Milly Lacombe

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OpiniãoEsporte

Será que a seleção da Espanha ensaia um projeto anarquista na Austrália?

Uma das bases do anarquismo obriga a questionarmos os sistemas de poder através da seguinte pergunta: esse sistema é legítimo?

Cabe ao dominador, ensina o anarco-sindicalista Noam Chomsky, argumentar em sua defesa. Se a defesa não convencer, o sistema não é legítimo e deve ser demolido.

Chomsky acrescenta que quase nenhum sistema de dominação é capaz de justificar sua existência. Temos aí, a partir dessa noção, terreno fértil para que floresça o anarquismo, um sistema que, ao contrário do que podemos imaginar, de bagunça não tem nada.

A Espanha tem uma longa história ligada à luta anarquista.

Um dos livros mais interessantes que já li trata justamente do tema e se chama "Homenagem à Catalunha", de George Orwell. Ele conta a história de sua batalha nas trincheiras ao lado dos anarquistas durante a Guerra Civil espanhola.

Outro livro fundamental para iniciar os trabalhos na consciência anarquista é "Notas Sobre o Anarquismo", de Chomsky.

Tudo isso escrevi para chegar à seleção espanhola que, como manda a cartilha anarquista, há algum tempo questiona a liderança de Jorge Vilda e de sua comissão técnica.

No ano passado, as atletas se manifestaram de forma direta à confederação espanhola pedindo que o treinador fosse desligado da função alegando que seus métodos de trabalho não eram bons ou eficazes. Foram ignoradas. Algumas então decidiram não ir a Austrália.

Vilda, com o apoio dos executivos do futebol espanhol, se manteve forte a despeito das críticas.

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Logo depois da vitória sobre a Holanda na Copa da Austrália, que levou a Espanha à semi-final da Copa, o que se viu em campo foi uma cena tão eloquente quanto constrangedora: Vilda e sua comissão técnica, formada por muitos homens, se abraçando e pulando juntos e as jogadoras, em campo, se congratulando sem olhar para Vilda e sua turma.

Os grupos não se misturaram. Quando Vilda saiu do abraço em seus colegas e foi entrando em campo lentamente parecia estar em busca do abraço de algumas das atletas. Não aconteceu. Foi ignorado.

Elas seguiram na festa delas, tiraram fotos só delas, e Vilda e sua comissão ficaram no vácuo com cara de bobos.

Diante da poderosa imagem, fica a dúvida sobre se esse time está seguindo as orientações do treinador ou foi buscar no passado da Catalunha inspiração para uma insurreição.

Não me parece razoável achar que alguém ignorado como ele foi ao final de uma difícil e histórica vitória esteja sendo escutado como liderança de alguma coisa.

Opinião

Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.

** Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do UOL.

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