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Grupo LGBTQIA+ vai à Justiça para questionar falta do "24" na Seleção

Thiago Braga

Colaboração para o UOL, de São Paulo

28/06/2021 14h01

Na esteira da revelação do UOL de que a seleção brasileira é a única equipe nacional na Copa América a não ter nenhum jogador inscrito na competição com a camisa 24, o Grupo Arco Iris de Conscientização Homossexual ajuizou ação na 10ª Vara Cível do Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro, contra a CBF, questionado a entidade sobre a ausência do número entre os convocados por Tite.

"Esta postura que aparenta ser mesmo uma política discriminatória está presente no futebol brasileiro e impede e dificulta que jogadores possam exercer livremente os seus direitos e acabam por não assumirem as suas orientações sexuais por medo de represálias e de perdas de oportunidades na carreira", diz trecho da ação.

Assim, o grupo pede que a Justiça determine que a CBF responda, em até 48 horas após receber a intimação, aos seguintes questionamentos:

A não inclusão do número 24 no uniforme oficial nas competições constitui uma política deliberada da interpelada?;

Em caso negativo, qual o motivo da não inclusão do número 24 no uniforme oficial da interpelada?;

Qual o departamento dentro da interpelada, que é responsável pela deliberação dos números no uniforme oficial da seleção?;

Quais as pessoas e funcionários da interpelada, que integram este departamento que delibera sobre a definição de números no uniforme oficial?;

Existe alguma orientação da FIFA ou da CONMEBOL sobre o registro de jogadores com o número 24 na camisa?

"O Brasil contém altas taxas de violência contra a população LGBTI+, sendo este cenário alarmante com relação às violações de direitos dessa população. A Comissão Interamericana de Direitos Humanos, no Relatório Sobre a Situação de Direitos Humanos no Brasil de 2021 afirmou que o Brasil possui um grande desafio quanto à defesa e promoção dos direitos dessa população", fala outro trecho do documento, jogando luz nos problemas enfrentados pela comunidade LGBT.

A informação da ação do grupo contra a CBF foi publicada inicialmente pelo GE e confirmada pelo UOL.

Esta segunda-feira (28), inclusive marca o Dia Internacional do Orgulho Gay. Em suas redes sociais, a CBF publicou que "o futebol brasileiro não tem espaço para preconceito! A CBF apoia a luta contra a homofobia e a transfobia. Somos Todos Iguais! 28 de junho: Dia Internacional do Orgulho LGBTQIA+".

Na seleção brasileira, a numeração pula da camisa número 23 do goleiro Ederson para a 25 do volante Douglas Luiz. Nos outros nove países que participam do torneio, há um atleta inscrito com a 24 nas costas. A Conmebol não faz imposições sobre a numeração e deixa a critério das delegações

Questionada pelo UOL na semana passada sobre o fato de a seleção não ter um jogador vestindo a camisa 24, a CBF não quis explicar o motivo dessa decisão.

"Os espaços futebolísticos são culturalmente e historicamente homofóbicos. Sempre foi difícil encontrar manifestações homoafetivas uma vez que o medo é, infelizmente, uma característica inerente à comunidade LGBT+, e ainda mais presente em estádios de futebol. Além disso, diversos relatos de pessoas do segmento LGBT+ demonstram a hostilidade por parte das torcidas nas partidas de futebol", pontua a ação do Grupo Arco Iris de Conscientização Homossexual.

O documento recorre também à determinação do STJD (Superior Tribunal de Justiça Desportiva), que passou a punir clubes cujas torcidas entoam cantos homofóbicos nos estádios.

"Nesse sentido, o posicionamento de clubes e confederações de futebol é primordial no combate à homofobia, visto que desmotiva quem acha que o futebol é um espaço de intolerância onde se pode discriminar livremente. Assim, é inadmissível o retrocesso. A CBF tem papel preponderante neste debate. É dela a responsabilidade de mudar esta cultura dentro do futebol. Quando a CBF se exime de participar, a torcida entende que é permitido, que é aceitável, e o posicionamento faz com que, aos poucos, essa cultura mude", afirma a associação.

O número 24 está historicamente relacionado ao homem gay no Brasil por causa do Jogo do Bicho, que associa a numeração ao veado - animal é usado de forma homofóbica como ofensa à população LGBT+. Por conta disso, o futebol brasileiro já viveu diversos episódios de homofobia. O mais recente deles ocorreu na chegada de Cantillo no Corinthians, quando o então diretor de futebol e hoje presidente, Duílio Monteiro Alves, disse "24 aqui não" no meio da apresentação. Ele usava o número no Júnior Barranquilla. Duilio classificou a própria fala como "brincadeira infeliz". Menos de um mês depois de ser apresentado, Cantillo foi a campo com o 24 nas costas.