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Primeira Infância

OPINIÃO

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Quintal inspirado em poeta aproxima crianças da natureza em escola de SP

"Viveiros de infância": marca da EMEI Dona Leopoldina - Reprodução/Facebook
'Viveiros de infância': marca da EMEI Dona Leopoldina Imagem: Reprodução/Facebook

Ana Cândida Pena e Carolina La Terza

18/02/2022 06h00

"Acho que o quintal onde a gente brincou é maior do que a cidade. A gente só descobre isso depois de grande. A gente descobre que o tamanho das coisas há de ser medido pela intimidade que temos com as coisas. Há de ser como acontece com o amor. (...) Sou hoje um caçador de achadouros de infância. Vou meio dementado e enxada às costas a cavar no meu quintal vestígios dos meninos que fomos".
Trecho do livro "Memórias Inventadas", lançado em 2003.

Um poeta das pequenas coisas, Manoel de Barros descreveu como nenhum outro os pequenos prazeres da vida livre do interior e, com nostalgia, os bons tempos da infância. A simplicidade das alegrias infantis descritas nos leva de volta ao quintal, aquele terreno ao ar livre, talvez composto de um jardim ou horta, tão comum nas casas de antigamente.

Mas foi em meio à urbanização ostensiva de São Paulo que um quintal de quase 9 mil m² nasceu inspirado nos "achadouros" de infância do poeta mato-grossense. Os "viveiros de infância" se tornaram marca da EMEI Dona Leopoldina, um refúgio especial que se destaca na Zona Oeste da capital paulista. O espaço da Escola Municipal de Educação Infantil Dona Leopoldina foi modificado a partir do conceito de desemparedamento na educação e vem criando espaços de aprendizado verdes, ao ar livre e baseados nos elementos naturais.

As salas verdes foram os primeiros projetos de transformação na escola, uma horta que passou por algumas intervenções para funcionar como espaço de formação e aprendizagem para as 240 crianças de 3 a 6 anos que estudam por lá em período integral. A ideia é refazer a conexão das crianças com a natureza durante o período mais importante do seu desenvolvimento, a primeira infância.

As salas não são padronizadas com mesas e cadeiras, mas pensadas a partir de cantos de experiências — o canto simbólico, o canto do letramento, o canto da arte. Os espaços externos vão além e utilizam todo o potencial da natureza em ambientes alfabetizadores em si, afinal, dentro da criatividade infantil todo elemento é potencialmente educador.

A EMEI Dona Leopoldina, na Zona Oeste da capital paulista - Reprodução/Facebook - Reprodução/Facebook
A EMEI Dona Leopoldina, na Zona Oeste da capital paulista
Imagem: Reprodução/Facebook

Como reflete a diretora da EMEI Dona Leopoldina, Márcia Covelo, "se você solta uma criança no gramado ela vê desde a sementinha que está no chão, até a nuvem no céu. Tudo é aprendizado". E explica: "Nosso projeto educacional é baseado em pedagogias ecológicas que propõem o religamento da criança com a natureza a partir de espaços escolares acolhedores como verdadeiros ninhos".

A "horta mandala" e a agrofloresta trabalham com os conceitos de plantas companheiras, enquanto o telhado verde prova que é possível se plantar em qualquer lugar. E a estufa, chamada pelas crianças de berçário, vira fonte de inesgotáveis lições. A escola conta ainda com uma cisterna para captação da água da chuva, utilizada para lavar a quadra e regar a horta, enquanto o lavatório com reúso de água cinza possui um sistema de filtragem natural por bananeiras. As crianças lavam as mãos na água que posteriormente é filtrada e retorna em uma torneira ao lado.

A EMEI Dona Leopoldina, na Zona Oeste da capital paulista - Reprodução/Facebook - Reprodução/Facebook
A EMEI Dona Leopoldina, na Zona Oeste da capital paulista
Imagem: Reprodução/Facebook

Sucesso entre os pequenos, a casa na árvore foi construída ao redor do Sr. Ficus, a maior árvore do terreno e escolhida como preferida pelos alunos. A casinha levou quase 3 anos para ser construída e contou com a ajuda de um avô engenheiro na comunidade escolar. A estrutura também conta com um observatório de pássaros e, como não poderia faltar, um redário com diversos tipos de balanços, pneus pendurados e até uma tirolesa infantil.

Para decidir sobre as novas prioridades para a escola, um processo de escuta ativa é realizado com os pequenos, fortalecendo a autonomia e participação desde cedo. O modelo da escola infantil ainda é exceção (tanto no ensino público quanto no privado), mas a sementinha já germina e rende frutos naquela comunidade escolar. Que a experiência de incorporar verde, natureza e espaços ao ar livre para incrementar a experiência da comunidade escolar possa inspirar outras formas de aprender.

** Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do UOL