Topo

14 Anéis

OPINIÃO

Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.

O que boas atuações de Gui Santos significam para seu futuro na NBA

15/07/2022 04h00

Quando o ala brasileiro Gui Santos foi selecionado no Draft pelo Golden State Warriors, existia grande expectativa entre os torcedores para saber qual seria seu futuro imediato. Times competitivos como Golden State não costumam possuir espaços vagos no elenco, e é comum fazerem com seus jogadores jovens o chamado stash - mantendo esses jogadores atuando fora da sua equipe (na Europa ou na G-League, por exemplo) enquanto se desenvolvem, com a ideia de trazê-los para a NBA anos depois quando já estiverem mais prontos. A princípio, a suposição era de que esse seria o caminho a seguirem com o brasileiro, embora a própria diretoria dos Warriors tenha deixado em aberto a questão.

Enquanto isso não é definido, Gui Santos se juntou ao elenco dos Warriors que está disputando as Ligas de Verão (Summer Leagues), os torneios iniciais de pré-temporada que normalmente são usados pelas equipes para dar minutos a jovens jogadores (em geral calouros) ou possíveis contratações para o fim do elenco. E, nesses seis jogos (até aqui), nós tivemos a chance de ver Gui atuando com jogadores de nível NBA e dentro do contexto técnico da equipe dos Warriors - e os resultados foram positivos.

Nos três jogos da equipe pela primeira (e menor) das Summer Leagues, a da Califórnia, a equipe ainda não contava com Jonathan Kuminga, Moses Moody e James Wiseman, segundanistas (terceiranista, no caso de Wiseman) da equipe que já estão no elenco principal, e Gui Santos teve um papel de maior protagonismo - que ele aproveitou logo de cara. Sua estreia, contra o Sacramento Kings, foi seu melhor jogo até agora: foram 25 pontos, 6 rebotes, 3 roubos e uma série de jogadas de efeito que impressionaram até quem não conhecia o brasileiro. Gui bateu de frente com Keegan Murray, escolha #4 do Draft pelos Kings, e mostrou um lado agressivo e pontuador que não costuma ser o mais associado a ele.

O ala não chegou a repetir essa atuação nas partidas seguintes, mas parte disso foi ser testado em diferentes funções pelos Warriors; em particular iniciando jogadas e facilitando para os companheiros, com suas assistências passando de uma no jogo de estreia para duas e cinco nas partidas seguintes conforme ficava mais confortável no papel.

Gui terminou a SL da Califórnia com médias de 12 pontos, 3 rebotes e 3 assistências por jogo, arremessando 56% de quadra e 40% da linha de três pontos - excelente para um jogador no seu primeiro choque com o nível da NBA.

Na Summer League da Las Vegas, a principal da NBA, a situação era totalmente diferente. Com Wiseman, Moody e Kuminga todos em quadra, era claro que Gui não teria o mesmo protagonismo ou liberdade de jogo. Wiseman está jogando pela primeira vez em quase 18 meses, e todos os três são jogadores que Golden State pretende contar em boa medida já na temporada 2022-23; era natural que eles tivessem mais minutos, mais arremessos e mais importância nas partidas, já que a evolução imediata do trio tem um impacto mais direto nas aspirações de título de Golden State. Gui teve menos minutos, arremessos e a bola nas mãos, e seus números caíram de acordo.

Mas se engana quem acha que isso significa que as atuações do brasileiro em Vegas são menos significativas. Por melhor que seja ver o ala tendo mais liberdade em quadra, dando um vislumbre de um potencial e qualidades que não estamos acostumados a ver, os Warriors não estão de olho em Gui para ser o craque do time, e sim uma peça complementar - alguém que faça o trabalho sujo e complemente os principais jogadores da equipe, com menos responsabilidade direta mas precisando se adaptar e adequar ao contexto que encontrar. Nesse contexto, jogar em um papel menor ao redor dos três "astros" do time de verão dos Warriors é perfeito para podermos ver Gui jogando de forma mais semelhante a como tende a ser usado quando finalmente fizer o salto para a NBA.

Nesse contexto, Gui Santos fez o que precisava: mostrou boa defesa, versatilidade, e excelente leitura de jogo e passe apesar do baixo número de assistências. Seu melhor jogo em Vegas (até agora!) foi o terceiro, contra o Boston Celtics: foram 12 pontos, 8 rebotes, 1 assistência e 1 toco, além de bons passes que não aparecem no box score. Pode não ser um jogo individualmente dominante ou empolgante como foi sua estreia contra os Kings, mas foi uma boa amostra da variedade do seu jogo e das diferentes formas que pode afetar uma partida:

Ao fim de seis jogos entre duas Summer Leagues, Gui Santos tem médias de 11 pontos por jogo, com 4 rebotes, 2 assistências e arremessando 39% para três pontos, em menos de 23 minutos por jogo. Ele mostrou muito de positivo, mas também alguns negativos: a dificuldade nos lances livres, excesso de turnovers, alguma dificuldade de finalizar contra defensores maiores. Esses são todos pontos já esperados dado o contexto, mas vale citá-los para não vender uma ideia falsa de que tudo foi perfeito para o brasileiro.

E a pergunta que fica - e ainda está em construção, visto que a Summer League de Vegas ainda não acabou - é: o que isso significa para o futuro do brasileiro? Suas boas atuações tornam mais provável que ele já chegue no time principal dos Warriors em 2023?

Honestamente, é difícil dizer que sim. Sucesso na Summer League não é um indicador de sucesso futuro na NBA; muitos jogadores foram mal nas ligas de verão e brilharam na NBA, e muitos jogadores dominaram em Vegas sem nunca se estabelecer na liga. O que times buscam não são as grandes atuações, mas sim fazerem experimentos: colocando jogadores em funções específicas para ver como reagem, dando repetições em alguma função que não terão chance nos jogos de verdade, botando em prática coisas desenvolvidas nos treinos. No geral, eu acho que Gui se mostrou acima do esperado ao redor da liga, mais avançado e confortável no seu primeiro encontro com esse nível de basquete, mas os prós e contras demonstrados em grande medida já batiam com o que sabíamos do brasileiro antes do Draft; não teve nada muito grande ou inesperado para alterar a percepção. Claro que Gui ir bem nesses jogos não atrapalha - e certamente ajuda - suas chances de ir logo para a NBA, mas é improvável que tenha sido o tipo de atuação que vá alterar os planos de Golden State. Hoje, a rota do stash ainda parece a mais provável - talvez até em Santa Clara, time da G-League dos Warriors, onde Gui ficará mais perto da equipe.

Mais interessante do que as atuações em si, e mais indicativo do seu futuro, foi a forma como Golden State usou o brasileiro em quadra: especialmente na Califórnia, os Warriors muitas vezes colocaram Gui iniciando as jogadas quase como armador, conduzindo pick-and-rolls e distribuindo a bola. E isso é particularmente interessante por dois motivos. Primeiro porque sua capacidade de passe e criação era a característica de Gui que mais interessou os times no processo antes do Draft, então é bom ver os Warriors explorando isso dessa forma. E segundo porque os Warriors, mais que qualquer outro time da NBA, jogam um tipo de basquete que exige que todos os jogadores em quadra sejam bons passadores e criadores, um dos motivos pelos quais eu e tantos outros gostamos do encaixe entre time e jogador.

Esses jogos, ainda que poucos, deixam evidente que Golden State de fato visualiza um papel de criador para Gui dentro do seu sistema, e essa é sem dúvida a forma mais fácil para Santos chegar ao time principal, então é uma ótima notícia que os Warriors tenham já testado o ala na função e que ele tenha correspondido bem - não perfeito, é claro (foram quase 4 turnovers por jogo para o brasileiro), mas mostrando o tipo de leituras, inteligência e visão que você espera de um jogador no sistema dos Warriors. Essa assistência para Moses Moody, em especial, foi a que mais me chamou a atenção porque encapsula diversos pontos fundamentais para o brasileiro e seu encaixe em Golden State: a decisão rápida ao receber o passe, a agressividade na direção da cesta para atrair a defesa, e o passe até a zona morta para o jogador se movimentando sem a bola - marca registrada de Steph Curry.

No fim do dia, tem sido um começo de trajetória bastante encorajador para o brasileiro, mas por enquanto é apenas isso que foi: um começo. Os sinais foram promissores e mostram que existe um caminho claro para Gui Santos jogar na NBA e conquistar seu espaço nos Warriors, mesmo que esse espaço ainda pareça estar a alguma distância do jogador. Nós, e os Warriors, certamente acompanharemos seu crescimento nos próximos meses atentamente.