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Zaidan: A reinvenção da seleção brasileira

Pedro Martins/Mowa Press
Imagem: Pedro Martins/Mowa Press

18/11/2019 00h23

O último jogo da seleção brasileira neste ano traz consigo algo de incômodo. Vencer a Coreia do Sul não irá restaurar a situação do escrete; no entanto, os problemas se tornarão críticos se o time do Tite ampliar a sequência de partidas sem vitória.

Depois do título na Copa América, o Brasil não ganhou nem sequer um dos cinco jogos que disputou: foram três empates e duas derrotas. Não é inédito, mas tampouco é comum. Mais do que os resultados, são as seguidas atuações ruins que chamam a atenção. É por isso que uma vitória, esta terça, sobre os coreanos não terá o poder de mudar a constatação geral de que o time está jogando um futebol ruim, sistematicamente ruim; e nem convencerá que, finalmente, foi encontrado o caminho que levará a seleção de volta ao seu lugar natural.

Tite é capaz de encontrar soluções? Acho que sim. Ele já demonstrou, principalmente no Corinthians e no classificatório para a Copa de 18, que sabe trabalhar. Mas o sucesso de um treinador não depende apenas de sua competência para armar esquemas de jogo; é preciso, além de contar com os jogadores certos, que ele saiba reconhecer e identificar erros, admita que o planejamento inicial não produziu os resultados esperados e se disponha a fazer mudanças.

Antes do jogo contra a Argentina, Tite, à sua maneira, disse estar em um processo de "reinvenção". O anúncio soou como admissão de que as coisas não andam bem na seleção e que é hora de buscar e aplicar novas ideias.

A suposta admissão, porém, foi seguida pela declaração de que podem ocorrer alterações pontuais no posicionamento dos jogadores, mas não no sistema de jogo. Eis um problema: o sistema nesta seleção é o roteiro ao qual o técnico e os jogadores se prendem. Tite substitui jogadores e muda funções, mas tem se negado a questionar o sistema de jogo.

Insisto: o atual técnico do Brasil é um bom roteirista, mas demonstra dificuldade quase irremediável em desenvolver alternativas; assim, se o roteiro original não funciona, nada há para colocar em seu lugar.

Contra a Argentina, a seleção brasileira fez um jogo insípido e infértil, inapelavelmente distante do que se espera de um time vestido com aquela camisa. O resumo da partida é que só um jogador brasileiro foi bem: Alisson, o goleiro. Pois eis que o Tite, na entrevista depois da derrota, se limitou a observações banais a respeito de pormenores, dando a entender que considerou normal e aceitável o desempenho de seu time. Tite perdeu boa oportunidade de afirmar que a seleção nada jogou e foi incapaz de pelo menos chutar a gol, e que ele está, sim, preocupado com a sequência de exibições medíocres. Em vez de lançar platitudes ao vento, Tite faria bem a si mesmo se dissesse que o time está ruim e que mudanças importantes serão feitas, inclusive no sistema de jogo.

Os últimos cinco amistosos expressaram uma equipe ruim na marcação, na armação e no ataque. Hoje, a seleção está pior do que esteve na Rússia, quando já não fez grande coisa. Se a situação estivesse um pouco melhor, Tite não teria falado em "reinvenção", nem cronistas e torcedores estariam pedindo mudanças. Muita gente, por achar que Tite seguirá na mesma toada, defende que a CBF troque o treinador antes do classificatório, que começará em 2020.

Talvez eu chegue atrasado à mesma conclusão, mas ainda estou longe dela. Tite, além de bom técnico, é um sujeito inteligente e com capacidade para fazer a coisa certa. O problema é que o treinador da seleção fala em mudanças, mas não se move em direção a elas; antes, continua discursando e agindo como se tudo pudesse ser resolvido com pequenos ajustes. Perda de tempo. É o rumo que precisa ser alterado, desde o modo de jogar até aos jogadores que devem ser escolhidos.

Tite tem obrigação consigo mesmo de repudiar esse papo de "grupo fechado". Com exceção de Alisson e Neymar, não há imprescindíveis; logo, é preciso estar atento a quem pode permitir de fato a reinvenção do time. Repito: Tite pode comandar essa grande mudança, desde que ele próprio não se impeça de cumprir a tarefa. Se, feitas as contas, a conclusão for de que a solução passa pela substituição do treinador, o novo debate será a respeito da escolha do sucessor. Há os que pedem Renato Gaúcho; outros, Jorge Jesus.

Como todos sabem que a CBF dispõe de muito dinheiro, o nome de Guardiola é sempre citado. Com Tite ou com outro treinador, o Brasil chegará ao Catar com chances de título, mas, até pela importância histórica da seleção brasileira, talvez mais relevante que a taça seja formar um time que, por décadas, inspire jogadores, técnicos e torcedores em cada canto do mundo. Um time que reinvente o melhor do futebol.

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