que foi atirada contra o solo por Daniel Alves.

Daniel Alves negou repetidamente que soubesse da lesão no joelho da mulher. Ele afirma que não causou qualquer ferimento na denunciante. A defesa do atleta se refere ao machucado como "escoriação" e sugeriu que pode ter sido provocado quando a jovem se ajoelhou para o sexo oral.

daniel alves - Tnani Badreddine/DeFodi Images via Getty Images - Tnani Badreddine/DeFodi Images via Getty Images
Daniel Alves
Imagem: Tnani Badreddine/DeFodi Images via Getty Images

Qual a estratégia da defesa de Daniel Alves?

O advogado do jogador, Cristóbal Martell, refuta a acusação de estupro e diz que o sexo foi "consensual". Ele alega que as imagens das câmeras de segurança da boate mostram que os dois entraram no banheiro espontaneamente.

Para a defesa, a "história de medo e pavor não condiz com o que se pode ver nas imagens do momento anterior na mesa VIP, onde já foi demonstrado que houve cortejo sexual".

Outra base da defesa são as mensagens que Bruno Brasil trocou com a prima da vítima noites depois do ocorrido. Os dois estavam presentes na boate na noite em que a vítima acusa Daniel Alves de tê-la estuprado.

Para a equipe de Daniel, as mensagens "refletem normalidade". Dizem ainda que "no momento da conversa, a prima já sabia o que havia acontecido no banheiro". A interpretação feita pelo lado da vítima é de que "o que o chef brasileiro fez foi entrar em contato com eles para estabelecer um relacionamento e identificar se em algum momento pretendiam fazer uma reclamação"

A Justiça espanhola permitiu que uma psicóloga contratada pelo jogador examinasse a suposta vítima como uma forma de garantir "veracidade, objetividade e imparcialidade".

Outra parte da estratégia dos advogados inclui a ex-esposa do jogador, Dinorah Santos, e os dois filhos deles. A ideia é que os três se mudem para Barcelona para demonstrar que Alves tem vínculo com o país e não pretende fugir.

Essa estratégia é para obter a liberdade provisória do atleta. Entretanto, a Justiça da Espanha já negou duas vezes o pedido da defesa, que recentemente fez a terceira tentativa, ainda sem resposta.

Atual situação

Atualmente, Daniel Alves está preso no complexo penitenciário Brians 2. A única visita frequente que ele recebe na cadeia é de seu amigo Bruno Brasil, que estava com ele na boate Sutton e que manteve contato com a prima da suposta vítima após o ocorrido.

Se condenado, Daniel Alves pode cumprir até 12 anos de prisão. Caso seja comprovado que houve "violência de extrema gravidade" durante a agressão sexual, a pena pode subir para até 15 anos de reclusão.

O julgamento não tem data para acontecer.

O UOL procurou a assessoria de Daniel Alves com questionamentos sobre as contradições do caso, mas não obteve retorno. O espaço será atualizado caso haja um posicionamento.