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OPINIÃO

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Em reedição histórica, Celtics e Warriors se enfrentam nas Finais da NBA

Stephen Curry e Jayson Tatum, antes da final da NBA - Garrett Ellwood/NBAE via Getty Images e Jesse D. Garrabrant/NBAE via Getty Images
Stephen Curry e Jayson Tatum, antes da final da NBA Imagem: Garrett Ellwood/NBAE via Getty Images e Jesse D. Garrabrant/NBAE via Getty Images

02/06/2022 04h00

Se você fosse definir as versões 2022 de Celtics e Heat em uma palavra, ela seria "resiliência", então não é de surpreender que a série entre os dois tenha sido de sete jogos extremamente físicos e desgastantes. E, conforme a série ia se estendendo e eu via ambos os times levados ao limite das suas forças, eu só conseguia imaginar os Warriors assistindo e rindo. Não apenas Golden State terá três dias a mais de descanso antes das Finais que seu adversário mas também vem de séries relativamente tranquilas, enquanto Boston chega com dois jogos 7 contra times extremamente físicos na bagagem.

Esse é um dos motivos pelos quais Golden State é favorito nesse confronto, reedição das Finais de 1964, mas a margem é bem pequena. Eu me arriscaria a dizer que os Warriors prefeririam muito mais enfrentar o Heat nas Finais que os Celtics; não por Boston ser um time melhor (embora até seja), mas porque é um encaixe bem complicado para Golden State. Desde que Kerr chegou na Califórnia em 2014 e a dinastia dos Warriors teve início, nenhum time em toda a NBA enfrentou os Warriors de forma mais parelha do que os Celtics; de fato, Boston é o único time da liga que tem mais vitórias que derrotas contra os Warriors nesse período, e não é por acaso.

Parte enorme dessa dificuldade é a identidade defensiva dos Celtics. O ataque de Golden State é uma máquina de caos controlado: executando muitas ações, movimentos e corta-luz fora da bola, os Warriors forçam a defesa a uma série de decisões rápidas e difíceis que precisam ser executadas em perfeita sincronia. Um mero atraso ou falha de comunicação, e Golden State faz chover fogo sobre você.

Boston, no entanto, se montou ao redor de uma defesa extremamente agressiva e versátil. Que ela é a melhor defesa da NBA você já sabia - e viu nos playoffs o motivo - mas a forma como ela joga que realmente é o diferencial. Com o DPOY Marcus Smart no ponto de ataque e um conjunto elite em trocar a marcação, Boston consegue quebrar as ações ofensivas dos adversários antes delas começaram de verdade, estrangulando a criação de jogadas e forçando os adversários a jogar individualmente - situação na qual Boston não tem elos fracos a serem atacados.

Isso é particularmente mortal contra os Warriors, que estão no seu melhor atacando defesas confusas e em movimento. Golden State gosta de usar cortas-luzes inusitados e em sequência para criar essas situações; a defesa de trocas de Boston, impecável como é, faz com que muito dos espaços criados desapareçam antes de serem aproveitados. Golden State é inteligente em usar essas trocas para criar mismatches e colocar Curry para atacar os piores defensores adversários, mas Boston não tem um defensor que possa ser explorado dessa maneira. E, quando o ataque dos Warriors não consegue abrir espaços, eles costumam exagerar no improviso e nos passes difíceis, gerando turnovers que iniciariam o ataque de transição dos Celtics.

Mas isso é muito mais fácil no papel do que na prática. Os Warriors tem tido muito sucesso nos rebotes ofensivos - Kevon Looney, em particular, tem sido extremamente dominante - e Boston jogou melhor contra Miami recuando mais os pivôs para o garrafão ao invés de se apoiar nas trocas, algo que não poderão fazer na mesma medida contra Golden State. Bucks e Heat não tinham grandes arremessadores a partir do drible e os Celtics estavam confortáveis desafiando os adversários a arremessarem no pick-and-roll, mas os Warriors tem os jogadores para castigar esse esquema - e como.

Aqui é um lugar onde a questão física pode atrapalhar bastante os Celtics. Rob Williams esteve visivelmente limitado na série contra o Heat, especialmente no Jogo 7; essa versão de Williams não tem condições de acompanhar as movimentações dos Warriors no perímetro, e isso afeta todo o esquema defensivo do time. Grant Williams provavelmente é um jogador que os Warriors podem explorar nas trocas, e nós vimos ele sofrer nos rebotes defensivos contra Miami.

Esse duelo entre o ataque dos Warriors e a defesa dos Celtics é o grande foco dessa série, e provavelmente o que vai ditar o campeão. E é interessante, também, observar que ambos os lados terão um desafio inédito nesses playoffs. Golden State enfrentou boas defesas até aqui - Memphis, Dallas - mas eram defesas que seguiam estilos mais padrões, que Golden State conseguiu quebrar com sua versatilidade e agressividade. Eles ainda não enfrentaram uma defesa tão agressiva e versátil como Boston,e essa é uma mudança de padrão que pode demorar um pouco para o time se adaptar. E o mesmo é verdade do outro lado: Bucks (sem Middleton) e Miami não tem ataques nem de longe tão potentes como os dos Warriors, e mais importante - e como já ressaltado na prévia da série contra Dallas - os Warriors tem um estilo ofensivo tão completamente fora da curva, único e diferente, que enfrenta-los envolve mudar por completo sua forma de pensar e reagir.

Ainda assim, é errado achar que a série se limita a isso: Boston teve o segundo melhor ataque da NBA depois da virada do ano para 2022, e os Warriors tiveram a segunda melhor defesa da temporada inteira. Ambos são elite dos dois lados da quadra, e esse é parte grande do motivo de ambos estarem nas Finais.

Boston teve sua série de apagões ofensivos nessa pós-temporada, mas no seu melhor é um ataque que se especializa em encontrar os elos fracos da defesa adversária, atacar no um-contra-um, e rodar a bola em busca de bons arremessos (pergunte a Max Strus). Em teoria, eles terão sua oferta de opções para caçar contra os Warriors, como Curry, Klay e até Looney, mas Golden State é talvez o melhor time da NBA em evitar ceder essas trocas para o adversário sem dar espaço para outras jogadas. Curry é um excelente defensor executando esse -esquema de atacar e recuperar, as rotações da equipe são impecáveis nas suas costas, e até Looney foi bem marcando Luka individualmente. Dallas também tem um ataque que busca forçar trocas e atacar os pontos fracos em busca de quebras, e nós vimos o que acontece nas finais do Oeste. Boston é melhor que Dallas desse lado da quadra, mas vai exigir execução impecável para conseguir explorar a defesa de Golden State (os Warriors também podem e devem recorrer à sua defesa por zona nessa série).

E, acima de tudo, esse é meu maior medo para os Celtics. Eles terão momentos onde seu ataque vai funcionar, Tatum vai dominar individualmente, a bola vai rodar, e os chutes de três vão cair com regularidade; esses são os momentos onde o Celtics é o melhor time da NBA, e completamente imparável. Nós vimos isso durante a segunda metade da temporada regular - quando os Celtics pareciam os Bulls de 1996 destruindo o resto da NBA - e em alguns momentos contra duas outras defesas de elite em Bucks e Miami ao longo dos playoffs. Seu teto é muito alto desse lado da quadra.

Mas nós também vimos o oposto: sequências onde Boston parava de executar seu ataque, começava a viver em excesso de isolações e arremessos forçados, e cometia uma série de erros que permitiam aos adversários atacar em transição sem precisar enfrentar defesa dominante dos Celtics. Foi esse o maior motivo pelo qual os Celtics foram levados ao limite contra Miami - quase entregando o Jogo 7 mesmo liderando por 13 pontos faltando 3 minutos e 15 - e contra os Bucks sem Khris Middleton. Boston sobreviveu a esses apagões em parte porque seus adversários desfalcados não tinham o poder de fogo para castigar, e em parte porque a defesa dos Celtics é boa demais a esse ponto.

E os Warriors vão castigar. Eles não vão perdoar os erros de Boston, e se os Celtics repetirem o que fizerem nas últimas séries nesse sentido, eles não vão ganhar as Finais. E por isso meu palpite favorece o time da Califórnia.

Ainda assim, uma coisa eu tenho certeza: vai ser uma série extremamente divertida, cheia de boas histórias.

Palpite: Warriors em 7