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José Trajano

OPINIÃO

Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.

Em homenagem ao Dia dos Pais: o filho de um goleiro 'frangueiro'

Trajano Garcia Quinhões na quadra da antiga sede do America, na rua Campos Sales - Arquivo pessoal
Trajano Garcia Quinhões na quadra da antiga sede do America, na rua Campos Sales Imagem: Arquivo pessoal

Colunista do UOL

05/08/2022 04h00

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Em homenagem ao Dia dos Pais, que está batendo na porta, reproduzo aqui um trecho do meu livro "Procurando Mônica: o maior caso de amor de Rio das Flores", de 2014, que fala da minha relação com ele e com o futebol.

"O futebol lá na fazenda era diferente. E põe diferente nisso: quem desse chutão para cima e cabeceasse a bola de volta seria aplaudido de pé.

Craque! Um bumba meu boi puro e inocente. Aonde a bola ia, todo mundo corria atrás, como em jogos de crianças. Drible, nem pensar, uma coisa do capeta. Quem conseguia dar mais de um drible virava mito na hora.

O campo era ao lado de uma estrada de terra, pertinho de um pequeno cemitério, muita gente passava ali de carro, bicicleta, a cavalo, trator, charrete ou a pé. E a grama, ralinha, era coalhada de tocos de árvore. Foi ali que a Fazenda da Forquilha conquistou a maior vitória da sua história: 2 a 1, com um gol meu de cabeça, sobre o time da cidade de Rio das Flores.

E com meu pai, inspirado, pegando até pensamento.

Foi marcada a revanche em Rio das Flores dali a duas semanas.

Fomos numa carroceria de caminhão, soltando rojões e teve até um dos nossos que deu tiros de 32 para o alto quando descíamos a estrada quase chegando à cidade. O estádio Doutor Elias já reunia um público razoável.

Trajano foi goleiro amador - Arquivo pessoal - Arquivo pessoal
Trajano foi goleiro amador
Imagem: Arquivo pessoal

Vi nossos jogadores com cara de bobos quando pisaram no enorme gramado, oficial, com traves, redes e balizas de verdade e não de bambus finos e tortos como no nosso campo. E mais: os jogadores do time deles eram outros, tinham pinta e jeito de quem conhecia do riscado, ao contrário dos mequetrefes que perderam lá na fazenda.

Pra encurtar a conversa, os 9 a 1 para eles ficaram de bom tamanho, não quiseram humilhar. Não vimos a cor da bola, e eu fui expulso quando o Rio das Flores fez 5 a 0 e um grupo de torcedores xingou meu pai de frangueiro.

Mas pai é pai e pulei a cerca para brigar com eles e a turma do deixa-disso aliviou.

Por mais que tivéssemos sido goleados, voltamos para a fazenda com a sensação do dever cumprido. E com a certeza gostosa de que, em nosso campo, com balizas de bambu, tocos de árvore e com muita gente passando pela beira, não tinha para ninguém. Comigo na frente e o querido pai no gol."

O professor de história Trajano Garcia Quinhões faleceu aos 70 anos, logo após a Copa de 1994. Foi diretor do Patrimônio Histórico do Rio de Janeiro e vice-reitor da Faculdade de Arquitetura da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ). Goleiro amador na juventude, jogando por times na região de Campo Grande, zona oeste da cidade, onde nasceu, virou torcedor fanático do America quando foi morar na Tijuca, ao lado do campo da rua Campos Sales.

Ele é o responsável pela minha paixão sem limites pelo America. Tenho muitas saudades dele!

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