Dá pra 'recongelar' o Ártico? Startup tem plano, mas cientistas são contra

Uma startup britânica está perfurando buracos no gelo do Ártico canadense para bombear água do mar e congelá-la na superfície. O objetivo é restaurar o gelo marinho e retardar os efeitos do aquecimento global, mas cientistas veem riscos associados à tecnologia.

O que aconteceu

Empresa aposta em bombas submersíveis movidas a energia renovável para engrossar o gelo. A ideia da Real Ice é preservar o ecossistema da região, que tem encolhido devido às mudanças climáticas.

Eles atuam em Cambridge Bay, uma vila costeira no Ártico canadense. A startup realizou um experimento no local, adicionando 50 centímetros de espessura ao gelo entre os meses de janeiro e maio. Segundo o IPCC (Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas), o derretimento do Ártico pode atingir níveis irreversíveis nas próximas décadas.

Objetivo é congelar área maior que a Califórnia. Nos próximos anos, a Real Ice busca aumentar a espessura do gelo em mais de 1 milhão de quilômetros quadrados —o equivalente a duas vezes o tamanho da Califórnia— para retardar ou reverter o derretimento do gelo no verão.

Prática adotada pela empresa é conhecida como geoengenharia. Trata-se de uma técnica que manipula o ambiente para diminuir os efeitos das mudanças climáticas.

Iniciativa pode não ser suficiente, diz cientista

Apesar dos resultados iniciais, pesquisadores destacam preocupações quanto à eficácia e aos riscos associados à tecnologia. A ciência é sólida, disse Jennifer Francis, cientista sênior do Woodwell Climate Research Center. "O gelo ficará consideravelmente mais espesso e brilhante em áreas locais ao redor das bombas". Mas uma grande questão, segundo a cientista, é se gelo marinho suficiente pode ser cultivado por um período longo o suficiente para fazer alguma diferença na crise climática. "Tenho sérias dúvidas", disse ela à CNN.

Pesquisadores e empresários da Real Ice se reúnem no Ártico canadense para furar o gelo e criar camadas extras, que ajudam a resistir ao degelo do verão.
Pesquisadores e empresários da Real Ice se reúnem no Ártico canadense para furar o gelo e criar camadas extras, que ajudam a resistir ao degelo do verão. Imagem: Real Ice/Divulgação

Cientista questiona a escalabilidade do projeto. "Tais intervenções são moralmente duvidosas na melhor das hipóteses e, na pior, eticamente irresponsáveis", pontuou Liz Bagshaw, professora associada em mudança ambiental polar na Universidade de Bristol, à emissora americana.

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Dezenas de cientistas expressaram preocupações sobre projetos de geoengenharia polar. Eles publicaram um relatório no ResearchGate intitulado "Protegendo as Regiões Polares de Geoengenharia Perigosa" e, entre os alertas, está "a possibilidade de consequências graves e imprevistas". "De acordo com nossa avaliação, nenhuma ideia atual de geoengenharia passa por um teste objetivo e abrangente sobre seu uso nas próximas décadas', diz um trecho do documento.

Geoengenharia pode enfraquecer medidas para conter emissões

O climatologista e cientista brasileiro Carlos Nobre enxerga que há uma grande preocupação com geoengenharia. O colunista de Ecoa afirma que as medidas poderiam induzir a uma grande "não redução" das emissões de gases de efeito estufa, já que desviam a atenção do problema. As últimas recomendações do IPCC alertam que a redução é a única alternativa para frear o aumento da temperatura.

Se continuarmos com altas emissões, chegaremos a mais de 2,5ºC de aquecimento até 2050. Não me parece que esta geoengenharia teria impacto de grande escala para recuperar o mar de gelo do Ártico. Como vários estudos indicam, com as taxas de aquecimento crescentes poderá se chegar a zerar o mar de gelo no fim do verão no Ártico antes de 2040. Não me parece que haveria como impedir esse super derretimento com essa geoengenharia. Carlos Nobre

Real Ice tem plano de "créditos de resfriamento", em que poluidores pagariam pelo 'recongelamento do gelo', compensando a sua própria poluição. Andrea Ceccolini, co-CEO da Real Ice reconheceu em entrevista à CNN que o projeto pode causar mudanças no ambiente marinho, como o crescimento de algas, que podem ser afetadas pela estrutura do gelo, mas acredita que os impactos são limitados. "Tudo o que fazemos tem um impacto. O problema é que há um impacto muito mais dramático em simplesmente deixar as coisas continuarem assim" disse.

15 comentários

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José Assis Ribeiro Filho

Sempre vai ter alguém contra, não importa quão bom seja o projeto. Veja a floresta amazônica, o pulmão do mundo, mas ninguém fala que ela produz muito gás metano, que é mais nocivo ao efeito estufa que o próprio gás carbônico.

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Wilson Satoro Motizuki

Acredito que faz mais sentido, deixar as calotas polares, os telhados das casas e os pavimentos das ruas e rodovias, todos na cor branca para refletir os raios solares. O objetivos é fazer com que a energia solar não seja mantida no planeta Terra. 

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Joao Orestes Schneider Santos

Os humanos não tem o poder de alterar o clima, em uma escala global. Não têm o poder de alterar as emissões de energia do sol, que é o grande "gerente climático". Os climatistas já torraram U$ 2 trilhões (são trilhões, mesmo!) para "mitigar" o aquecimento, mas NADA FOI MITIGADO, o aquecimento continua. Esse $$ foi (mais de 90%) parar nas mãos de ONGs criminosas (criminosas por que mentem, por que fazem terrorismo climático). Relaxem, o atual aquecimento (pós-Würm), que começou há 12.000 anos, vai continuar por vários séculos e o mundo precisa se preparar para isso, para a INEXORÁVEL subida dos oceanos. Comparando com o que ocorreu no último aquecimento (Riss-Würm, entre 130.000 e 70.000 anos atrás), é razoável considerar uma subida dos oceanos de 6 a sete metros. O mundo PRECISA investir em diques de contenção, remanejamento de cidades baixas para acima da cota 10, etc.  

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