Pílula 'estimuladora de cérebro' funciona? Atenção: milagres não existem

Cansaço, fadiga e excesso de trabalho podem abalar seu desempenho no dia a dia. Por isso, quando um produto que se diz saudável promete ajudar no foco e na concentração, os olhos até brilham. Mas, apesar das promessas, não há comprovação científica de que esses suplementos funcionem.

Uma publicação feita no "X", antigo Twitter, viralizou com a indicação de uma dessas pílulas milagrosas. No post com mais de 40 mil likes, a usuária dizia que tinha testado e amado um produto.

Isso é mito. Não existe nenhuma suplementação alimentar que vai aumentar o desempenho mental e cognitivo. Adalberto Studart, secretário do Departamento Científico de Cognição da ABN (Academia Brasileira de Neurologia)

Studart garante que essas pílulas não mudam, em nada, o funcionamento do cérebro. O especialista explica que a deficiência de algumas vitaminas pode, sim, comprometer o funcionamento cognitivo do cérebro, como em casos mais extremos de desnutrição. Mas, se a pessoa tem uma boa alimentação, uma pílula dessa não tem efeito.

Por que algumas pessoas sentem uma melhora do funcionamento do cérebro ao tomar o suplemento? Segundo o neurologista, isso não passa de efeito placebo —quando, mesmo sem ter capacidade para isso, uma substância ou procedimento produz efeito fisiológico no organismo, melhorando sintomas.

O que tem no suplemento?

Ácido L. glutâmico Aminoácido produzido naturalmente pelo nosso organismo (não essencial), está presente também na carne, no ovo, no leite e em vegetais como agrião, alho, abóbora, brócolis, oleaginosas e leguminosas. A substância realmente tem papel importante para o funcionamento do cérebro e a memória. Porém, por ser produzida pelo organismo, seu consumo via suplementos não é necessário para pessoas saudáveis.

L-fenilalanina Um aminoácido essencial (não produzido pelo organismo), encontrado principalmente em fontes de proteína animal —carnes, ovos, leites e derivados. A substância é usada pelo corpo, entre outras coisas, para a produção de neurotransmissores que melhoram a memória e o humor. No entanto, o consumo do suplemento não garante que o corpo vá aproveitar a l-fenilalanina para turbinar o cérebro (explicamos melhor a seguir).

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Bitartarato de colina Uma das vitaminas do complexo B, presente na gema do ovo, no leite, no brócolis, no amendoim, no brócolis, em peixes etc. O nutriente é importante para o funcionamento do coração, do cérebro e dos músculos.

Nem tudo 'vai para o cérebro'

Apesar de as substâncias presentes nas pílulas serem importantes para o funcionamento do cérebro, consumir o suplemento não garante uma melhora da concentração, da memória e do desempenho intelectual por razões simples.

Essas substâncias têm diferentes funções no corpo: algumas servem para produzir neurotransmissores, mas também unhas, cabelos e pele, por exemplo. E quem decide para que elas serão usadas é o nosso corpo.

Além disso, como já explicamos, uma boa alimentação já supre a quantidade que o corpo precisa desses nutrientes. E o excesso não será usado para turbinar o cérebro do cérebro e, sim, eliminado.

Mari Kruger, bióloga e criadora de conteúdo, fez um vídeo em suas redes sociais sobre esse tipo de suplemento. Nele, de maneira bem-humorada, ela mostra como esses comprimidos não têm efeito no corpo e diz que eles só servem para fazermos "xixi caro".

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"Se ingerimos um monte de vitaminas que não precisamos, o corpo elimina. O colágeno, por exemplo, muitas pessoas acham que vai para pele, mas o corpo o divide em proteínas e o espalha para onde precisamos mais. Ele não vai agir na pele necessariamente", explica a bióloga.

"Sempre bato na tecla que não adianta usar produtos milagrosos para atingir resultados. Se você quer mais foco e concentração, precisa saber onde isso está se perdendo", explica.

Falta de memória pode ser causada por diversos fatores: psiquiátricos, rotina de estresse, sono sem qualidade, alimentação mal feita, falta de exercício físico... Um suplemento não vai resolver. Mari Kruger, bióloga

Comer direito sempre vale mais

"Se tivermos uma alimentação equilibrada não precisamos de mais nada", diz a nutricionista Lara Natacci, coordenadora da Comissão de Comunicação da SBAN (Sociedade Brasileira de Alimentação e Nutrição). "Os suplementos vão complementar a nossa alimentação, para mantermos um bom funcionamento do organismo, mas devem ser prescritos por um profissional", ressalta.

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De acordo com a OMS, deveríamos ingerir 400 gramas de frutas, verduras e legumes por dia, o que corresponde a cerca de cinco porções. "No Brasil, consumimos menos da metade, segundo pesquisa de orçamentos familiares do Ministério da Saúde", explica Natacci. Vitaminas do complexo B, que são muito importantes na formação de neurotransmissores, são encontradas em alimentos de origem animal, vegetais verde-escuros e alguns cereais integrais.

Efeito inverso: suplemento demais pode fazer mal

Algumas vitaminas presentes em determinados suplementos podem se acumular em nosso organismo e causar danos sérios à saúde.

"As vitaminas A, D, E e K, que são lipossolúveis, podem acumular. Altos níveis de vitamina D, por exemplo, podem levar a insuficiência renal e até levar o paciente a hemodiálise", alerta o neurologista Studart.

Para colocar no cardápio

Alguns alimentos podem ajudar a melhorar a memória e o raciocínio. São eles:

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Sardinha, salmão e atum são peixes que têm ômega 3, que ajuda a proteger a membrana celular dos neurônios, deixando-os intactos por mais tempo.

Brócolis, couve, espinafre fazem parte da lista de vegetais verde-escuros. Eles são ricos em antioxidantes que estimulam o sistema nervoso a formar novas ligações entre suas células, o que pode ajudar com raciocínio e preservar a memória.

Ovos e carne: além da colina, proteínas animais contam com vitamina B12, que também muito importante para o metabolismo celular dos neurônios.

Cacau é rico em flavonoides e antioxidantes que melhoram a cognição.

Por outro lado, é bom evitar gorduras hidrogenadas trans, açúcar, adoçantes sintéticos, refrigerantes e carboidratos refinados (biscoitos, bolos, salgadinhos). Na lista entram também fast-food e os processados. Todos contribuem para as inflamações e oxidam os neurônios. Evite ainda comer demais, pois o excesso de calorias envelhece o cérebro de forma mais rápida.

Com informações de reportagem publicada em março de 2023.

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