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Ex-SPFC recorda conselhos a Neymar e G. Jesus e bronca de Telê por noitada

Macedo, ex-atacante de São Paulo e Santos - Reprodução/Facebook
Macedo, ex-atacante de São Paulo e Santos Imagem: Reprodução/Facebook

Marcello De Vico e Vanderlei Lima

Do UOL, em Santos e São Paulo

30/03/2019 04h00

Campeão de praticamente tudo com a camisa do São Paulo, incluindo Brasileiro (1991), bi da Libertadores (1992/93) e bi mundial (1992/93), Macedo teve a feliz oportunidade de trabalhar com Telê Santana, a quem só não coloca à frente de 'Deus e do pai': "Depois vem ele". O relacionamento entre os dois começou em 1990, quando o atacante - filho de pais pobres e analfabetos - ainda atuava pelo Rio Branco de Americana.

Foram anos de aprendizado com o "Mestre Telê", algo que Macedo pretende seguir passando para a frente.

Em entrevista exclusiva ao UOL Esporte, Macedo 'abusa' das histórias e lições de vida e conta sobre as vezes em que deu conselhos para Neymar e Gabriel Jesus, ambos ainda em início de carreira.

A história com a joia do Santos, clube que também defendeu na sequência da carreira, começou em uma pelada no interior de São Paulo. Neymar, ainda aos 16 anos, antes mesmo de subir para o profissional, foi o grande destaque do jogo, com um golaço de cabeça que chamou a atenção de Macedo - a ponto de ele buscar informações para tentar empresariá-lo.

Ex-Santos, Macedo carrega a bola observado por Giovanni - Reprodução/Facebook - Reprodução/Facebook
Imagem: Reprodução/Facebook
"Eu conheci o Neymar filho em Santa Bárbara D'Oeste, num jogo beneficente. Ele tinha 16 anos e o Diego Tardelli me convidou para este jogo. Aí o Adoniran, que jogava no Santos, conhecia o Neymar e levou ele, e esse menino fez um golaço de cabeça. Eu parei e falei: 'Nossa, com essa cabeçada o menino é diferenciado, hein?', e cheguei no Adoniran e falei: 'Quem é esse jogador? Eu preciso ganhar dinheiro com esse menino, fui bem franco'. E o Adoniran falou: 'É o Neymar', mas ele ainda não tinha jogado no profissional, só na base", recordou Macedo.

Neymar não demorou para explodir no Santos depois que subiu para o profissional. Já como fã da joia, o ex-jogador do São Paulo convidou o irmão e resolveu fazer uma visita ao CT para conhecer o craque de perto e tietá-lo. Começou então uma amizade não só com Neymar, mas também com o pai dele, que até hoje é seu amigo e foi pessoa importante quando Macedo enfrentou problemas financeiros. E, aproveitando o seu passado no futebol, o ex-atacante são-paulino deu conselhos ao ainda jovem atacante santista.

"Começou o outro ano e o Neymar começou a se destacar, a fazer gol no profissional, e eu fui no CT em Santos, queria tirar foto com ele, conhecer, levar meu irmão... E quando cheguei lá conheci o pai do Neymar, me apresentei, e ele tirou foto comigo, com o meu irmão, e o Neymar filho me abraçou e me tratou super bem. Aí ele começou a se destacar e lembro que dei uns conselhos para ele. Lembra quando ele estava brigando muito aqui? Os caras davam pancadas nele e ele ficava brigando com juiz, com fulano, aí fui conversar com ele", contou.

"'Neymar, quando eu jogava no Santos, eu era um jogador do seu estilo, muito habilidoso, e os caras me davam muita porrada, mas tem muito jogador que faz isso para provocar, para deixar você nervoso, para você ser expulso', e aí eu falei do Telê: 'Na época que eu jogava, o Telê falava para jogar bola'. Só joga bola. Se você ficar fazendo isso, vai atrapalhar a sua carreira, então não faz mais isso, não. Aí depois o Neymar parou de brigar, jogou, jogou e foi embora do país, para o Barcelona. Depois o pai do Neymar me agradeceu e pegou uma amizade comigo. Aí passou o contato dele e depois me ajudou", recordou.

Conselhos a Gabriel Jesus no Palmeiras

A amizade com Gabriel Jesus, hoje no Manchester City, veio através do filho, Lucas Macedo, jogador de futebol assim como o pai. Certo dia, Lucas, então na base do Palmeiras, ofereceu carona a um certo companheiro de time que iria com ele cortar o cabelo. Papo vai, papo vem, e Gabriel Jesus revelou ao pai do amigo - já devidamente apresentado - uma situação para deixar o Alviverde, quando já era destaque na base e tinha acabado de subir para o profissional.

Macedo (centro), ex-jogador do São Paulo, acompanhado dos filhos - Reprodução/Facebook - Reprodução/Facebook
Imagem: Reprodução/Facebook
"Ele pediu para o meu filho uma carona para levá-lo na Rodoviária do Tietê, e eu dei, isso na época do sub-17, em que ele se destacou. Ele foi conversando comigo e dei uns conselhos para ele. Estava em dúvida, tinham duas situações para ele, e falei para ele ficar no Palmeiras. Ele fez 30 gols e tinha subido para o profissional, e eu falei: 'Chegou a sua hora, o momento é agora porque você está num momento bom', e ele falou: 'Ok, Macedo, obrigado', e deixei ele na rodoviária. Às vezes meu filho ia na casa dele cortar o cabelo", lembrou.

E se Gabriel Jesus já é um atacante consagrado no cenário internacional, com diversas convocações para a seleção brasileira, Macedo acredita que o filho pode seguir o mesmo caminho. Para o ex-são-paulino, o filho de 21 anos tem potencial para chegar longe.

"Ele tem um talento maravilhoso e creio que logo, logo vai estar jogando na seleção brasileira. É aguardar. Tem o momento certo na hora certa", destacou Macedo, que contou ainda sobre a sólida trajetória que o filho teve nas categorias de base, a começar pelo próprio São Paulo.

"A base dele foi no São Paulo, dos nove aos 11 anos, depois dos 12 aos 14 anos no Santos e dos 14 aos 18 no Palmeiras. O Palmeiras profissionalizou ele com 16 anos, ele jogava junto com o Gabriel Jesus", disse.

"Ele estava jogando no Japão, foi para lá com 20 anos, e ficou um ano e meio. Ele veio agora para o Brasil e assinou um contrato com o Bragantino, de dois anos, e agora parece que vai ter a parceria Red Bull/Bragantino, vamos ver como vai ser, eu não sei como vai ficar", acrescentou.

Fuga da concentração e a descoberta de Telê

Apesar do carinho por Telê Santana, Macedo já sofreu poucas e boas com o ex-técnico. Além do famoso dia em que fez "dreads" no cabelo e logo teve seu novo visual reprovado por Telê, o ex-atacante relembra outra história: a única vez em que tentou escapar da concentração, acompanhado do ex-zagueiro Válber. Não deu certo, e desde esse dia ele nunca mais se arriscou.

"Teve uma vez só que eu e o Válber fomos pegos, aí nunca mais, fiquei sossegado, mas foi assim: Às 23h tinha que estar dormindo, e eu e o Válber saímos, fomos lá para a Rua Augusta. E eu falei: 'Válber, 23h tem que estar dormindo, o Telê depois das 23h não deixa entrar, tem os guardas'. E o Válber falou que ia dar um jeito e tal, e eu falei: 'Válber, você vai inventar', mas fomos na boate. Deu 23h e o Válber não quis ir embora, e eu pensei: 'Nossa, ferrou'", contou.

Macedo, ex-São Paulo, e Mauro Silva, ex-Bragantino - Reprodução/Facebook - Reprodução/Facebook
Imagem: Reprodução/Facebook
"Chegamos 5h da manhã, e aí o Válber falou: 'Desliga o carro'. Ele foi lá e tirou algo do motor e falou: 'Vamos chegar empurrando e falamos que quebrou o carro'. Chegou na portaria e ele falou: 'Ô moço, abre o portão aí, nós estamos cansados, faz mais de uma hora que estamos empurrando o carro', e o porteiro: 'Só com ordem do seu Telê Santana. Vocês querem que eu avise o Telê'? E nós: 'Não, não, não avisa, não [risos]'. Aí o Válber falou para mim: 'Dá partida no carro', e eu dava e o carro não pegava, ele tinha mexido no motor'", acrescentou.

"Resumindo: o Válber não tinha juízo e pulou o portão: 'Eu tenho que treinar e você não quer abrir o portão', e o porteiro anotou o que o Válber fez. Aí deu o horário do almoço, eu desci para almoçar e vi o Muller e os caras todos dando risada, e pensei: 'Putz, o que está acontecendo?', e não vi o Válber. "Vixi, o bicho pegou'. Daqui a pouco eu escuto o grito: 'Macedo, sobe'! Eu lembro que o Telê falou muito para gente: 'Macedo, você está mudado, eu não sei o que aconteceu com você e com o Válber, vocês não podem fazer isso, vocês são atletas profissionais, está faltando responsabilidade'. Falou um monte de coisa, com o diretor do lado, e multou em 30% dos nossos salários, e falou: 'Nunca mais vocês fazem isso', e nunca mais fiz."

VEJA OUTROS TRECHOS DA ENTREVISTA

Infância pobre e o sonho de ser jogador

Eu comecei a jogar bola no Rio Branco de Americana, nas categorias de base, com 12 anos. Eu vim de uma família muito pobre, muito humilde, uma situação muito difícil. Meu pai e minha mãe moravam na Bahia, e eles vieram para o interior de São Paulo. Nasci em Americana e tinha o sonho de ser jogador, só que minha situação era muito difícil. Eu comia banana verde com farofa porque não tinha condições. Meu pai e minha mãe eram analfabetos, e jogador naquela época não ganhava muito dinheiro. Eu tinha dois irmãos que jogavam bola, conhecidos como Pelé e João Macedo, jogavam na A-2 e na A-3, mas não ganhavam muito dinheiro. Aí, eu com 15 anos, fui ajudar minha mãe a cortar cana, colher algodão, e meu pai era furador de poço, fazia buraco para achar aonde tinha água. Só que o sonho de jogar bola ainda estava dentro de mim.

Ida para o São Paulo após pedido de Telê

Eu fui artilheiro do Rio Branco na A-2, com 14 gols, aí o São Paulo ficou sabendo e teve interesse, e fui emprestado para o São Paulo em 1991. E olha como as coisas dão volta. Em 1990, eu fiz a preliminar da decisão do Brasileiro, entre São Paulo e Corinthians, aquele gol do Tupãzinho, era um jogo seleção da A-2 contra a seleção da A-3, lá no Morumbi. Então, depois da preliminar, eu estava vendo o São Paulo perder para o Corinthians, estava na arquibancada assistindo ao jogo. No ano seguinte eu estava sendo campeão paulista contra o Corinthians [risos], jogando dentro do Morumbi. O Telê Santana já sabia que o São Paulo estava me querendo, aí antes da final ele me viu jogar e pediu para me contratar, no dia seguinte.

Geladeira para a mãe foi 1º investimento no futebol

A primeira coisa que eu fiz, ainda no Rio Branco, foi comprar uma geladeira novinha para a minha mãe. A porta era amarrada com arame, caía, e eu via aquilo e falava: 'Pô, quando eu for jogador, a primeira coisa que eu vou fazer é dar uma geladeira zerada para a minha mãe', e quando fiz meu primeiro contrato fiz isso. Depois consegui comprar uma casinha para eles, em Americana.

Melhor momento pelo SP: pênalti na final da Libertadores

Time do São Paulo campeão brasileiro de 1991 - Reprodução/Facebook - Reprodução/Facebook
Imagem: Reprodução/Facebook
Foi a Libertadores de 1992 [segunda final contra o Newell's Old Boys], quando eu entrei e sofri o pênalti. Foi o jogo que mais me marcou mesmo, foi a primeira Libertadores do São Paulo. Faltava 25 minutos para terminar o jogo e a torcida do São Paulo começou a gritar meu nome, tinham 105 mil pessoas no Morumbi, e o Telê me colocou e, na primeira bola que eu peguei, sofri o pênalti. O Telê tirou o Muller, mas só tinha craque no São Paulo, naquela época só tinham jogadores diferenciados, e o Telê estava confuso: 'Quem eu tiro'? Só que aí a torcida começou a gritar Macedo, Macedo, e ele olhou para o banco, me chamou e falou assim: 'Ó, Macedo, o seu forte é a diagonal'. Como os argentinos marcam muito e estavam muito fechados [venceram na Argentina por 1 a 0], ele falou: 'Você fica aberto e entra em diagonal, abre um pouco porque eles estão muito fechados'. Aí fiquei aberto. Quando peguei a bola, fui para dentro e entrei driblando dentro da área, aí foi o pênalti. O Muller não gostou de ter saído, mas todo mundo quer resolver, né? Todo mundo quer o destaque. Mas naquele dia Deus me queria lá e fiquei marcado na história do São Paulo. Mas o Muller é meu padrinho de casamento, meu amigão. No São Paulo não tinha isso. O time era muito unido.

Mestre Telê Santana: "ele quem começou tudo"

Depois de Deus e meu pai, é ele. Foi ele quem começou tudo, ele que acreditou em mim e me ensinou. Aprendi muito com ele, a batida de bola... Eu não batia do jeito que ele queria, mas o dia a dia de São Paulo, treinando, ele ficava comigo. Todo mundo ia almoçar, e ele ficava até meio-dia comigo, treinando, me ensinando mais coisas, e eu queria aprender. 'Estou aqui para aprender, professor'. E fiquei aprendendo com ele.

O cabelo de uma noite, com Telê Santana

Macedo, ex-atacante do São Paulo - Reprodução - Reprodução
Imagem: Reprodução
Eu era do interior de São Paulo, não saía muito, ficava na Barra Funda, dormia lá, só que o Vitor, ex lateral direito, da base do São Paulo, que subiu para o profissional, morava no Morumbi, e ele conhecia muita gente, saía com muitas pessoas, e ele conhecia uma pessoa que mexia com esse negócio de cabelo. E eu vi o Gullit, da seleção da Holanda, na Copa de 94, e achei legal aquele cabelão dele, e falei: 'Vou fazer também'. Conversei com o Vitor e perguntei se ele conhecia alguém, e ele falou: 'Conheço uma mulher que faz, tem um salão de beleza que é de um amigo e ela trabalha para ele e faz'. Só que eu não avisei o Telê que ia fazer isso aí, e o Telê era muito sério. Aí fui lá no salão e lembro que, quando cheguei à noite no CT do São Paulo, o Telê não viu. De manhã acordei para tomar café, o Telê já estava acordado e dei de cara com ele e um diretor do São Paulo. Eu sei que ele estava conversando com o diretor e na hora parou de conversar e falou assim: 'Macedoooo que coisa horrível! Você está mudado, não é mais o mesmo', e no mesmo dia ele marcou uma reunião com o elenco e perguntou para o Cafu do meu cabelo, e o Cafu falou: 'Ah, professor, eu acho que o Macedo está resolvendo, está fazendo gol, então não tem nada a ver o cabelo dele'. Nossa, o Telê falou: 'Nãooooo, quem manda aqui sou eu, ele vai ter que tirar'. Cara, ele fez a reunião e os jogadores foram ao meu favor [risos]. Ele pensou que os caras iam achar ruim. E o Telê continuou: 'Não, quem manda aqui sou eu e ele vai ter que tirar o cabelo. Se ele não tirar esse cabelo, comigo não joga mais'. E o Raí era o capitão e conversou comigo, e eu falei: 'Vou tirar o cabelo'. Aí eu fui e foram três horas para tirar. Dez para colocar e três para tirar. Eu só dormi com o cabelo uma noite. O cabelo de uma noite. Você já viu isso [risos]?

Os amigos Raí e Neymar pai

Amigo verdadeiro liga para saber como você está, e eu destaco o Raí, o Raí é fera. Ele e o pai do Neymar, todos gente boa. Eles me ajudaram financeiramente mesmo, quando você está numa determinada situação e pede uma força e o cara dá. Nada de pedir carro, casa, essas coisas, nada disso, mas uma situação financeira.