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ANÁLISE

Texto baseado no relato de acontecimentos, mas contextualizado a partir do conhecimento do jornalista sobre o tema; pode incluir interpretações do jornalista sobre os fatos.

Salgueiro e Náutico podem ser punidos por negociação de vaga? Entenda

06/02/2021 11h26

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Por Gabriel Coccetrone

Os desdobramentos da decisão do Salgueiro de voltar atrás e decidir disputar a Copa do Nordeste 2021 não param de acontecer. Logo após a realização do sorteio dos grupos da competição na manhã desta quinta-feira (4), o presidente do clube, José Guilherme, concedeu uma entrevista coletiva para contar sobre o que levou à mudança de ideia nas últimas horas.

José Guilherme detalhou os pontos fundamentais e os bastidores do desenrolar da história, revelando que o Náutico esteve presente na negociação para que o Salgueiro desistisse de participar da Copa do Nordeste e da Copa do Brasil. A participação do Timbu no caso chamou a atenção de torcedores.

"Essa é uma questão controversa. O artigo 243 do CBJD traz a possibilidade de punição a quem atua deliberadamente de modo prejudicial à equipe que defende. É, no entanto, um artigo que tem como objetivo prevenir a manipulação de resultado por parte de atletas, o que pode ser entendido pela referência à 'equipe que defende'. Aplicar para dirigentes seria interpretar norma penal de forma extensiva, o que não deveria ocorrer. O mesmo podemos dizer sobre eventual tentativa de aplicação do artigo 242. É uma situação completamente antiética, mas que, em razão de sua peculiaridade, seria apenas punível com base no artigo 258, que prevê uma pena bastante baixa quando analisada a natureza da infração", avaliou Vinicius Loureiro, advogado especialista em direito desportivo.

Já para o advogado especializado em direito desportivo e colunista do Lei em Campo, Gustavo Lopes, o envolvimento do clube pernambucano pode ser considerado uma infração ao Estatuto do Torcedor.

"A 'compra' de vaga em competição está incursa nos crimes dos arts. 41-C e 41-E do Estatuto do Torcedor por haver, em tese, aceitação de vantagem para alterar resultado de competição e por haver, em tese, fraude a resultado de competição. Isso porque o índice técnico para a competição não foi respeitado. O resultado da competição leva à vaga... se o clube desiste da vaga por dinheiro, tem-se um efeito prático nos efeitos do resultado desportivo...".

"A "venda de vaga" não está tipificada pelo ordenamento esportivo. Mesmo assim, existem caminhos de punição no CBJD, se vier a se entender que houve comportamento de gestor que prejudicou deliberadamente o clube e outro caminho que pune uma conduta que fere a ética esportiva. Também existe espaço para análise de punição via Estatuto do Torcedor. Agora, tudo passa por uma questão de prova", diz Andrei Kampff, advogado especializado em direito desportivo, jornalista e autor desse blog.

Para Milton Jordão, advogado especialista em direito desportivo e colunista do Lei em Campo, "ainda não existem elementos concretos para se imputar qualquer infração ao Náutico. Todavia, o caso merece maior atenção e apuração".

Veja o que dizem os artigos citados:

Art. 258. Assumir qualquer conduta contrária à disciplina ou à ética desportiva não tipificada pelas demais regras deste Código: Pena - suspensão de uma a seis partidas, provas ou equivalentes, se praticada por atleta, mesmo se suplente, treinador, médico ou membro da comissão técnica, e suspensão pelo prazo de quinze a cento e oitenta dias, se praticada por qualquer outra pessoa natural

Art. 41-C. Solicitar ou aceitar, para si ou para outrem, vantagem ou promessa de vantagem patrimonial ou não patrimonial para qualquer ato ou omissão destinado a alterar ou falsear o resultado de competição esportiva: Pena - reclusão de dois a seis anos e multa.

Art. 41-E. Fraudar, por qualquer meio, ou contribuir para que se fraude, de qualquer forma, o resultado de competição esportiva: Pena - reclusão de dois a seis anos e multa.

A história começou quando na última terça-feira (2) o Salgueiro protocolou um pedido na Federação Pernambucana de Futebol (FPF-PE) para sair da Copa do Nordeste e Copa do Brasil de 2021, competições que garantiu vaga por ter sido o campeão pernambucano de 2020, alegando problemas financeiros causados pela pandemia de Covid-19 e pela perda de patrocinadores e do apoio da prefeitura municipal da cidade do sertão de Pernambuco.

No entanto, tudo mudou na manhã de quinta-feira (4). O clube voltou atrás e decidiu que disputaria as duas competições. O presidente José Guilherme concedeu uma entrevista coletiva para explicar a decisão:

"O que aconteceu? Mandei a carta para a Federação (Pernambucana) dizendo que não ia participar. Quem ia ter direito era o Náutico. Quando chegou na Federação, a CBF não aceitou. Quando estava conversando com os atletas, comissão técnica e os funcionários, o telefone tocou e era o pessoal da CBF e Liga do Nordeste dizendo que a vaga estava retornando para o Salgueiro. O Náutico não teria direito a vaga. Se o Salgueiro não fosse participar, a vaga não iria para um clube de Pernambuco".

O clube adiantou cotas para poder pagar salários de 2020. Adiantou R$ 250 mil da Copa do Brasil e R$ 550 mil da Copa do Nordeste. Houve então uma negociação com o Náutico para que o Timbu ficasse com as vagas, mas o adiantamento das cotas ficaria com o Salgueiro. O Náutico receberia apenas o valor restante e as cotas com eventuais classificações.

"Todos sabem, saiu a prefeitura, saiu os patrocínios, as contas iam bater na minha porta, querendo saber do dinheiro. Aí é fácil dizer 'bota o time'. Não ia chegar ninguém pra me defender. No ato de desespero, tomei a decisão de procurar a FPF e o Clube Náutico Capibaribe, para que se eu saísse, ou mesmo sem negociar com o Náutico e a FPF, eu não ia participar. Procurei o Náutico, fiz a negociação, entrou o dinheiro, está na conta do clube, que é para pagar funcionários do clube", revelou José Guilherme.

Questionado novamente sobre a origem do dinheiro, José Guilherme reforçou: "Não paguei, está na conta. Esse dinheiro envolveu Náutico e Copa do Nordeste. A Liga do Nordeste ajudou para não prejudicar o campeonato. Eu precisava do dinheiro para pagar todo mundo e tirar os cobradores da minha porta".

Em nota oficial, o Náutico negou envolvimento em desistência do Salgueiro das Copas do Nordeste e do Brasil.

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