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Julio Gomes

ANÁLISE

Texto baseado no relato de acontecimentos, mas contextualizado a partir do conhecimento do jornalista sobre o tema; pode incluir interpretações do jornalista sobre os fatos.

Loucuras, pandemia, regras: O desafio de encaixar Messi no futebol de elite

06/08/2021 05h00

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Por trás de um simples e bombástico comunicado do Barcelona, tem muita coisa que não sabemos. Um colunista do diário "Sport", o mais importante da Catalunha, pede em seu artigo desta sexta-feira "toda a verdade sobre o caso Messi". Sinto muito, ela não virá à tona.

Um ano atrás, quando Messi e o clube estavam em pé de guerra, não seria mais uma surpresa caso ele saísse. Em janeiro, quando faltavam seis meses para o fim do contrato anterior e o argentino podia assinar com qualquer um, também teria sido natural vê-lo sair. Mas ontem? Ontem, não. Ontem era o "Messi Day". Ontem era o "dia do fico", não o "dia que deu m...".

As notícias dão conta de um Messi arrasado. Ele estava decidido a ficar no clube do coração até o fim, aceitando ganhar menos da metade do que ganhava - o que, convenhamos, é mais do que eu, você e todos que lerem este post ganharemos, juntos, até o fim dos nossos dias. A não ser que o Neymar esteja lendo. Duvido. Mas vai que... Beleza, Neymar? Tudo certo? Abs.

Bem, voltando ao Messi. E ao Neymar. Porque agora a chance de eles jogarem juntos é real. Falaremos mais adiante.

Oficialmente, a razão para a impossibilidade de um novo contrato com o Barça ser fechado é a regra de fair play financeiro da Liga espanhola. Lembrando que a Liga não é uma CBF de lá. A Liga é a liga de clubes. O Barcelona é parte da Liga. São os próprios clubes que copiaram os co-irmãos da Alemanha, a Liga mais saudável e responsável do mundo, e definiram que ninguém pode gastar com salários mais de 70% do orçamento total.

É uma regra básica e que deveria existir em qualquer liga de clubes do mundo. O Barcelona já está estourado, bastante estourado. Na verdade, mesmo sem Messi terá de rebolar para se ajustar a esta regra. O pepino da história toda é: como ignorar a pandemia? Como ignorar um fator externo, inacreditável, surreal, inesperado, que fez tudo mudar? As receitas do Barça foram para o vinagre. Mas os contratos antigos com jogadores seguem lá.

Como criticar La Liga? Como criticar quem zela pela responsabilidade. Mas ao mesmo tempo em que a regra do fair play precisa ser respeitada, também é necessário entender o contexto. Não só para o Barça, mas para todos. As receitas despencaram. Poderia ser aberta uma exceção com prazo determinado. Qual o tamanho do tiro que La Liga dá no próprio pé ao deixar seu principal garoto-propaganda ir para outro país?

É por isso que muitos acham que o Barcelona "trucou" ao fazer o que fez ontem. Tem quem ache que Messi acabará, no fim das contas, assinando com o... Barcelona! A velha estratégia de jogar no ventilador, sacudir o coreto, para ver se alguma coisa muda. Nem o Real Madrid quer Messi fora do Barcelona.

O Manchester City recebeu, recentemente, uma punição de dois anos fora das competições Uefa - depois de alguns meses, foi absolvido. Qual era a acusação? oras, o emirado de Abu Dhabi, dono do City, se autopatrocina através de outras empresas. Então a Etihad, por exemplo, companhia aérea de Abu Dhabi, estaria "pagando" ao City um valor muito acima do mercado. Este número, lá no orçamento, amplia o teto de gastos com salários, por exemplo. Seria um número insuflado artificialmente. Agora imaginem a quantidade de picaretagens do tipo que não rolam no futebol europeu, inclusive o Barça.

Para um clube deste tamanho jogar a toalha deste jeito, quando estamos falando de Messi, o maior jogador da história do futebol europeu, é porque as opções realmente se esgotaram - ou então é truco.

Por que só falamos em Manchester City e Paris Saint-Germain como possíveis destinos para Messi? Porque são os clubes que não têm dinheiro do futebol e, sim, do orçamento de dois países. Países em que sheiks e kalifas são os que mandam, não estamos falando de democracias.

Só que mesmo estes dois precisam seguir algumas regrinhas orçamentárias. E mesmo estes dois precisam se organizar para fazer uma contratação como a de Messi. Ao ver que o argentino ficaria no Barcelona, ambos seguiram a vida. Hoje, não parecem nem um pouco preparados para fazer o movimento. O PSG quer renovar com Mbappé e já renovou com Neymar. O City acaba de fazer a maior contratação da janela ao tirar Grealish do Aston Villa.

O fato é que o futebol europeu de hoje não tem condição de pagar Messi, um gênio, mas já com 34 anos. A pandemia mudou o tabuleiro todo, e contratos absurdos assinados em 2017, 2018 e 2019 hoje viraram ainda mais absurdos.

Muitos sonham com Messi na Juventus, para vê-lo jogando ao lado de Cristiano Ronaldo. Sabem com o que a Juve realmente sonha? Com despachar Cristiano Ronaldo, pois o salário virou um fardo terrível. Não, não veremos os dois juntos. A não ser que eles topem fazer filantropia.

Onde vai jogar Messi? A resposta fácil seria PSG. O Catar vai receber a Copa no ano que vem, seria uma publicidade positiva para o país, Messi tem amigos por lá. A Liga francesa tem suas regras, mas possivelmente flexibilizaria todas elas para ter o melhor do mundo em um de seus times. Mas não é absurdo algum imaginar que, mesmo depois de tudo isso, ele ainda acabe ficando no Barcelona.

O que é certo? Que neste momento todos os dirigentes que se prezem estão fazendo contas e telefonemas; que Messi terá de abrir mão de muito dinheiro para seguir jogando no futebol de alto nível até sua última Copa do Mundo; e que quem ficar com ele terá de fazer uma ginástica financeira e política consideráveis.