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Tales Torraga

REPORTAGEM

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Último Argentina x Holanda em Copas teve choro de Messi e morte

Lionel Messi abriu o placar para a Argentina diante da Austrália em partida válida pelas oitavas de final da Copa do Mundo - Paul Childs/Reuters
Lionel Messi abriu o placar para a Argentina diante da Austrália em partida válida pelas oitavas de final da Copa do Mundo Imagem: Paul Childs/Reuters

Colunista do UOL

05/12/2022 08h16

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Parece que faz menos, mas o Argentina x Holanda pela semifinal da Copa do Mundo de 2014, na hoje Neo Química Arena, já completou mais de oito anos.

A coluna detalha aquele encontro e traz os bastidores da dramática decisão. O trecho abaixo está no livro "Copa Loca". Lançada no Brasil em 2018 pela editora Garoa Livros, a obra detalha as participações argentinas nos Mundiais.

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Torcida argentina deu mais um show nas arquibancadas d
Imagem: Tom Pennington/Getty Images

Êxtase em território hostil

Brasil, 2014. O fluxo de carros e ônibus cruzando a fronteira aumentava a cada vitória do time de Sabella. A escassez de leitos vagos nas cidades não inibia a invasão argentina: depois de encarar estradas entupidas de veículos rumo ao Brasil, milhares de fanáticos armavam acampamento em qualquer canto —no Sambódromo de São Paulo, na Granja do Torto em Brasília, na Praia de Copacabana.

A euforia chegou ao nível máximo no dia da primeira semifinal da Copa, o fatídico Brasil x Alemanha do Mineirão. Naquela noite, véspera da semi entre Argentina e Holanda em São Paulo, o contingente argentino no Brasil viveu momentos de raríssimo prazer, festejando madrugada adentro a derrocada catastrófica de seu arquirrival —e em pleno território hostil.

Por uma coincidência cruel, foi a partir desse momento que a maré começou a virar para a legião argentina em solo brasileiro. Nessa mesma madrugada, ela foi pega de surpresa por uma tragédia. Jorge "Topo" López, 38 anos, repórter que trabalhava cobrindo o Mundial para o diário "Olé", foi morto quando o táxi que o levava de volta para o hotel foi atingido por um veículo ocupado por bandidos que fugiam da Polícia Militar, em Guarulhos.

"Topo", que também era correspondente do jornal espanhol "Sport" e da Rádio La Red, estava no banco traseiro e foi arremessado para fora do táxi.

Tão brutal quanto a perda de" Topo" foi a forma que sua mulher, a também jornalista Veronica Brunati, ficou sabendo do desastre: através de uma mensagem de luto de Diego Simeone no Twitter. "Não se foi apenas um grande jornalista, se foi também um amigo. Descanse em paz, Topo", escreveu o Cholo. "Diego, não me diga isso", respondeu, também na rede social, a viúva.

Ela ainda não havia sido notificada do óbito. O contingente argentino na cobertura da Copa já havia sofrido outra perda alguns dias antes, quando Maria Soledad Fernández - filha do famoso jornalista "Titi" Fernández, que também estava no Brasil - foi vitimada pelo capotamento do carro que a levava de São Paulo para Belo Horizonte.

Na concentração da seleção, a notícia da morte de "Topo" López abalou o principal nome do Mundial. Lionel Messi ficou amigo do jornalista no período em que ele trabalhava cobrindo o Barcelona. Messi foi às lágrimas ao ser informado sobre o ocorrido. Horas depois, ele entrava em campo para tentar colocar seu país numa final de Copa depois de 24 anos.

O duelo contra a Holanda, no estádio gelado, foi uma grande decepção. Os finalistas de 1978 fizeram uma semifinal modorrenta e truncada. Numa das raras oportunidades de gol do jogo, Robben finalizou cara a cara com Romero e Mascherano tirou de carrinho. Mascherano contaria depois: "Rasguei o ânus ao me esticar nessa jogada. Não quero ser grosseiro, mas foi isso que aconteceu".

Na Argentina, o lance rendeu ao indômito volante o apelido de "Mascheranus".

Com o empate sem gols garantido pela fissura anal do volante, Romero garantiu a ida à final na decisão por pênaltis —desta vez, favorável aos argentinos.

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Sergio Romero Argentina pênalti Holanda Copa 2014
Imagem: Amin Mohammad Jamali/Getty Images

Dias depois...

No Maracanã, diante dos alemães, o ataque liderado pelo melhor jogador do mundo voltou a passar 120 minutos sem balançar as redes. Apesar do domínio territorial germânico, os argentinos tiveram as melhores chances da final, todas desperdiçadas —uma delas, com Higuaín, de forma inacreditável.

O lance, jamais perdoado por boa parte dos torcedores argentinos, deve tirar o sono do "Pipita" até hoje. O destino da equipe foi selado aos 7 minutos do segundo tempo da prorrogação, quando Mario Götze marcou o gol do tetracampeonato alemão.

Assim como em 1990, 1 a 0 para os germânicos. Pelo terceiro Mundial seguido, a Alemanha impedia o sonho do tri. Messi, cujos momentos de brilho escassearam ao longo do torneio, subiu às tribunas do Maracanã para receber a Bola de Ouro —e sua eleição como melhor da Copa seria fortemente criticada pela imprensa internacional.

Sabella, que lamentou o "sabor amargo" do vice mas se disse orgulhoso da campanha, passaria os anos seguintes bem longe da bola. Acometido de problemas cardíacos, ele apareceu muito mais magro e aparentando chocante fragilidade numa imagem divulgada no terceiro aniversário da final do Maracanã.

Até hoje muito venerado, o genial Sabella morreu em 2020, dias depois de Diego Maradona.