AME: entenda rara doença de garoto que teve doações desviadas pelos pais

Renato e Aline Openkoski foram presos ontem (22) em Joinville (SC) por usarem o dinheiro que arrecadaram para o tratamento do filho portador de AME para manter uma vida de luxo. Eles foram condenados em 2022 por estelionato e apropriação de bens. A criança morreu em 2022.

AME (atrofia muscular espinhal) é uma doença rara, genética, degenerativa e sem cura que afeta os neurônios motores. A prevalência é de um a cada 10 mil nascidos vivos. Ela é causada por uma mutação no gene SMN1, responsável pela sobrevivência do neurônio motor. Ao todo, há cinco graus de AME —do 0 ao 4. O zero é mais grave e costuma dar sinais nos primeiros meses de vida.

A doença tende a apresentar sintomas mais tardiamente a cada um dos tipos, sendo que nas formas 3 e 4 eles podem aparecer até mesmo na adolescência, explica o geneticista David Schlesinger, CEO e cofundador da Mendelics.

"Nós temos dois tipos de neurônios motores: um que sai do córtex motor e desce pela medula espinhal até o nível certo que vai para o braço, perna e ali faz conexão [sinapse] com um segundo neurônio motor, o inferior, que sai da medula espinhal e vai até o músculo", David Schlesinger.

Na AME, há morte do neurônio motor inferior, importante não apenas para ativar o movimento, mas para dar estrutura ao músculo, que acaba atrofiando. É importante lembrar que os pacientes com a doença não perdem os movimentos, mas, sim, a força para realizá-los e por isso muitos precisam usar cadeira de rodas, por exemplo.

Falta de informação

Embora tenha sido identificada no final do século 19, a maioria das descobertas sobre a condição são recentes. Só em 2016 foram apresentados os primeiros medicamentos para aliviar a progressão e os sintomas da doença.

O primeiro medicamento para AME disponibilizado pelo SUS foi o Spinraza, em 2019. Antes disso, as famílias tentavam importar o medicamento por meio de vaquinhas online ou acionando a Justiça para que o sistema público arcasse com os custos.

No começo de 2022, o Risdiplam foi incorporado ao SUS e, no fim do ano, chegou o Zolgensma —para este último, a expectativa é estar disponível até junho de 2023. Ele também é o mais caro de todos: cerca de R$ 6 milhões.

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Em 2021, a doença foi incluída na ampliação do teste do pezinho, mas, de forma escalonada, ficou na quinta e última etapa. A coalizão pressiona para acelerar a cobertura da AME, a fim de que seja posta em etapas anteriores.

Problemas no dia a dia

A pesquisa "Retrato da AME no Brasil", realizada pela Editora Abril com apoio da farmacêutica Roche e do Iname (Instituto Nacional da Atrofia Muscular Espinhal), traçou um perfil de pacientes com AME.

O levantamento teve 144 respondentes, entre pessoas com AME e cuidadores. Trata-se de uma pesquisa quantitativa realizada com um questionário estruturado aplicado via web. Ela foi conduzida durante o mês de setembro de 2022, via redes sociais.

Veja alguns dos principais resultados:

  • 73% dos entrevistados apontam que a falta de inclusão e acolhimento por parte da sociedade civil causa de muita dor e sofrimento tanto para o paciente quanto para os familiares, fato que resulta também em preconceito e capacitismo.
  • 97% dos cuidadores de pessoas com AME responderam que já tiveram que deixar de frequentar um local por falta de acessibilidade.
  • 75% dos entrevistados colocaram a falta de acessibilidade em locais públicos como grande barreira no dia a dia das pessoas com AME.
  • 60% deles mencionam barreiras tão básicas quanto mal estado de calçadas, falta de elevadores, portas muito estreitas ou falta de transporte adequado --particular ou público.
  • A jornada até o diagnóstico pode ser longa, e 66% compartilham que foram necessários 3 ou mais médicos para alcançarem o diagnóstico correto.
  • Em 26% dos casos, o diagnóstico de AME só chegou depois de mais de 2 anos após os primeiros sintomas.
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Com informações de reportagens de abril e maio de 2023.

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