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Destaque no Fener, Souza admite seleção longe: sabia que ficaria escondido

MURAD SEZER/REUTERS
Imagem: MURAD SEZER/REUTERS

Bruno Doro

Do UOL, em São Paulo

30/01/2017 04h00

Quando o volante Souza deixou o São Paulo, em 2015, era um dos principais meio-campistas do futebol brasileiro e ouvia, de torcedores e jornalistas, que não estava longe da seleção. Hoje, as coisas mudaram. Pouca gente se lembra do nome do ex-são-paulino quando o técnico Tite elabora as suas listas. A culpa é dele. E ele sabe disso.

“Eu vim sabendo que poderia sumir, que a seleção ficaria muito mais difícil. Mas não me arrependo dessa decisão. Estou vivendo um bom momento e estou muito feliz, mesmo sabendo que é um futebol que não aparece tanto quanto os outros da Europa”, diz o jogador, em entrevista ao UOL Esporte.

Souza, do Fenerbahçe, durante partida contra o Shaktar - Burak Kara/Getty Images - Burak Kara/Getty Images
Imagem: Burak Kara/Getty Images
Souza, hoje, é volante do Fenerbahçe, da Turquia. Titular absoluto do meio-campo do técnico Dick Advocaat, o brasileiro é um dos principais meio-campistas do campeonato local – segundo site de estatísticas WhoScored, é o melhor volante da competição. Isso, porém, não compensa o fator Turquia: o campeonato não passa na TV brasileira e o volante sempre costuma ouvir que, depois que saiu do São Paulo, sumiu:

“Ouço de torcedores que, depois que vim para a Turquia, acabei escondido”, admite. “Admito que existe a dificuldade de informação. Antes, ainda tinha o Taffarel trabalhando aqui [foi treinador de goleiros, auxiliar técnico e treinador interino do Galatasaray]. Hoje, não temos mais nem o Taffarel, já que ele deixou o Galatasaray e é exclusivo seleção. Isso dificulta ainda mais a chegada de informação”.

Para o jogador, a receita é seguir trabalhando na Turquia. E apostando na Liga Europa, em que o Fener está bem: mesmo no grupo do Manchester United, a equipe terminou em primeiro lugar e vai como favorita para o mata-mata. Veja a entrevista completa:

Escondido na Turquia

A gente tem que optar. Eu fiz a escolha de vir para cá. Primeiro, porque queria voltar a jogar na Europa. Depois, pelo lado financeiro. No Brasil, não tinha a condição que tenho aqui. São escolhas. Eu vim sabendo que poderia sumir, que a seleção ficaria muito mais difícil. Mas não me arrependo dessa decisão. Estou vivendo um bom momento e estou muito feliz, mesmo sabendo que é um futebol que não aparece tanto quanto os outros da Europa.

Longe da seleção

Todos que chegaram à seleção são grandes jogadores. Só tenho respeito por eles. É claro que eu sonho em estar entre eles, mas existe a dificuldade do Campeonato Turco, que não passa na TV do Brasil. Mas eu trabalho idealizando o melhor. Eu sempre dou o melhor para que, um dia, possa voltar para a seleção. Espero que o Tite possa ver isso. Mas, se não acontecer, não vai mudar minha forma de agir ou jogar. Não vou ficar frustrado. Vou continuar trabalhando.

Volta ao Brasil longe

Eu sempre deixei claro que não queria voltar ao Brasil no momento. Meu projeto de carreira é diferente. Por isso, meu empresário filtra tudo e nem mesmo me avisa quando chega qualquer sondagem. Para não dizer que não fico sabendo, teve um episódio apenas. Eu sou formado no Vasco e sou amigo do filho do Eurico [Eurico Brandão, vice-presidente do Vasco e filho de Eurico Miranda]. Ele me mandou uma mensagem pelo WhatsApp perguntando como eu estava, comentando os problemas da Turquia e se eu não queria voltar. Eu respondi que não era o momento. Respeito muito o Vasco, mas ainda quero ficar na Europa. Foi apenas uma conversa entre amigos.

Eu tenho contrato de mais dois anos e meio com o Fenerbahçe e pretendo cumpri-lo. Quando isso acontecer, vou estar com 30 anos, mas quero continuar por aqui. Penso em voltar ao Brasil lá pros 33 anos. Quero construir uma carreira aqui fora, criar meus filhos aqui e só depois retornar. Mas ainda quero ter gás e vigor físico para ajudar qualquer equipe que escolher.

Souza, do Fenerbahçe, e Rooney, do Manchester United - Chris McGrath/Getty Images - Chris McGrath/Getty Images
Imagem: Chris McGrath/Getty Images

Futebol brasileiro ou turco?

O futebol turco é muito diferente do brasileiro. No Brasil, a gente valoriza muito a qualidade. É um futebol um pouco mais lento. Aqui, é muita força e contato. O tempo todo. E muita correria. É mais complicado de se jogar, mas às vezes você encontra um time ou outro que joga com a bola no pé. Agora, se você perguntar qual futebol é melhor, eu acho que tem dois lados. O Campeonato Brasileiro é mais competitivo. Não vou dizer que é melhor, porque aqui na Turquia temos grandes clubes, com muito poder financeiro e grandes elencos, e os campos são melhores. Você encontra condições melhores do que no Brasil. Mas o futebol brasileiro tem muitas equipes de qualidade. No Rio são quatro times grandes, em São Paulo mais quatro, e a ainda tem Rio Grande do Sul, Minas... Na Turquia, é Galatasaray, Besiktas e Fenerbahçe. São as três equipes que normalmente brigam pelo título. Então, não vou colocar o Campeonato Brasileiro como melhor, mas ele é mais disputado do que o Turco.

Fase do Fener x torcida

Os três grandes têm torcidas apaixonadas, que cobram bastante. O turco é um povo muito incisivo, que faz questão de deixar claro o que está sentindo. E, aqui, no Fenerbahçe, as cobranças são muito maiores. E isso só aumenta com a fase do time, que não é a melhor. No ano passado, brigamos rodada a rodada com o Besiktas, hoje estamos em quarto lugar e isso cria um desconforto. A torcida cobra mais, não vai ao estádio como no ano passado. Mas temos que saber lidar com a situação e passar por cima disso.

Bom momento pessoal

Eu trouxe um fisioterapeuta do Brasil e trabalho muito com ele, individualmente. Principalmente o lado físico. Coloquei na minha cabeça que, independentemente da situação do time, eu tenho de dar o meu melhor, tenho de tentar me destacar. Até porque eles fizeram um investimento muito grande para contar comigo e tenho de tentar retribuir isso de alguma forma. Então, com o time bem ou mal, eu tento fazer o melhor para o time.

Importância da Liga Europa

Na Turquia, a Liga Europa tem um apelo muito grande. Até porque, hoje, é inimaginável pensar em um time turco ganhando a Liga dos Campeões, por todas as dificuldades que isso envolve. Mas com a Liga Europa, você pode apostar. É claro que todos querem jogar a Champions, pelo glamour e todo o dinheiro que a participação rende, mas a Liga Europa é um caminho muito mais fácil para ser campeão e ser reconhecido na Europa. É bem diferente do que acontece no Brasil, quando a gente fala de Libertadores e Sul-Americana. Para o Fenerbahçe, ela é ainda mais importante, porque nós não temos esse título e nosso rival, o Galatasaray, já foi campeão. Então, a busca por esse título é sempre grande.

Melhor que o Manchester

Estamos bem na Liga Europa nessa temporada. Nós terminamos em primeiro lugar em um grupo com o Manchester United. Não é fácil conseguir algo assim. Todos no clube sabem que temos qualidade para chegar muito longe. Basta manter o mesmo nível que a gente mostrou na primeira fase. Agora, vamos pegar o time da Rússia (Krasnodar, em 16 de fevereiro) e esperamos poder passar para pensar em oitavas, quartas de final... Até título.

Atentados na Turquia

Sempre que acontece algo assim [como o atentado a uma casa noturna no ano novo], a gente fica apreensivo. Mas passa um ou dois meses e as coisas voltam ao normal. Hoje, não tenho mais preocupação. É óbvio que quando acontecem coisas como essa, você fica temeroso, mas sempre ressalto que a segurança aqui nem se compara com a do Brasil. A tranquilidade de voltar para casa de madrugada e andar em qualquer lugar é muito grande. É totalmente o contrário do que acontece no Brasil, onde sempre que a gente sai na rua convive com o medo de ser assaltado. O único problema são os atentados, mas é esporádico. Não acontece todo dia e passam uma, duas semanas, você se acostuma e a vida continua.