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Rodrigo Mattos

Por que incômodo com método de Domènec é benéfico para o futebol brasileiro

Alexandre Vidal / Flamengo
Imagem: Alexandre Vidal / Flamengo

13/09/2020 04h00

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Desde a chegada ao Flamengo, o técnico Domènec tem gerado uma série de questionamentos na mídia brasileira por conta de parte de seus métodos aplicados no time. Primeiro, era o abandono do sistema tático vitorioso de Jorge Jesus. Depois, as seguidas trocas de esquema. Em seguida, o rodízio de jogadores que deixou Gabigol um jogo na reserva.

Ao contrário do que poderia se pensar, o trabalho de Domènec causar estranhamento no ambiente do futebol brasileiro é bem positivo, não negativo. Um leitor atento perguntará por que uma crítica deve ser vista como um benefício. Afinal, no Brasil, é comum um técnico virar alvo da mídia e, na sequência da nossa rotina, ver seu emprego ameaçado.

Bem, assim como ocorreu com Jorge Jesus, o Flamengo foi atrás de Domènec porque queria ideias diferentes do que as que circulam na maior parte dos times do futebol brasileiro. Não faria sentido, portanto, esperar que chegasse um técnico para aplicar o senso comum dos outros treinadores e dos jornalistas. Como aconteceu com o português, portanto, era de se esperar um choque.

Por que os choques são bons para nosso futebol? Temos um grande números de verdades arraigadas no Brasil que precisam ser questionadas. Por exemplo: Gabigol nunca pode ser reserva, ou Romário nunca pode estar no banco, etc.

Estamos presos a uma lógica do futebol ultrapassada na qual basta um grande jogador para produzir bom futebol quando o esporte se tornou mais complexo do que isso. Atualmente há uma relação bem mais estreita do rendimento com a forma física e com um encaixe das peças/jogadores no tipo de jogo do que antes. Neste sentido, o rodízio parece essencial - há uma discussão pertinente de como é aplicado e com que critérios.

Essa lógica também vale para a questão do "não mexer em um time que está ganhando". No futebol, o brasileiro é conservador. Ele olha um time como o Flamengo de 2019 e pensa: "Por que mudar qualquer coisa aí? É só deixar tudo igual." Por aqui, escrevi um texto sobre a mudança radical que Domènec quer impor ao sistema rubro-negro e como era uma aposta alta. E de fato é, mas isso não significa que se possa montar outro modelo.

O técnico catalão tem feito as mudanças bem mais rápido que esperávamos. E os jogadores do Flamengo ainda estão se adaptando às movimentações necessárias, é esperada uma instabilidade no time durante algum tempo. Mas a realidade é que o sistema do time de 2019 acabou com a saída de Jesus. Era preciso uma reconstrução do Flamengo preservando aqui e ali novas características.

Até agora, Domènec tem armado um time que troca bem mais de sistema e se adapta aos adversário. O time do Flamengo no clássico com o Fluminense é inédito: quatro meias formando um bloco, com Arrascaeta e Everton alternando entre jogar pelas pontas e pelos meios, subidas dos dois laterais bem abertos. Já houve novidades contra o Bahia, contra o Santos?

Quanto mais sistemas, mais o futebol brasileiro ganha em variações. Vale a mesma verdade para os times de Sampaoli que varia bastante suas formas de jogar a cada jogo, no Santos e agora no Galo.

Com Jesus e Sampaoli no ano passado, o futebol aprendeu que era possível atacar e ter uma defesa segura jogando avançado, que era preciso uma marcação pressão mais intensa no jogo para retomar a bola, que era preciso pensar a circulação de bola para enganar rivais (não simplesmente toca-la de um lado para o outro esperando brechas). Veja que, na média, vários times brasileiros adotaram isso no Brasileiro.

Independentemente se o Flamengo vai ser campeão ou não, se o time vai se acertar de novo ou não, Domènec traz novas ideias agora neste Brasileiro. Algumas ideias podem ser boas e outras, não. Mas já provocam debate, o que é ótimo. É com pensamento crítico sobre a nossa realidade que o futebol brasileiro vai crescer em campo.