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Como Sainz foi da mesa de cirurgia ao topo do pódio da Fórmula 1 em 16 dias

Quando Carlos Sainz embarcou para a Austrália para a terceira etapa da Fórmula 1, não estava nem um pouco confiante de que poderia sequer disputar a corrida de Melbourne. Afinal, mesmo tendo focado totalmente na recuperação da cirurgia para a retirada do apêndice, feita pouco mais de uma semana antes, ele não estava vendo uma melhora significativa.

"Eu mal conseguia usar meu abdômen para me mover", contou o piloto ferrarista. "E eu pensei que não iria dar para correr. Mas peguei o voo e, de repente, quando pousei na Austrália, a sensação foi muito melhor. E a cada 24 horas eu estava progredindo muito mais do que nos primeiros sete dias, que foi o que todos os médicos e todos os profissionais me disseram. ?Não se preocupe, porque na segunda semana a cada dia vai melhorar muito mais que na primeira semana?".

Até porque Sainz se cercou de todos os conselhos possíveis para se recuperar rapidamente. Ele contou que, tão logo voltou para o quarto após a cirurgia, realizada no dia 8 de março, já começou a pesquisar na internet quais os melhores procedimentos para acelerar a cicatrização.

Entre conselhos e soluções tecnológicas

"Assim que retirei meu apêndice, entrei na internet e comecei a conversar com profissionais e disse: 'OK, o que ajuda a acelerar a recuperação?' Que tipo de coisas você pode fazer para acelerar a recuperação, as feridas, o tecido cicatricial, o que você pode ajudar para que isso seja rápido. Conversei com outros atletas, com outros médicos na Espanha e internacionalmente também. E então montei um plano com minha equipe. A razão pela qual os atletas se recuperam mais rapidamente é porque você pode dedicar 24 horas por dia durante sete dias à recuperação. E foi exatamente isso que eu fiz."

O plano incluía duas sessões diárias de uma hora em câmaras hiperbáricas, em que há oxigênio puro em ambiente com pressão maior do que o normal, o que ajuda no aumento da circulação sanguínea e, consequentemente, na recuperação. Sainz também usou a máquina INDIBA, que ajuda na reabilitação de tecidos por meio de descargas eletromagnéticas. " Eu estava programando meu horário na cama, meu horário de passear, meu horário de comer, o tipo de comida que você precisa para se recuperar."

Foi até por saber o tanto que estava fazendo para acelerar sua recuperação que Sainz estava desanimado quando pegou o voo, mas foi então que o corpo começou a responder de maneira mais acelerada e ele se sentiu bem para, primeiro, fazer os treinos livres na sexta-feira, e então confirmar sua participação no GP da Austrália.

Espanhol sentiu a falta de treinamento no final da corrida

Não que ele estivesse 100% recuperado. O espanhol viu sua vantagem de 8s em relação ao companheiro Charles Leclerc cair mais da metade nas voltas finais, e admitiu que estava sentindo seu corpo "rígido" no final da prova. "Obviamente, passar sete dias na cama não é, para o seu condicionamento físico e para todos os músculos, muito saudável para um atleta", explicou.

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Sainz também teve de se adaptar a uma sensação completamente diferente: uma espécie de vazio interno, algo por que outro piloto que teve apendicite recentemente, Alex Albon, também sentiu logo que voltou. "Foi exatamente o que Alex me disse antes de entrar no carro: ele disse que quando removeu o apêndice, por causa das forças G no carro, tudo por dentro parece estar se movendo mais do que o normal e você precisa de um pouco de confiança para apoiar o core como costumava fazer antes. Não há dor. Não há nada com o que se preocupar. É apenas uma sensação estranha."

Mas não foi só isso. Sainz contou que teve de mexer na posição do pedal de freio, cinto de segurança e seu assento, para ficar confortável. E correu ainda com uma proteção no abdome.

Nada disso tirou sua velocidade. O espanhol até brincou que recomenda aos rivais tirarem o apêndice para ganhar velocidade. Desde os treinos livres, ele andou forte, em um final de semana em que a Ferrari foi mais consistente que a Red Bull em todas as sessões, a não ser nos últimos instantes do Q3, quando Sainz tinha a pole provisória até errar nas curvas 9 e 10.

Na corrida, é difícil dizer se a vitória só foi possível com o abandono de Max Verstappen, até porque ele não chegou a fazer nenhuma volta sem os problemas de freio que causaram seu abandono logo na terceira volta. Mas chamou a atenção o rendimento de Sainz em comparação com o companheiro Charles Leclerc, que não foi bem na parte final da classificação, largou em quarto, e sofreu mais desgaste de pneus andando entre outros pilotos no início da prova.

Mesmo sem estar 100%, Sainz foi mais veloz que Leclerc

Não que seja uma novidade ver Sainz andando na frente de Leclerc. O rendimento dos dois é parelho e tende a oscilar dependendo da pista. E Sainz, claro, tem uma motivação a mais para andar bem (assim como para voltar o mais rápido possível após a cirurgia): ele perderá sua vaga na Ferrari ano que vem para Lewis Hamilton.

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"A vida às vezes é uma montanha-russa, mas às vezes pode ser muito legal e boa para você. Estou tentando absorver e aproveitar o momento. Não só pelas últimas duas semanas. É por como o ano começou, com a notícia da não renovação. Depois fiquei em forma, me preparei para o início da temporada, dando tudo de mim. Cheguei no Bahrein, fiz um pódio e pensei: ?OK, agora a temporada está começando bem e posso manter o ritmo?. E de repente, você perde a corrida em Jeddah e tem que operar. São longos dias na cama, sem saber se voltaria a tempo. Obviamente, muitas incógnitas. Vou voltar a estar em forma? Vou voltar me sentindo ainda bem com o carro? E então, de repente, você volta e vence."

Será interessante seguir os próximos passos dessa história. A próxima etapa é no Japão, que também foi a corrida seguinte à última vitória de Sainz, em Singapura. Na ocasião, Leclerc virou o jogo para cima do espanhol em Suzuka.

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Texto que relata acontecimentos, baseado em fatos e dados observados ou verificados diretamente pelo jornalista ou obtidos pelo acesso a fontes jornalísticas reconhecidas e confiáveis.

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